segunda-feira, 27 de agosto de 2018

BAIXA: SETENTA ANOS AO SERVIÇO DO COMÉRCIO SÃO MUITOS DIAS

(Fotos acima de Nelly Catalão)





Numa feliz e bonita iniciativa, hoje, um grupo de trabalhadoras da arte de comprar e vender surpreenderam o “velho lobo” do comércio, José Marques, com um bolo, duas velinhas e o cantar de parabéns. Sempre alheio a fotografias, talvez porque apanhado de surpresa e vindo de um grupo de senhoras lindíssimas, o companheiro das lides mercantis habituado a travar grandes batalhas, não resistiu à simpatia e charme feminino, e deixou-se focar pela objectiva em memória para a posteridade.
O que deu aso a esta festa de amizade foi o facto de José Marques parabenizar ontem 80 anos de vida – e setenta ao serviço do comércio. Segundo as suas palavras, “comecei a trabalhar na Casa Guimarães - na Praça do Comércio e hoje encerrada – com 10 anos, em 1948. Como o ordenado não chegava para as necessidades, comecei a dormir e a sonhar com o trabalhar por minha conta. O patrão, o dono da Casa Guimarães, porque teria intuído da minha vontade, ofereceu-me sociedade na empresa. Eu disse logo: “olhe que não tenho dinheiro para isso”. Ele emendou logo que dinheiro não era problema, a quota seria a realizar com esforço e trabalho Aconteceu que o tempo começou a passar e “promessas levou-as o vento”. Com 27 anos, decorria o ano de 1965, coloquei-lhe o ultimato: ou sim ou sopas! Começou a engasgar-se e eu agarrei no casaco e fui embora. Fui ter com um grande amigo comerciante aqui nas ruas estreitas, ainda em actividade e de boa saúde, e fui pedir um empréstimo. Este, sem hesitar, emprestou-me mil contos – o equivalente a cinco mil euros hoje. Trabalhei muito, sabe, amigo Luís? Mais tarde viria a adquirir a antiga casa onde comecei a laborar, a Casa Guimarães.
José Marques, um homem que conheço bem, bebeu as dificuldades da Segunda Guerra Mundial e o sacrifício que o conflito bélico significou para o comércio e as suas gentes. Tomou o pulso ao início do crescimento das actividades mercantis em Coimbra, em meados de 1950 com o grande incremento industrial na cidade. Assistiu e foi actor principal ao apogeu comercial nas décadas de 1970-80-90.
Hoje, depois de muitos funcionários ao seu serviço na Casa dos Enxovais, na Rua visconde da Luz, e que comemorará 53 anos para o próximo mês de Setembro, resta-lhe a Rosinda Henriques, que trabalha na firma há 43 anos.
Com uma lágrima no canto olho, à sua porta, como soldado de vigia ao seu território, Marques constata a degradação em plano inclinado a que chegou o comércio de rua.
Se vivêssemos numa sociedade justa, em que se deve atribuir a cada um o que é seu, pessoas como José Marques, artífices ao serviço do desenvolvimento de uma urbe, deveriam merecer uma homenagem por parte da Câmara Municipal de Coimbra. Saliento que na Baixa há vários comerciantes octogenários na mesma situação. O mal destas pessoas é que não são militantes de um dos dois grandes partidos políticos. Tivessem eles a ficha em dia e teríamos festa de arromba.
Enfim, é o que temos!

1 comentário:

Unknown disse...

Sim numa sociedade justa, realmente não sacrificava os funcionários a sair com uma mão à frente e outra atrás. Os funcionários é que fizeram a casa, para não falar nas mais antigas, a quem alguém fez a vida negra para se despedirem....por saberem demais. Enfim....