Ontem à noite não tinha nada para
fazer. Acompanhado do meu Silvano –é o meu burrico, não devem conhecer-, que
anda com uma depressão danada e já nada o contenta, andava a fazer umas “piscinas”
ali perto do Café Atenas. Foi então, quando, que de repente, vejo a minha diva,
a Helena Freitas, assim naquele passo ondulado e flutuante sobre algodão de que
só os anjos conseguem mostrar, a caminhar do outro lado contrário a mim e em
direcção à Casa Municipal da Cultura. Atrás dela, em procissão de séquito,
seguia o estado-maior do Partido Socialista. Claro que mandei logo perfilar o
meu jumento e sussurrei: alto e para o baile! Temos de seguir este pessoal e
ver qual é a reunião secreta que vai sair dali –digo “secreta”, porque não
houve publicidade, nem um convite no Facebook, nada! Com a mão em afago fiz uma
festa na tromba do burro, mandei-o encostar lá num canto e, para o animar,
deixei-lhe a mensagem: vou ali dentro ver se apuro qualquer coisinha. Mantém-te
calmo e não desanimes, Silvano, o Governo há-de cair, porra! Tem esperança! E,
pé ante pé, segui a comitiva lá para o primeiro andar do universo de todas as
culturas e catedral da minha outra musa encantada, Maria José Azevedo, a vereadora
de todas as lavras do saber desta cidade.
Entrei na sala e, ena pá! Só lá
faltava o camarada António José, o inseguro, o camarada prosador Alegre e o
camarada “abaixo este Governo”, Mário Soares. Exceptuando esta troika, estava
lá toda a gente, desde pensadores, poetas, escritores, até ao Carlos Cidade,
que de vez em quando atirava um gancho da direita contra o invisível. Suponho
que ainda eram resquícios da reunião do executivo, à tarde, na autarquia.
Certamente estava ainda nervoso e aqueles murros, em pensamento e assim no
jeito “se te apanho lixo-te”, eram dirigidos a Neptuno, rei dos mares e senhor
de todas as águas de Coimbra e de Portugal.
A mesa, em painel, era
constituída por Luís Braga da Cruz, José António Bandeirinha, Helena Freitas, e
a substituir João Vasco Ribeiro, por se encontrar doente, os seus filhos. A
moderação estava a cargo de Rui Namorado. Era uma organização do denominado "Clube de Coimbra".
Estava a minha inspiração
personificada, a Helena, a começar a ensaiar o gesto para abandonar a cadeira
de encosto e de rainha –por momentos, imaginei a tristeza que o assento, pela
ausência momentânea, deveria estar a sentir. E dirigiu-se ao pódio. Mas estava
triste -sabe-se lá se por a musa Maria José não gostar da concorrência, que
nestas coisas da beleza feminina as mulheres são tramadas- não havia projector
para apresentar o “pour point”. Mas a minha diva Helena não vai ao chão por lhe
retirarem o tapete, isso é que era bom! E se não há imagem na tela dá-se umas
palavras doces e embrulhadas em mel, que, se não é mesma coisa, é muito melhor,
porque, em vez de se amarrar os olhos na tela, prende-se o olhar no seu rosto
lindo e apanham-se as suas palavras sílaba por sílaba.
Vamos ouvir a minha estrela cintilante,
que o tempo urge:
“Eu tenho várias ideias para a
cidade. É preciso envolver a margem esquerda com a direita, com todos os seus
elementos, a Universidade do Desporto, a Escola Silva Gaio, o Liceu D. Duarte.
É preciso prosseguir com o projecto “Docas 2” e abranger o Convento São
Francisco. Como é que se pode admitir, nesta altura, o facto de ainda não haver
programação? Está-se a trabalhar muito mal! O Centro de Congressos tem de ter
outro tratamento.
Bem sei que há o problema dos
recursos económicos e financeiros, mas, se pudesse, mandava construir uma ou
duas pontes pedonais. Pelo menos uma, coberta, mandava edificar e a ligar o
terreno dos SMTUC e a Estação Nova.
Pensava num estudo em que o
edifício da Estação tivesse um fim cultural, deixava a ferrovia entre Coimbra A
e B, e mandava fazer uma via pedonal entre as duas estações.
Propunha alojamentos para
estudantes na Baixa e em parceria entre a Universidade e a Câmara Municipal.
Mandava retirar os SMTUC e fazia
ali um grande parque de estacionamento para comerciantes e consumidores –é
fundamental a ligação da margem esquerda à Baixa para a revitalização desta.
Incluía as matas em redor da
cidade num plano em harmonia com o turismo; é preciso um programa que conduza o
turista a toda a cidade; é preciso pensar a agenda cultural da cidade.
Faz todo o sentido pensar em
voltar a candidatar Coimbra Capital da Cultura –tal como em 2003.
E porque não fazer a primeira
Coimbra Capital da Lusofonia? Foi aqui que nasceu a língua portuguesa.
É preciso repensar a situação de
Coimbra B; porque não se mudam os táxis para o parque de estacionamento nas
traseiras?
O Metro Ligeiro de Superfície: é
preciso iniciar a recuperação da linha da Lousã. Isto, mesmo que não haja metro
na cidade. Porque não se envolveu o trajecto até à Figueira da Foz?
Precisamos de um Plano Rodoviário
Nacional.
Há uma perda de relações de proximidade;
recuperar esta proximidade é importante e vale a pena; é preciso ligar e
aproximar os bairros –perdeu-se a proximidade.”
Depois seguiu-se a intervenção de
outros oradores e algum público. Antes de terminar, e no seu tempo de resposta
a questões colocadas, a minha princesa Helena sublinhou: “eu vim aqui sem
qualquer pretensão. Eu sou uma feliz professora universitária. Não vim aqui
fazer um programa de candidatura autárquica. Vim apenas fazer algumas
sugestões.”
PONTOS POSITIVOS
Apesar da pouca divulgação,
esteve sala repleta –onde se pode ver também alguns conhecidos membros do PSD
local como, por exemplo, Lopes Porto, presidente da Assembleia Municipal.
PONTOS NEGATIVOS
Tal como em outros debates no
género, verificou-se uma total falta de respeito pelo público presente. Com o
moderador Rui Namorado, certamente a pensar nas rimas de um poema com o título “amanhecer”,
mas jamais em moderar o que quer que fosse, assistiu-se a uma bagunça completa
nas argumentações do painel. Como já é normal, conforme o peso institucional do
orador assim foi o correspondente tempo de intervenção. Com o público aconteceu
o mesmo. Faltou, de facto, ali regras de equidade e de moderação. Resultado: só
algumas pessoas da plateia puderam expor as suas dúvidas. Creio que, com
urgência, a Universidade, que ultimamente está tão atenta à sociedade civil,
deveria fazer uns pequenos cursos de moderação para os seus professores. É
sempre a mesma coisa! Já se sabe que onde houver um debate em que estejam
professores universitários no painel ou a moderar o resultado é catastrófico.
Tenham dó dos pobres futricas, senhores doutores! É que parece muito mal. O
público sente-se discriminado.
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