sábado, 30 de agosto de 2014

ROMAL, O TERREIRO DE NINGUÉM



“Senhor Luís, não se pode estar na minha rua com tantos mosquitos, provindos do Largo do Romal, e ratos, que mais parecem coelhos, saídos de um prédio decrépito no Beco da Boa União”. Maria de Lurdes Sousa, moradora na Rua dos Esteireiros, está desolada com o abandono a que a Câmara Municipal de Coimbra votou o histórico largo onde, ao longo do último século, tantas fogueiras e bailes mandados ali foram realizados.
Quase a pegar-me na mão, pede-me para a seguir e aponta uma entrada esconjuntada de um prédio a cair no Beco da Boa União. Enquanto caminha aponta as muitas manchas negras no asfalto empedrado e diz: “este chão não é lavado há meses e meses!”. E entramos na antiga praceta. Lurdes aponta o cenário em frente ao Café “Zé Figueiredo” e ordena: “olhe para isto!”. O que se vê é um prédio entaipado, que ameaçou ruir em Fevereiro último e desde essa data para ali jaz enclausurado entre os andaimes perfilados a apontar o Céu. Mas o que indigna e enoja ainda mais o nosso olhar é um monte de areia cheio de lixo, excrementos e um cobertor velho. Segundo a minha guia, o amontoado de inertes, para além de auxiliar como retrete pública, serve também para rebolar corpos e refrear hormonas, o que, convenhamos, qualquer um destes espectáculos não é muito edificante para quem reside à sua volta.
Acompanhado de Lurdes Sousa, continuo a caminhar no Largo do Romal. Diz esta moradora: “há um mês dei conhecimento na sede da União das Juntas de Freguesia, mas até agora não fizeram nada! Há uma semana telefonei para a autarquia e mandaram-me ligar para o Algar, para o serviço de Higiene. E eu liguei, mas até agora o mesmo. Olhe para este chão, veja a altura da erva! Olhe aqui estas águas lodosas. Por favor, sinta como cheiram mal! Alguns mosquitos saem de aqui!” –e aponta um pequeno lago que até há uns tempos teve repuxos. Entretanto chega outra vizinha, a Maria da Glória, que tem um estabelecimento de costura mesmo em frente ao receptáculo esquecido e confirma que dali sai um cheirete desgraçado que prejudica o seu negócio.

O DEGREDO DE FIGUEIREDO

José Figueiredo, antigo presidente da Junta de Freguesia de Souselas, com o seu estabelecimento de comes e bebes, é quem está mais lesado com toda a inércia da edilidade. Talvez por que durante muitos anos foi autarca e conhece por dentro as dificuldades, o seu queixume é contido. “Este atraso nas obras do prédio está a prejudicar muito o meu estabelecimento mas eu entendo a demora. Quanto julgo saber, a revitalização do edifício vai ser englobada numa candidatura especial para o Centro Histórico. Compreendo que Manuel Machado apanhou o “menino” nos braços. O imóvel foi adquirido por Carlos Encarnação que se limitou a realojar os seus inquilinos e nunca mais ligou a isto. Nada me move de pessoal, mas a falta de limpeza e esta atmosfera de abandono dá uma imagem degradante. Este largo, que tanto respeito deveria merecer, parece esquecido no tempo. Olhe aqui esta boca de incêndio –e verifique a outra ali  mais à frente-, veja que está toda destruída. Foi a estudantada, há cerca de um ano, na Queima das Fitas. Não é minha intenção aborrecer ninguém mas tudo isto me deixa vulnerável. Você entende? O negócio já está muito mau! Estou a trocar comida por dinheiro sem ter lucro e só para fazer para as despesas –e nem sempre dá. Há meses que tenho prejuízo!”

(Texto enviado para conhecimento à Câmara Municipal de Coimbra)

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