sábado, 16 de agosto de 2014

INTERROGAÇÕES DE UM POBRE CIDADÃO ANÓNIMO

(Imagem de Leonardo Braga Pinheiro)



Como pagador de promessas que, repetidamente, a 13 de Maio caminha impreterivelmente para Fátima, excepto nas últimas presidenciais em solidariedade com os utentes da linha do comboio da Lousã e para sua reposição, sempre cumpri o meu dever cívico de votar. Fossem eleições Legislativas, Autárquicas ou Europeias sempre estive lá. Embora liberal por convicção, como ovelha tresmalhada, nunca segui nenhum partido “a la letre”. O que sei é que nunca dei o meu voto aos radicais, que considero os polos, quer à esquerda quer à direita. Retirando estes, já votei em todos. Quando falava com amigos ou conhecidos que proclamavam textualmente que já há muito deixaram de votar, assim a admoestar e como mensageiro de um direito conquistado à força de baioneta, eu aflorava o facto de, não exercendo o direito, estar a arredar-se das grandes decisões do País. Até que cheguei a esta altura, ao ano de 2014, quase em vésperas de eleições legislativas e, sinceramente, sinto-me perdido e sem saber se irei votar no próximo sufrágio.
Nos partidos da Coligação, PSD E CDS/PP, com estes líderes actuais não verão o meu voto. Só o farei se surgir um dirigente que, não prometendo o que não sabe se pode cumprir, me convença que é diferente dos actuais. Que seja sério, pragmático, e que não esteja simplesmente interessado em dar emprego aos seus amigos, compadres e familiares e nos privilégios pessoais e para o partido. E, acima de tudo, que me traga algo de novo. Não continue a persistir nas soluções refogadas que já denunciam o cheiro a esturrado a léguas de distância. Então quando são moções escritas dá uma tal repelência que, pura e simplesmente, nos negamos a ler.
No Partido Socialista (PS), no passado dia 12, tendo em vista, primeiro, vencer as primárias do partido e a seguir levantar voo ministerial, António Costa apresentou o seu manifesto de 30 páginas sobre o lema “Mobilizar Portugal”. É um “déjà vu” de um presumível programa de governo que, sem se comprometer, nos assombra há décadas e no seguidismo da falta de credibilidade. Não traz nada de novo, é vazio de conteúdo objectivo, demagógico, esvoaçante sobre os problemas estruturais do País e, retirando as suas várias referências à direita ao longo da bíblia eleitoral para uma década, poderia perfeitamente ser apresentado pelos Social-democratas.
É engraçado, sem graça, como logo no início do documento está escrito que “Três anos volvidos sobre a chegada ao poder do Governo de coligação entre o PSD e o CDS, a sociedade portuguesa revela uma clara vontade de mudar de estratégia, de políticas e de protagonistas. Uma ampla maioria social recusa a dinâmica de retrocesso social, a lógica de confronto permanente, o impasse político, a incerteza generalizada”. Pelos vistos, é entendido que é preciso modificar o caminho para o futuro. Ora o que está plasmado a seguir, nas linhas condutoras deste candidato a primeiro-ministro, é uma pasmaceira, em bocejo, de mais do mesmo. Os chavões são: “responsabilidade”, “retrocesso social”, “desigualdades”, “exclusão social”, “compromisso”, “estabilidade e confiança”, “sustentabilidade”, “uma sociedade decente”, “descentralização”, “igualdade”, “alternativa”, “recuperação”, “sustentabilidade”, “economia mais competitiva”, “recuperação económica”, “investir no futuro”, “coesão social”, “concertação social”, “desenvolvimento”, “valorização do trabalho”, “convergência”, “direitos” “trabalho” e “emprego”. Como frase filosófico-populista elegi esta: “A pobreza não é um problema dos pobres: é uma violação dos direitos de cidadania que coloca em causa a nossa vivência democrática; é um obstáculo ao desenvolvimento económico e é, em particular a pobreza extrema, um fator de fragilização da coesão social”. Pergunto eu: se a pobreza não é um problema dos pobres de quem é?

E O OUTRO É MAIS SEGURO?

E passamos para António José Seguro, o actual líder Socialista, que em cerca de vinte e seis páginas e com 80 medidas, no dia 17, apresentou o seu “Contrato de Confiança –Novo Rumo para Portugal”, que visa servir de base para um novo programa de governo.
Em completa demagogia mas ao contrário do seu rival Costa, e para prender a atenção do (e)leitor, de uma forma descarada começa logo por dizer “Nada prometer que não possamos cumprir, é um dos princípios orientadores deste Contrato de Confiança. Para gerar a confiança indispensável à motivação dos portugueses em torno deste projeto nacional, é crucial que o próximo Governo honre a sua palavra”. Em completo despudor escreve queO Contrato de Confiança corresponde a uma nova forma de fazer política em Portugal”. Tal como o seu opositor, lá vem as frases-chaves repetidas até á exaustão: “Contrato de Confiança”, “cultura de responsabilidade”, “compromisso”, “oportunidade”, “Democracia de Confiança”, “coesão social”, “desenvolvimento”, “emprego”, “desigualdades”, “Estado sustentável e de confiança”.
António José Seguro também não se compromete com nada e consegue ser mais “ligt”. Em contraste com o seu concorrente no partido, nem uma vez se refere à direita como inimiga. Lá vem a tal frase filosófico-populista: “O emprego é a chave de todas as oportunidades. E, por isso, tem que estar no coração de todas as políticas. O emprego é muito mais do que um salário no final do mês. É uma condição da dignidade e da felicidade humana”. Nada de mais errado. O emprego nunca pode ser a condição da dignidade e da felicidade humana e a chave de todas as oportunidades. Quanto muito será o trabalho –que não significa a mesma coisa que emprego. Mas mesmo em substituição continuaria falhado. A chave de todas as oportunidades, dignificação e felicidade humana só pode entroncar no reconhecimento pelo mérito, que é o que tem falhado continuamente na sociedade portuguesa –admito que a substituição de “emprego” fosse intencional. Afinal “trabalho” reporta-nos para Marx e Engels, logo para uma esquerda que, aparentemente, Seguro não quer mostrar para uma coligação futura.
Este projecto é vago e assenta na imprevisibilidade como, por exemplo: “A política de rendimentos é um elemento fundamental para a recuperação da economia portuguesa. A estabilidade e a confiança dos consumidores, das famílias e dos investidores criará novas condições para consumir e investir, e para gerar novos empregos”. E ainda: “Criar um contexto social e económico mais favorável às famílias e ao aumento da natalidade; criar condições - estabilidade de emprego, acesso aos serviços e conciliação da vida pessoal e familiar - para que as mães e os pais se sintam seguros e protegidos para poderem ter filhos e educá-los com dignidade”.
É tão insensível com o estado económico e financeiro actual das famílias portuguesas que vai ao ponto de prometer isto: “Não aumentar a carga fiscal durante a próxima legislatura. Não efetuar mais cortes nos rendimentos dos trabalhadores e dos pensionistas”.
Como se o ensino profissional não fosse uma prioridade para Portugal, continua a teimar no vazio, insiste em que os jovens devem chegar à idade adulta sem conhecer uma profissão: “Cumprir a escolaridade obrigatória até aos 18 anos e atingir no final da legislatura a meta de 10% para o indicador do abandono escolar precoce, reduzindo assim este indicador para metade.”
E como não temos capacidade de auto-avaliação para fundamentais assuntos internos, vamos, mais uma vez, pedir socorro a instâncias internacionais: “Recorrer à OCDE para uma reavaliação do sistema educativo, tendo em conta as alterações profunda verificadas nos últimos anos ao nível dos currículos, do número de alunos por turma, da degradação das atividades de enriquecimento curricular ou dos processos de avaliação.”

E À ESQUERDA DO PS NÃO VEM NADA?

Infelizmente os partidos mais à esquerda não querem ser governo. Vivem e alimentam-se da trica e do cortar na casaca. São uma espécie de surfistas que montam a onda consoante o que o mar dá na sua imprevisibilidade. O Partido Comunista (PC) está para o país como a menina Etelvina, de oitenta anos e virgem, está para a minha rua. Sempre a dizer mal dos homens, que não prestam, que não valem nada, mas quando qualquer velhote, por melhor intenção que leve, se aproxima, a Etelvina repudia-o obsessivamente.
O argumento para não serem governo é que os portugueses não votam nas suas propostas e não querem mudança. Será que o PC não deveria ser menos programático e deixar de estar amarrado a velhas teses marxistas-leninistas e vir ao encontro dos eleitores com propostas mais de acordo com o momento social? Será que a direcção do partido se questionará de que o problema pode residir no seu próprio seio, sobretudo, e na falta de comunicação?
Com o Bloco de Esquerda é o que se sabe. Deste partido político não se espera nada. Ou seja, numa subdivisão de pequenos partidos, como O Livre, que progressivamente vai levar à sua fragmentação e desaparecimento, o Bloco esboroa-se como pedra sujeita à acção do tempo.

E O QUE RESTA?

A esperança para que a Oeste venha algo de novo, alguém que, sem medo e preto no branco, nos diga que se ganhar as próximas eleições através dos nossos reputados economistas vai apresentar um estudo macro-económico aos portugueses para reavaliar a nossa permanência na Comunidade Europeia e mantermo-nos no Sistema Monetário com o Euro como moeda. E a seguir convocar um Referendo Nacional para que, depois de devidamente informados com o agravamento de uma nova moeda de substituição, os portugueses decidam o que querem para o futuro desta Nação quase milenar e continuadamente nos mesmos problemas de bancarrota eminente.
O Euro é uma moeda forte que continua a levar Portugal para o abismo e a beneficiar outros Estados como a Alemanha, é assim ou não? Com este meio fiduciário de troca, na paridade, o que nos espera e aos nossos descendentes?
O sistema bancário, com o argumento do contágio sistémico, deve continuar igual, servindo famílias e banqueiros, e a ser alavancado pelos contribuintes?
O Tribunal Constitucional, com todo o respeito que merece, agradando a uns e desagradando a outros, deve continuar nos mesmos moldes? Enquanto supervisor da aleivosia governamental e última esperança do cidadão, com acórdãos políticos ou não, deve manter-se igual e insistir em substituir a oposição, reduzindo-a a mera moldura panegírica da sua acção de conter o Governo na sua sede de cortes nos rendimentos das famílias, e levar ao seu apagamento institucional e democrático?
Para poder elevar estas questões ao quadro nacional, no momento político que atravessamos, vejo apenas um sério candidato, sem rabos-de-palha, a ter liberdade para o fazer: Marinho e Pinto.
Aguardemos serenamente. Depois decido se voto ou não!


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