Esta semana, a vinte metros da
Praça Fausto Correia –outrora chamada Machado Assis-, na zona de Celas, em Coimbra, uma senhora de 74 anos
espetou uma faca no abdómen vindo a ser encontrada por familiares numa poça de
sangue e já sem vida. Em Fevereiro, a uma dezena de metros desta praceta,
também um meu amigo colocou termo à sua existência. Segundo um residente
próximo, nos últimos dois anos, 8 pessoas recorreram ao suicídio num raio de
uma centena de metros. Nenhum jornal da cidade relatou a morte desta senhora.
A primeira questão que nos
ocorrerá é tentar perceber se a zona terá algo de fatídico. Penso que não.
Estes factos estão apenas associados à grave crise emocional que atravessa o
país. Lembrei-me de escrever sobre este caso ao ler que “o consumo de medicamentos antidepressivos disparou no último ano, revela o relatório da Primavera do Observatório Nacional dos Sistemas
de Saúde, apresentado esta terça-feira em Lisboa. "De facto, há um acentuar dos
problemas de saúde mental, normalmente muito associados ao desemprego. Está a
aumentar o consumo de antidepressivos e isto é um alerta, afirma à Renascença a
coordenadora do estudo, Ana Escoval.”
Outra questão pertinente é tentar
entender até que ponto, com o argumento de que o suicídio é desencadeado por simpatia,
os jornais, com esta segregação de notícias e na maioria dos casos apresentando
estas mortes como de causas desconhecidas, estarão ou não a contribuir para
falsos diagnósticos e diminuição de um alerta social que urge discutir. Ou
seja, com o argumento de que se deve proteger a colectividade para estímulos de
ordem simpática, que levem à imitação de procedimentos, até que ponto não
estará esta sonegação de notícias a evitar o debate público sobre uma saúde mental
cada vez mais precária?
Os cortes na saúde nos países desenvolvidos e em vias de desenvolvimento estão a ser brutais. Ainda há pouco visionei um vídeo da
histeria de uma médica nas urgências no Rio de Janeiro perante o excesso de
trabalho da sua unidade hospitalar e, com centenas de pacientes em fila de
espera, em que o encerramento de outras periféricas era uma constatação.
Depois de vinte anos de um
Serviço Nacional de Saúde quase excelente, em que a vida era colocada acima de
qualquer outro valor ou interesse, hoje assiste-se a uma degradação continuada
dos serviços públicos e em que cada vez mais a morte provocada, sendo uma libertação das agruras existenciais, é um acto individual, pensado e escolhido, de
final feliz. Com os aumentos das taxas moderadoras e sem dinheiro para se
adquirir medicamentos, o suicídio é cada vez mais uma alternativa à saúde
primária dos portugueses. Talvez valha a pena pensar nisto.
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