quarta-feira, 14 de novembro de 2018

EDITORIAL: APBC, O MEALHEIRO DO DESPERDÍCIO




O que não é dito é que é que em 14 anos foram injectados
625 mil euros do erário público nesta agência e, numa
espécie de marcha fúnebre abrilhantada por orquestra,
com festas e festinhas, nada evitou o encerramento de
cerca de uma centena de estabelecimentos comerciais na
Baixa da cidade, alguns com grande relevo histórico.”




Ontem, em reunião do executivo, foi aprovado um subsídio à Agência para a Promoção da Baixa de Coimbra, de 55 mil euros, atribuído pela Câmara Municipal de Coimbra, para desenvolver as suas actividades durante este ano. Salienta-se que a proposta levada à discussão foi aprovada por unanimidade.
Antes de prosseguir, começo com uma ressalva: nada de pessoal me move contra os dirigentes desta associação sem fins lucrativos criada como embrião em 2004 e chamada de “Condomínio Comercial da Baixa de Coimbra” e em 2006, por força de lei, modificada para Agência para a Promoção da Baixa de Coimbra (APBC). Aliás, há mais de uma década que, mesmo quando os membros da direcção eram outros, escrevo sobre a actuação e os seus efeitos no tecido comercial da Baixa. Tal como outras normas políticas que poucos entendem, estes problemas já vêm de longe.
Continuando, a explicação por parte do município para a concessão deste apoio, citando o jornal Notícias de Coimbra, foi: APBC tem desenvolvido iniciativas de cariz comercial, cultural, turístico, de animação e interação com o comércio local, contribuindo para a dinamização do comércio tradicional e revivificação da Baixa de Coimbra, e tem sido apoiada pela autarquia para esse fim. Que as variadas as atividades que a APBC tem vindo a organizar com o objetivo de dinamizar o comércio local e atrair pessoas à Baixa de Coimbra. Desde eventos de vários géneros musicais a festas gastronómicas, passando pelas Marchas Populares, entre outras celebrações festivas, o programa proposto no ano passado foi cumprido. Para este ano a APBC já levou a cabo várias iniciativas, como por exemplo a Semana do Bacalhau, as Marchas Populares, a Festa da Sardinha, o Festival (in)Comum e as noites temáticas de fado e jazz”.
O que não é dito é que é que em 14 anos foram injectados 625 mil euros do erário público nesta agência e, numa espécie de marcha fúnebre abrilhantada por orquestra, com festas e festinhas, nada evitou o encerramento de cerca de uma centena de estabelecimentos comerciais na Baixa da cidade, alguns com grande relevo histórico. Tomemos atenção, também, que, para além da prestação camarária de 625 mil euros, houve mais do triplo atribuído através de fundos comunitários e aprovados pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro.
Sublinha-se que este executivo rosa, do PS, é mais, muito mais, generoso do que os anteriores pró-laranja, PSD/CDS/PPM. Adivinha-se que a razão desta magnanimidade residirá na simpatia. Há sempre alguns que, pelo saber mamar sem reclamar, são mais considerados que outros. E outros ainda que nem sequer são recebidos pelo chefe da edilidade. Mas, sem pretender ofender alguém, podemos perguntar: para que serve a APBC? Para entreter o povo? Para se substituir à Câmara Municipal? Para dar ideia que a edilidade está ao lado do sector comercial?
Enquanto o "antigo regime", desde a fundação como condomínio, bafejou anualmente a APBC com 35 mil euros, este novo governo, embora seguisse os seus antecessores com a mesma verba a partir de 2013 quando tomou posse, a partir de 2017, aumentou para 90 mil euros. Neste 2018, com a trapalhada da FanZone, já ultrapassou a importância do ano passado.


POR ONDE ANDA A OPOSIÇÃO? COMO É HÁBITO, DORME EM SERVIÇO


Ao aprovar por unanimidade esta nova ajuda à APBC, é a prova provada que a oposição, a reboque do partido mais votado no executivo, para além de estar pouco atenta ao que se passa e agir igualmente com displicência, não tem qualquer estratégia para o Centro Histórico. No mínimo, antes de aprovar este desperdício de verbas públicas, deveria pedir um balanço de actividades, avaliar se o que foi feito até agora foi um investimento ou despesa estéril, e questionar o que trouxe de positivo ao desenvolvimento desta parte velha o pródigo perdulário de mais de meio milhão de euros gastos em festas e assinaturas de protocolos. Já o escrevi anteriormente, com a tácita e santa ignorância desta oposição, em bloco, qualquer medida passa facilmente. Só não é aprovado se o seu veto implicar grande “show off” para mostrar aos eleitores o seu cumprimento pelas regras democráticas – como foi o caso do recente chumbo do projecto para o edifício da EDP. Está de ver que coerência não mora nas hostes da contraposição, sobretudo na CDU, que muda de opinião como o vento.

E OS COMERCIANTES? FALTA MUITO PARA ACORDAREM?


Por parte dos comerciantes, também como vem sendo costume, ninguém perde tempo a questionar as repetidas decisões de contra-desenvolvimento, pelo esbanjamento a peso de ouro de decisões que não trazem qualquer retorno à comunidade. Chegámos a uma época em que, por pior que seja, nada importa. Perderam-se a capacidade de manifestação de sofrimento, a massa crítica e a dignidade. O tempo presente é o da magia. Sem qualquer sustentação, surgem do nada as iniciativas espectaculares. A assistência, como anestesiada, bate palmas fervorosamente. Os efeitos, que não têm qualquer efeito de mudança na Baixa, como nevoeiro em manhã de Agosto, morrem tão rapidamente como nascem. Exemplos? Ai tantos, senhores! Só para relembrar alguns: o MuseuTemporário da Memória, o Orçamento Participativo.
Claro que tudo isto tem levado à deserção dos operadores comerciais em alinhar em encontros e aceitarem mensagens messiânicas, sobretudo em “dejá . Os comerciantes podem estar apáticos e sem fé no futuro, mas não são estúpidos! Nem sempre com papas e bolos se enganam todos os tolos! E isto, digo eu, por mais semanas do bacalhau quer alho que se promovam para beneficiar o sector da hotelaria. O resultado disto tudo é uma Baixa abandonada, sem esperança e sem planos para o futuro. Também é certo que é preciso saber para onde se quer ir, o que não é o caso.
Mas não há problema de maior. Pelo menos enquanto o silêncio de conluio da colectividade for o maior grito surdo de rebelião e houver dinheiro público, de todos nós, para distribuir aos muitos amigos – naturalmente que, em muitos casos, este remanso, esta paz podre, é o exigido ressarcimento em troca de uma inscrição anual nas Grandes Opções do Plano. Eles sabem-na toda!


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