sábado, 17 de novembro de 2018

BAIXA: O ÚLTIMO DIA DE SIMÃO, O MERCADOR


(Fotos de arquivo. Nesta altura, em 2011, com 50 anos de idade)





Desde o virar do milénio na Rua Martins de Carvalho, antiga Figueirinhas, junto ao Café Santa Cruz, que Simão Pedro era o baluarte da antiga via do jornal O Conimbricense. Seguindo a mesma linha de que tudo na nossa existência é precário, ontem encerrou a sua loja comercial.
Já em Outubro de 2011, quando escrevi a “Queda do Mercador”, a sobrevivência comercial de Simão era periclitante, no sentido de um equilíbrio difícil e perigoso numa senda mercantil que não é para todos. Mesmo assim, já com alguns sintomas da maleita que viria a tolher-lhe os movimentos, e sem retaguarda financeira, resistiu mais sete anos. Quando lhe pergunto como foi possível, do alto do seu olhar penetrante e corpo desengonçado, responde: “para onde é que eu ia? Como não tenho mais lugar algum para ir, fui estando… Com a boa vontade do meu senhorio. Foram muitos anos sem pagar renda. Estou-lhe muito grato pela paciência que teve comigo!
Simão Pedro tem agora 57 anos. De uma vida de subsistência, resta-lhe uma doença sem cura, a elefantíase -ou filariose, é uma doença parasitária que afeta a circulação linfática, causada por um parasita nematódeo, chamado Wuchereria bancrofti e conhecido como filária”.
É certo que também tem muitos amigos - e, pelos vistos nos últimos tempos, são eles que lhe tem valido -, mas quando a insuficncia é demasiada tudo se torna mais complicado. E neste grupo de chegados, Simão também recorda algumas assistentes sociais que o tem ajudado a calcorrear os dias, sobretudo quando teve de largar a sua casa de renda e se transferiu para um quarto arrendado na Baixa, a sua zona de conforto que alimenta a sua alma nos momentos mais difíceis e o ajuda a recarregar o ânimo.
Não se pense que Simão Pedro é tristonho e sorumbático. Nada disso! Há muito que aceitou que a vida não é o resultado do que queremos que seja mas uma soma de parcelas possíveis. Arrastando a sua perna tocada pela doença, é uma pessoa afável e sorridente. Num rosto endurecido e emoldurado por óculos de grossas armações em massa, o sorriso aberto parece querer dar-nos uma lição.

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