POR MÁRCIO RAMOS
Se há coisa que o Homem não controla é a Natureza.
Apesar de nesta luta titânica conseguir alguns pequenos sucessos temporários,
aqui e ali, o final é sempre o mesmo: a Natureza revolta-se, provocando danos
materiais e perdas humanas, e volta tudo ao estado inicial.
Apesar desta constatação, há tragédias que podem ser evitadas. O Rio Mondego, ainda não era eu nascido, transbordava o seu leito para as
margens e não foram poucas as vezes que a Baixa da cidade ficou inundada. No
verão era vê-lo quase seco. Esses tempos já lá vão. Daí, do seu transbordar
a cerca até ficar em fio de água, vem o cognome basófias.
Exceptuando a margem esquerda, que está na mesma linha de água, actualmente
não é fácil a zona direita ficar inundada, se bem que o perigo persista e, volta
e meia, o adro do Panteão Nacional fique alagado, mas este facto, alegadamente,
terá a ver com os esgotos mal limpos, e com o excesso de chuva.
O tempo foi passando, a cidade desenvolveu-se e, deixando de constituir
preocupação, foi esquecendo a rebeldia do seu rio. Construíram-se três pontes
destinadas ao tráfego automóvel. Através do Programa Polis, edificou-se o Parque Verde do Mondego
e uma outra ponte pedonal. Projectos que vieram, por um lado, aliviar o trânsito,
por outro, dar à cidade um espaço verde até aí abandonado e mal aproveitado. Com
estas obras, juntando um sistema de barragem que não comunica as suas descargas
para as autoridades competentes, o leito do Mondego ficou assoreado. Neste último
Inverno, por duas vezes, invadiu o Parque Verde e o sopé da colina de Santa Clara.
Depois da tempestade e de muitos danos causados a particulares, o governo anterior, no reinado de Passos Coelho, através da Agência Nacional do
Ambiente, anunciou o desassoreamento do rio, uma reivindicação exigida pela
autarquia há largos anos. Esta importante iniciativa fará com que Coimbra possa
aproveitar mais o lençol de água que se estende aos pés da cidade, quer
desportivamente, quer turistico, a academia de Coimbra já faz a regata
inserida no programa da Queima das Fitas. Para além disto, há um barco-restaurante
que passeia os visitantes pelas águas. Se o canal for limpo, atraindo mais
pessoas e turistas, irá também desenvolver a Baixa e toda a cidade.
Os meses foram passando e esqueceram-se todas as inundações, as mais recuadas e as recentes de Janeiro. O
investimento apalavrado não apareceu e, tal como outras obras prometidas para a
cidade –como o Metro Ligeiro de Superfície-, Coimbra, ao arrepio de Lisboa e
Porto, foi ficando para trás.
Como neste país a palavra dada, seja do Governo Nacional ou local, está
completamente esvaziada, olhamos agora para o anunciado, de que é desta que se
vai mesmo concretizar, e desconfiamos. A desconfiança começa sempre num
incumprimento. Depois, para restaurar a confiança, nem que as vacas voem mesmo à
nossa frente somos levados acreditar. Quando o vírus se instala é muito difícil
expurgá-lo e substituí-lo pela crença.
Ao ler há dias a versão online do
Diário de Coimbra fiquei irritado. É sabido que baixo-mondego, por estar abaixo
do rio, pode sofrer alagamentos severos, como já aconteceu no passado, por isso,
aliás, foi construída a ponte-açude para controlar o caudal.
Como se escreveu em cima, este ano o
basófias voltou afazer das suas, como faz quase todos anos no parque Mondego,
mas com tamanha violência que chegou ao convento, algo não visto há uns bons
anos.
Não sei quem são os “génios“ que declaram uma zona crítica, ou em que
pressupostos se baseiam. O que sei é que com esta avaliação negativa o baixo-mondego
já não recebe fundos europeus para ajudar a prevenir as cheias futuras. Com
isto, muito provavelmente se a Câmara Municipal não chamar a si a solução do
problema, o prometido desassoreamento fica inscrito nas calendas. Se esta
calamidade acontecesse em Lisboa ou Porto teria o mesmo tratamento? Claro que
não! Coimbra está constantemente a ser prejudicada em todas as vertentes pelo
poder central. Só para exemplificar, os serviços de transportes colectivos de
Lisboa e Porto são financiados pelo Estado. Em Coimbra é a autarquia que
assegura o financiamento dos transportes urbanos locais.
A edilidade quer -e bem- abrir a Avenida Central e acabar com o cancro
que envergonha a Baixa. Há uma iniciativa em curso –incentivada pelo movimento
Cidadãos por Coimbra- que, alegando que o aborto vai gerar um monstro, quer
deixar ficar tudo como está. Ou seja, seguindo o exemplo da construção do
metro, discute-se, discute-se até à exaustão, baralha-se as pessoas, e os
projectos não avançam. Perde-se tanto tempo que quando finalmente há luz verde
já está desactualizado e já não serve os conimbricenses.
Pergunto, a que se deve a cidade estar sempre a ser marginalizada e fora do
contexto nacional? A culpa será de D. Sebastião, e da espera messiânica de que
um dia alguém sairá da bruma para a salvar? De D. Dinis, da Universidade, que é
lenta a decidir, da Rainha Santa? Dos governos centrais, com sede em Lisboa e
com uma visão egoísta, ou dos agentes políticos locais que, numa procura de
protagonismo, colocando o pau na roda e, com isso, tentando ganhar notoriedade,
provocam a desconfiança, o caos para reinar?
Não entendo porque há tantos milhões para salvar bancos, mas para
desenvolver uma cidade e a sua região o que aparecem são notas de desculpas
esfarrapadas.
Apesar da minha pouca fé nos políticos decisores, quero acreditar que um dia esta
cidade grandiosa, que é Coimbra, rebente com as suas amarras e se imponha em
Portugal e no Mundo globalizado.
1 comentário:
Então acabasse com o "cancro" abrindo um buraco, em frente a Santa Cruz, para passarem carros.
Respeito os dois senhores, até por viverem na Baixa, mas francamente...
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