Sem devidamente informar os comerciantes, a
APBC, Agência para a Promoção da Baixa de Coimbra, decidiu, de per si e unilateralmente, através da
imprensa diária desafiar os lojistas a estarem abertos ontem, sexta-feira, até
à meia-noite. Para quem leu, a notícia veio publicada nos jornais diários da
última quarta-feira. No interior, o Diário as Beiras com o título “Noites temáticas anima a Baixa” e o
Diário de Coimbra com “Jogo ajuda a
divulgar lojas da Baixa de Coimbra”.
Os periódicos, há três dias, informavam
que nos próximos três meses, temas variados como enigmas, arte, moda, fado,
teatro, durante quatro noites temáticas, na última sexta-feira de cada mês, a
APBC, “para animar “os serões” quentes
que prometem “ressuscitar o comércio local da zona histórica”, desafia os
comerciantes a abrirem as suas portas até às 24h00.
Tanto quanto sei, para além desta
informação jornalística, mais nenhuma comunicação foi passada aos comerciantes.
Resultado desta acção? De um leque abrangente
de cerca de 300 estabelecimentos comerciais, só 20 lojas estiveram ontem abertas
até mais tarde –saliento que onze faziam parte desta iniciativa e, como
parceiros, foram contactados previamente para servirem a logística dos jogos de
enigma. O que, na prática, quer dizer que, para além deles, só nove colaboraram
na pretensão.
HOMEM, NÃO HÁ GRAÇA QUE TE CONTENTE
Pode até parecer que, imbuído de um espírito
negativista, estou simplesmente a querer mandar abaixo a diligência encetada
pela APBC. Nada disso! O que pretendo é uma reflexão, caso contrário, os poucos
que ainda vão colaborando nestas actividades de reanimação urbana desistem
também.
Como salvaguarda, estive cá ontem
e, até agora, tenho estado sempre que posso. E estando presente, quando outros
colegas não estiveram porque presumivelmente não foram informados, tenho toda a
legitimidade de pensar que, por parte da direcção da APBC, houve abuso de
posição dominante. Transformando isto em miúdos, quero dizer que organizar uma
alegoria desta envergadura sem prazo prévio, decidindo e sem contactar os visados,
é o mesmo que mostrar que “eu penso,
decido e espalho ao vento. Quem quiser colabora, quem não quiser é um problema
dele”.
Por que a questão fundamental que
se coloca é: para realizar estes eventos a APBC precisa dos comerciantes? Mais
abaixo responderei a esta interrogação.
HÁ UM APBCXIT (UM DIVÓRCIO) EM MARCHA?
Há uma semana, também em parceria com outras
entidades, foram organizadas pela APBC as Marchas Populares, um espectáculo
cénico, de som, luz e cor, que, tal como em anos anteriores, resulta sempre em
número de visitantes à Baixa. Ao apelo da agência, para manterem os
estabelecimentos comerciais abertos até à meia-noite, responderam positivamente
cerca de quatro dezenas de lojistas –lembro que a APBC tem cerca de 70 associados
e a Baixa detém, aproximadamente, cerca de 300 estabelecimentos comerciais.
MAS, AFINAL, O QUE SE PASSA?
Há um ano atrás, em 17 de Junho de 2015, no
antigo Salão Brazil e perante uma pequena audiência de comerciantes, Vitor
Marques, o presidente da APBC, disse o seguinte: “A ideia é debater o futuro da APBC. Por outro lado, também
receber os comerciantes. Tentámos nos últimos seis meses e apareceu uma pessoa.
Esta é a segunda tentativa. Tomámos posse em Abril de 2014. A APBC é
constituída por oito elementos; sete são ligados a actividades comerciais e um
faz a ponte entre os anseios dos comerciantes e a Câmara Municipal. A agência
tem 70 associados na actualidade”.
Já este ano, em 29 de Fevereiro, também no
antigo Salão Brazil e já com uma plateia mais composta, Vitor Marques, perante
a assistência, disse, preto no branco, que as noites brancas não faziam sentido e que, enquanto programa conjunto
de animação entre os operadores, tinham de ser reformuladas. E foram? Fosse por
compromisso prévio assumido ou não, a verdade é que tudo continua igual. Igual,
como quem diz, ou melhor, diferente porque a participação dos comerciantes
continua a minguar.
E POR QUE SE MANTÉM O SITUACIONISMO?
As noites
brancas são um grande negócio para a hotelaria. O comércio, nestas noites
de folia, é simplesmente um travesseiro a suportar o suor dos amantes. Pouco ou
nada factura, esta é a questão principal. E já vem de longe esta situação. Por outro lado, os lojistas sentem-se
actores de um teatro de fantoches, pouco reconhecidos, usados e mal-pagos. É
preciso não esquecer que estes programas financiados por dinheiros públicos têm
por objecto a dinamização do comércio. Ora, repetindo, o que está acontecer é
que estas festas estão a servir exclusivamente a indústria hoteleira. E o definhamento do comércio tradicional continua.
Por outro lado, a meu ver, estes
eventos estão demasiadamente politizados. Isto é, perdendo-se a objectividade, na
racionalidade, defende-se para a frente. Continuando a fazer mais do mesmo, a
transformar uma mentira em verdade, perpassa a ideia pública de sucesso e quem
decide e apoia –no caso a Câmara Municipal, com o departamento de cultura-
capitaliza dividendos. Porque, como se sabe, o que está em causa é fazer,
fazer, fazer. O povo gosta de obreiros. Se os projectos estão feridos de
eficácia? Bom, isso, essa discussão é para os descontentes, aqueles que
questionam, poucos, que nunca se dão por satisfeitos. E para quem decide num
autismo completo sem ouvir ninguém, os inconformados, que só chateiam, não
contam para nada. É um mero jogo de poder. Siga a procissão que o senhor abade
está a benzer o dia!
E O QUE SE PODE FAZER?
Por ventura, esta será a resposta que valeria
um milhão de euros. Mas, de premissa em premissa, alcança-se a conclusão. Ou
seja, sabe-se que este arquétipo das noites
brancas, a envolver o comércio, já foi chão que deu uvas. Então, seguindo a
lógica, se pela noite dentro os comerciantes não embarcam, porque não
experimentar durante o dia? Vale a pena continuar a remar contra a maré?
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