terça-feira, 11 de junho de 2019

ATENÇÃO INQUILINOS, E PROPRIETÁRIOS (COMERCIANTES E OUTROS) - ARTIGO REVISTO

(Imagem de Leonardo Braga Pinheiro)





Por desconhecimento, estou em crer, estão a ser transaccionados prédios na Baixa em propriedade vertical (com um único artigo a englobar várias fracções) cujo direito de preferência não está a ser comunicado devidamente por parte dos senhorios aos seus arrendatários com contratos habitacionais. Tal lacuna, como é lógico, pode implicar danos patrimoniais para uns e outros.

1 - Em 29 de Outubro passado foi publicada a Lei 64/2018 que alterou substancialmente o artigo 1091º do Código Civil no que toca à preferência dos inquilinos. Ou seja, até àquela data sempre que se vendesse um prédio com um único número de artigo inscrito na matriz predial a obrigatória comunicação ao arrendatário para exercer o seu legítimo direito de preferência era feita a incidir no valor global de todo o edificado.

Não percebeu? Vou explicar melhor: Até 29 de Outubro de 2018, um proprietário negociava um prédio, com loja no rés-do-chão e dois andares superiores todos arrendados, (com um único artigo matricial) pelo valor de 100,000.00 €. Estava obrigado a comunicar a todos os inquilinos com contratos de arrendamento há mais de três anos a possibilidade de qualquer um deles ou em com-propriedade poder adquirir o bem, por inteiro, pelo valor de venda (100,000.00€).

2- Após a publicação da Lei em 29 de Outubro de 2018, foi alterado o exercício da preferência para todos os contratos com mais de dois anos – até aqui era superior a três anos.
E mais, e aqui é que reside a matéria fulcral que veio modificar toda a essência das coisas. Sendo mais claro, o exercício da preferência foi alargado também ao locado arrendado. Isto é, o inquilino com contrato para habitação passou a poder adquirir unicamente o seu espaço contratualizado -ou o prédio em bloco.
Mais, e atenção: na comunicação, para além do preço total do prédio, passou também a ser obrigatório referir o preço de cada fracção habitacional proporcional, por permilagem -esta informação deverá ser constante na informação a cada um dos inquilinos promitentes interessados em exercer o direito de preferência.

Não fui muito claro, pois não? Não há problema, volto a explicar: Depois de 29 de Outubro de 2018, um prédio com loja comercial no rés-do-chão, ocupada, e dois andares superiores com contratos de arrendamento cujo valor total será de 100,000.00€ vai ter de ser comunicado aos inquilinos com o preço correspondente individualmente. Ou seja, por hipótese, ao inquilino do primeiro-andar o valor é 40,000.00€. Ao do segundo-andar, sendo idêntico, será também informado do mesmo valor de 40,000.00€. O inquilino do rês-do-chão, por ser arrendamento comercial, não está abarcado pela preferência da sua quota-parte. Isto é, só pode comprar o prédio por inteiro.

ATENÇÃO:

-Aos lojistas está vedada esta possibilidade de adquirirem a sua quota-parte arrendada para comércio, indústria, serviços, ou outros.
-Sobre pena de caducidade, o prazo de resposta por parte dos inquilinos habitacionais é de 30 dias.
-As comunicações entre senhorios e locatários é sempre feita por carta registada com aviso de recepção (a contar da data de recebimento).
-Na parte habitacional, para usufruir do direito o inquilino tem de garantir que a finalidade da compra é para habitação própria e não para outro fim qualquer, como arrendamento para estudantes, por exemplo.

Já percebeu? Ou nem por isso? Esta leitura é apenas uma chamada de atenção. O passo seguinte deve ser dado na direcção da consulta de um advogado.

Como há pouca informação na Internet sobre esta problemática, deixo uma minuta (carta-tipo) a ser utilizada por proprietários:


ASSUNTO: EXERCÍCIO DO DIREITO DE PREFERÊNCIA (APENAS PARA HABITAÇÃO)



Conforme já é do seu conhecimento, estão avançadas as negociações para venda do prédio em propriedade vertical, inscrito com o artigo matricial …………, situado em………………….....em que V. Ex.ª é inquilino do segundo-andar.
De acordo com o Código Civil Português, artigos 1091º, 416º e 417º, e alterado pela Lei 64/2018, de 29 de Outubro, pode exercer o direito de preferência para todo o edifício ou apenas para o locado que ocupa contratualmente.
O valor atribuído por permilagem à fracção correspondente ao andar, em que V. Ex.ª é digno arrendatário, é de ………………......€, digo, …………………………………………..
Mais digo que o valor atribuído ao primeiro-andar é de………………€, digo, ……………………………… ......................................................................................................
Mais informo que o valor total para todo o edifício, respectivamente, rés-do-chão, primeiro-andar, segundo-andar, é de ………………..€, digo, ………………………….........
Com os melhores cumprimentos.


Coimbra, ….. de …………. de 2019


O Proprietário:


NOTA DE RODAPÉ:



Esta Lei 64/2018, a 29 de Outubro de 2018, segundo o Ekonomista, foi aprovado a 21 de setembro de 2018 pela Assembleia da República, com votos contra de PSD e CDS-PP e a favor de PS, BE, PCP, PEV e PAN. (Depois de uma segunda alternativa) O novo diploma foi promulgado pelo Presidente da República a 12 de outubro de 2018, depois da primeira versão ter merecido o veto presidencial.”
Segundo julgo saber, o PSD pediu a fiscalização sucessiva de constitucionalidade da lei ao Tribunal Constitucional. De grosso modo, pode verificar-se que os comerciantes, sendo parte integrante de um leque de arrendatários num prédio, comercial e habitacional, são discriminados em relação aos seus congéneres com contratos para habitação.
Por outro lado, dá para ver que basta um inquilino (habitacional) expressar o seu interesse na sua fracção para imediatamente o pré-contrato de venda se extinguir por parte do promitente comprador. Ou seja, com este diploma, foi criado um instrumento temporário de destruição para qualquer contrato patrimonial de compra e venda.
Por outro lado ainda, sendo esta lei aprovada apenas com os votos da esquerda, fica bem sublinhada a sua preocupação com o comércio de rua. Com esta sua posição, não deixam dúvidas sobre o que pensam sobre o comércio tradicional: pura e simplesmente, não conta nada para o desenvolvimento das cidades, vilas e aldeias.

E mais: está criado um sério imbróglio jurídico. Até onde vão dar as consequências desta lei? Não se sabe! Vale a pena ler esta crónica publicada na página da Ordem dos Advogados (antes de ser promulgada pelo Presidente da República).





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