Promovido pela CPPME, Confederação Portuguesa
das Micro, Pequenas e Médias Empresas, o debate, entre candidatos à eleição de
deputados pelo círculo de Coimbra, ontem, estava anunciado para as 21h00, no
Conservatório de Música da cidade. Com moderação de João Bizarro, jornalista da
TVI, o painel era constituído por João Galamba, pelo PS, Nuno Encarnação, pela
Coligação PSD/CDS, Gisela Martins, pelo BE –em substituição de José Manuel
Pureza-, e Manuel Rocha, pela coligação PCP/PEV.
Fosse porque havia futebol, fosse porque
chovia intensamente, a verdade é que mesmo depois do quarto-de-hora académico a
sala continuava vazia e com maior número de participantes na mesa do que no
público presente. Numa espera tácita por quem não prometeu ir, aguardou-se e já
depois das 21h30 com a sala meia cheia –ou meia-vazia, dependendo da perspectiva-,
constituída a assistência por cerca de trinta pessoas, sobretudo por pessoal de
apoio afecto às candidaturas presentes. Nomes sonantes, pelo PS estiveram presentes Elza Pais, Carlos Cidade e Mário Ruivo. Pelo PSD esteve Carlos Páscoa. Comerciantes
da Baixa conhecidos: três (ainda) em actividade e um já arredado do exercício
mercantil. Empresários conhecidos: um, ligado à tipografia.
Em representação da CPPME, Arménio Pratas
agradeceu a todos os presentes, incluindo os políticos partidários, a sua vinda
a este encontro.
E BIZARRO DÁ O TIRO DE PARTIDA
João Bizarro, o anunciado moderador, apresenta
os cumprimentos da praxe e, com “a
amabilidade e a cordialidade que nos caracteriza em Coimbra”, deu início ao
pretenso debate.
Fala João (Galamba)
-em síntese: “As PME, Pequenas e Médias
Empresas, foram muito afectadas nos últimos anos. As MPME, as Micro, Pequenas e
Médias Empresas foram muito afectadas. Devido a um programa de ajustamento
muito violento, foi por isso que as falências estouraram. O mercado interno foi
o mais prejudicado nos últimos anos. Precisamos de desenvolver o consumo, sendo
auto-sustentável, mas não pode ser à custa de importação de automóveis e
plasmas. Foi o que vimos no último ano. Voltou o círculo virtuoso. A dívida é
impagável a longo prazo. As nossas propostas, que fazem parte do programa do
PS, são ajudar as MPME. E relançar a reabilitação urbana.”
Fala Nuno (Encarnação)
–em síntese: “O Governo tem apostado na
descida de IRC e as propostas seguem nesse sentido. É fundamental que as exportações
continuem a ter um peso grande na economia. Vale a pena percorrer a Baixa. Está
a recuperar. Todos achavam que era impossível acontecer. Na zona de
Quebra-costas o turismo é avassalador. O fado de Coimbra começou a ser tocado
durante o dia –ninguém pensava nisso! Conheço porque vivi aqui até aos vinte e
poucos anos. As pessoas acreditam que estão a recuperar. O pior já passou. O
melhor está para vir. Pretendemos pagar rapidamente a dívida. Tem de haver o
compromisso.”
Fala Gisele
(Martins) –em síntese: “O que assistimos
nos quatro últimos anos foi a uma política austeritária. Foi a discriminação
dos rendimentos. As PME, Pequenas e Médias Empresas, representam 98 por cento
do todo nacional. O futuro –que defendemos- tem de passar pela diminuição dos
custos energéticos e financiamento ao crédito. O Bloco defende a nacionalização
da Banca para se ter acesso ao crédito. A factura energética é superior em
cerca de 10 por cento em Portugal –em comparação com os pares europeus. É
preciso que o IVA passe de 23 para 6 por cento, como estava anteriormente. A
descida do IRC beneficia apenas as grandes empresas. Defendemos a alteração ao
Regime do IVA e o fim da criminalização pelo atraso no pagamento do imposto
acrescentado. Há que estimular a procura interna."
Fala Manuel
(Rocha) –em síntese: O que vemos na Baixa
é a desertificação. Vemos muitas lojas encerradas e outras a abrir e, passado
pouco tempo, encerrar. Nos anos de 1990, quando retiraram os eléctricos e o
trânsito automóvel das ruas largas, um taxista disse-me: “começa aqui o fim da
Baixa. Os velhinhos deixam de poder ir ao café". Poucos anos depois o café Arcádia
fechou. Não é para me gabar, mas estive na Córsega de férias. Vi que o turismo
excessivo fez abandonar as actividades tradicionais. Os pequenos produtores, lá
como cá, não conseguem colocar os seus produtos à venda. Após 8 anos de
declínio, não estamos a evitar o estrangulamento da dívida. Estamos no tempo
das promessas amáveis.”
DE UM DEBATE PARA REBATE
Com João
Bizarro como moderador anunciado a moderação não existiu. Os candidatos a
deputados falaram até lhes apetecer –excepto no final quando foi retirado o pio
a Rocha. Foi um rebater, a remoer, de argumentos entre eles durante mais de
duas horas. Utilizando linguagem futebolística, o esférico driblava da ponta direita
à esquerda, livremente e sem regras de relógio. Claro que a consequência foi
faltar tempo para quem tinha assuntos a debater ou procurava ser esclarecido.
Foi preciso um dos organizadores levantar-se e, ao ouvido do moderador,
perguntar se tinha esquecido quem lá se tinha deslocado. Foram então dados 20
minutos para o público. Escusado será dizer que ninguém ficou elucidado porque,
creio, essa também era a intenção. Como já é costume neste tipo de debates, o
que se pretende é enrolar, enrolar até à exaustão e esgotar o tempo para que
não haja perguntas incómodas.
TUDO EM FAMÍLIA
Como é muito
próprio nos meios pequenos, onde todos se conhecem e são amigos, naquele painel
só havia um “estrangeiro”: João
Galamba. Os restantes, desde Bizarro a Encarnação, passando por Gisele e até
Rocha, como foi dito várias vezes, eram todos amigos e, naturalmente, o que se
procurava era convencer o (pouco) eleitorado presente a votar no partido a que
cada estava alocado e sempre sem beliscar a amizade.
ONDE ESTÁ VERDADE?
Como dizia o
outro (Nietzche), se a verdade é uma mera convicção, ali cada um procurava
explanar uma realidade vista do seu próprio olho. Ninguém, incluindo o público
presente e a usar da palavra, estava interessado em despejar o seu saco,
contando tudo, mas antes somente levantar a ponta do véu. Era como se todos
procurassem a verdade divina –que naturalmente só acontecerá quando Deus vier à
Terra- sem se confessarem em acto sincero de contrição.
TOU XIM?
A maior
barraca, despoletada por um barraqueiro muito próximo de mim e que conheço bem, foi
quando foi dito a Nuno Encarnação, candidato pela Coligação PSD/CDS, que era
uma falta de respeito estar embrenhado com os olhos no telemóvel e a escrever
quando um ex-comerciante, presente, pediu a palavra e expunha a sua situação. O
candidato, laranja de nascença, passou a verde e depois a vermelho. E teve
necessidade de explicar que esteve ao smartphone
à procura de uns números para dar a explicação. Como era de prever –para o cabeça dura que lhe descobriu o
mau-jeito- não convenceu. Antes deixou no ar a ideia de que não ia muito
preparado para o debate –se bem que, valha-o Deus, nenhum dos colegas
demonstrou o contrário. Por isso mesmo a recorrência a chavões como a Segurança
Social, a dívida (odiosa para uns amorosa para outros), o IVA da restauração,
foi uma constante.
O BRILHANTE E O HUMORISTA
Duas demonstrações
ali ficaram bem patentes. João Galamba, o novo Louçã do Parlamento e futuro
líder do PS, convenceu na argumentação. Este jovem –de cerca de trinta anos- é
brilhante a argumentar. Do que fala, com simplicidade e convicção, sabe o que
diz, e convence. Com todo o mérito, o homem do piercing vai longe.
Outro
candidato que dá prazer ouvir é Manuel Rocha. Com um humor sibilino,
inteligente, com recurso fácil a metáforas e figuras de estilo, consegue passar
a mensagem marxista-leninista sem grande dificuldade. Espantoso como este
músico sabe dar música a quem o ouve! Como é de prever, vai ser eleito e, tal
como Galamba, vamos ter, todos, a felicidade de o poder ouvir no hemiciclo.
Ambos, Rocha
e Galamba, salvaram o pouco que se aproveitou do esclarecimento que se
procurava e não existiu.
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