quinta-feira, 12 de junho de 2014

SOS: APOIO PSICOLÓGICO PARA OS COMERCIANTES

(Imagem retirada de aqui)


O homem de meia-idade que tenho à minha frente chora desalmadamente. Aqueles olhos avermelhados, como quem passou a noite inteira sem pregar olho e a matutar numa existência sem horizonte, estão circundados com umas intensas olheiras negras. Naquela barba de dois dias, a fazer lembrar um campo de trigo a emergir da terra negra vergastada pela canícula, duas lágrimas teimam em rolar lentamente. Conheço-o bem. Há muitos, muitos anos que é comerciante na Baixa da cidade. O que sempre me impressionou nele foi a sua postura altiva, a fazer lembrar a palmeira solitária e erecta de um jardim à beira da estrada. Pareceu-me sempre uma fortaleza inexpugnável. A pessoa que se contorce ao meu lado com amarguras de alma não tem nada a ver com o comerciante que conheci. O homem com quem troco umas palavras de alento, em metáfora, é o destroço de um navio que foi rei dos mares. É uma sombra de alguém que me recorda alguém. As suas palavras saem-lhe entrecortadas em farrapos de aflição: “não aguento mais! Estou esgotado! Com o meu negócio a falhar diariamente, sinto a minha vida como um castelo de cartas a tombar sobre uma mesa de jogo. Por inerência, a minha vida familiar está desfazer-se e o meu casamento de décadas a esbater-se em frangalhos como onda na areia da praia. Faltam-me as forças. Não aguento!...Não aguento…! –mas não escreva nada sobre isto! Promete? Promete…?”
Esta descrição pode até parecer inventada mas é mesmo real. Nos últimos tempos, visto com os meus olhos de sensibilidade, dá para verificar que muitos comerciantes, homens e mulheres com quem falo, desatam num pranto inexplicável. A depressão, como manto negro de solidão, tomou conta das suas vidas. É visível que se sentem perdidos nesta imensidão de tempo sem futuro à vista. Alguma coisa deve ser feita, e com urgência, dentro do campo psicológico. Já há dois anos escrevi sobre este assunto e nada foi feito. Algumas entidades com responsabilidade social, entre elas a Câmara Municipal de Coimbra, antes que ocorram tragédias neste sector profissional, deveria mandar investigar e sobretudo pedir ajuda à Faculdade Psicologia da Universidade de Coimbra.
Bem sei que sou eu a escrever –e nem sequer tenho qualquer formação na área- e valerá o que valer, mas, pelo que constato todos os dias, estou deveras preocupado. Fica a chamada de atenção.


(Tal como há dois anos, defendendo a criação de um gabinete de apoio psicológico na Baixa, enviei este texto para a Câmara Municipal de Coimbra)



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