(Imagem da Web)
O que assistimos há vários anos com incêndios a, por um lado, devastar a nossa periclitante riqueza nacional e, por outro, com a perda de vida destes homens e mulheres da paz brada aos céus. Só se pode entender esta apatia num Estado de direito, frouxo, em coma e com morte anunciada, completamente insolvente nos princípios e nos deveres. Enquanto organização territorial e, em Contrato Social, representante de todos os seus concidadãos deveria ter obrigação, com pulso de ferro, de pôr termo a esta calamidade. O que está acontecer é demasiado grave para se continuar a olhar para o horizonte perdido.
É muito feio auto-citar-me, mas, mesmo assim, para não ter de, passados três anos, escrever outra vez a mesma coisa, vou deixar este texto aqui plasmado em 11 de Agosto de 2010.
ESTE ESTADO DE CALAMIDADE
No jornal Público de hoje o
ministro da Administração Interna, Rui Pereira –chefe da Unidade de Missão para
a reforma dos actuais Códigos de Processo e Penal-, em fotografia inserida,
aparece de mãos nos bolsos. Junto à foto são transcritas as declarações do
membro do actual governo: “Rui Pereira comparou ontem alguns fogos florestais a
“teatros de guerra”. Insistiu para que os portugueses tenham comportamentos
cívicos nos dias de muito calor, como os que estão previstos para o próximo
fim-de-semana, em que há centenas de festas e romarias por todo o país”.
Antes de prosseguir, gostaria de
lembrar que ontem, em Gondomar, num grande incêndio, morreu mais um bombeiro.
No caso uma estudante, de nome Josefa, de 21 anos.
Ora, pegando no extracto do
Público –mesmo retirando a foto de mãos nos bolsos-, vemos imediatamente que
perante as declarações do governante há uma saliente disfunção no discurso. Ou
seja, por um lado Rui Pereira compara os incêndios a “teatros de guerra”, por
outro, apela a comportamentos cívicos dos portugueses. Naturalmente que a gota
não dá com a “perdigota”. “Cenários de guerra” estão adstritos a lei especial,
normalmente a lei marcial. Por conseguinte, se o ministro o admite, há que
criar legislação extraordinária para o efeito. O que esperará o Governo para
criar tribunais especiais para combater a calamidade dos incêndios? O que
esperará o ministro para propor alterações ao Código Penal, aumentando a
moldura penal, e equiparar o fogo-posto a terrorismo?
Estas serão as medidas coercivas
necessárias perante a desconcertante apatia de se assistir à morte de bombeiros
no combate a incêndios, numa grande maioria provocados intencionalmente por mão
humana. Um pirómano, apanhado em flagrante, deveria ser imediatamente julgado em
sumaríssimo. Em caso de dúvida e nos casos de não flagrante delito, e em
necessidade de inquérito, o prevaricador deveria ser sujeito a julgamento no
prazo máximo de 30 dias, impreterivelmente. Continuar a julgar estes
terroristas em tribunais comuns, no mínimo, brada aos céus. É um desrespeito
perante a vida esforçada e a morte continuada de soldados da paz.
Ao mesmo tempo, é preciso apostar
em medidas de prevenção. Por exemplo, no inverno, em vez de se continuar a
mandar usufrutuários de RSI, Rendimento Social de Inserção, para cursos
profissionais que, salvo excepções, não servem para nada, porque não
reencaminhá-los para apoiar os donos das matas? O Estado criou legislação
obrigatória para os proprietários limparem os pinhais, mas, devido à continuada
descapitalização do sector, não podem cumprir a lei. As consequências desta
omissão é continuar, ano após ano, a arder um significativo património
ambiental do país. Basta lembrar que neste último fim-de-semana houve mais de
mil incêndios assinalados.
É preciso, de uma vez por todas,
começar a inventariar e a planear a floresta. Acabar com a exagerada
proliferação de eucaliptos e incentivar a plantação de outras árvores em
substituição do pinheiro –veja-se o que está acontecer com a praga do Nemátodo.
É preciso incentivar (novamente)
a desaparecida agricultura de subsistência.
Em vez de se darem subsídios aos
desempregados de longa duração para investirem no comércio –que está
sobrelotado-, é necessário incentivar estas pessoas a apostarem na agricultura
–desde que o Estado garanta o escoamento dos produtos para as diversas
instituições, forças armadas, hospitais, IPSS’s, etc.
É preciso reabrir novamente as
feiras de gado. Para levar à criação de animais nas aldeias, como antigamente.
Quem é da província sabe que os matos dos pinhais eram roçados para fazer a
cama aos animais domésticos. Acabou-se com esta produção, naturalmente, deixou
de se roçar os matagais por essa floresta fora.
É necessário reconhecer, através
de estremas e marcos divisórios, inventariar a propriedade rústica e, tal como
no “baixo-mondego”, desenvolver o emparcelamento da pequena propriedade.
Se nada for feito, e o ministro
da Administração Interna continuar de mãos nos bolsos a apelar ao comportamento
cívico dos portugueses, um dia destes, porque deixará de haver mata para
incendiar, começará na sua casa, na minha, na do vizinho. O pirómano precisa de
continuar o espectáculo.
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