terça-feira, 13 de agosto de 2013

É PRECISO TRABALHAR OU DESCANSAR? (2)

(Imagem da Web)



 É dos livros da sociologia, sabe-se que as nações subdesenvolvidas à medida que vão caminhando para o desenvolvimento pleno, progressivamente, vão abandonando a terra e tudo o que seja trabalho árduo, incluindo indústrias pesadas. Tenderão em virar-se para os serviços e para a terciarização. Aparentemente, como se caminhassem na direcção do pico da eficácia e da excelência distributiva, exigirão dos governos nacionais cada vez maior atenção à satisfação do seu bem-estar individual e familiar. Se é certo que esta reivindicação popular acaba por funcionar para o bem geral, porém, salvo excepções, este interesse é profundamente egoísta e pouco interessado no bem-comum. Sempre em crescendo, os cidadãos autóctones, para além de trabalharem cada vez menos e outorgarem cada vez mais direitos, imporão a sua força unitária que, ajudados pela comunicação social e pela mimética, se tornará colectiva enquanto massa abstrata com poder de influência junto do poder central. Através das reivindicações sociais junto dos eleitos, continuarão a somar sucessos e verão todos os seus pedidos satisfeitos, alguns até ridículos. Por sua vez, os executivos, banqueteando-se em opíparos festins, gastando à tripa forra e legislando em causa própria e satisfazendo o séquito clientelar, acima de tudo mais interessados em ganhar eleições do que gerir a coisa pública com eficiência e racionalidade, vão cedendo, cedendo, até um momento em que não será mais possível continuar. Já só resta o crédito internacional para satisfazer e manter os vícios acumulados. Significa que, seguindo o passado histórico, se atingiu o ponto zero e, portanto, estará eminente a bancarrota da classe média, a tal burguesia que sempre esteve à frente das revoluções. Quer dizer que se atingiu o vértice da pirâmide e a partir daí se entra no plano descendente. Numa espécie de eterno retorno, onde o reajustamento surge como uma necessidade absoluta, vão tombando todas as conquistas sociais até aí conseguidas. Se não acontecer um corte societário horizontal, um motim, só pararão de cair quando se conseguir um nivelamento entre a riqueza produzida e os serviços públicos oferecidos à população.
Em retrospectiva, olhando para o nosso país, foi o que aconteceu mais incisivamente a partir de Abril de 1974 até aos nossos dias. A sociedade portuguesa, produzindo cada vez menos, através do crédito bancário fácil, transformando-se numa obsessiva máquina de consumo, passou a querer cada vez mais e mais. Entrámos todos neste túnel sem retorno e chegámos à realidade. Em choque, verificamos, todos, que foram décadas de desenvolvimento ilusório e, agora, vamos pagar com juros de língua de palmo. De famílias maioritariamente tristonhas e miseráveis, sem quase nada, na década de 1970, nestes quarenta anos passámos a proles felizárias e contentes, a balouçar na bipolaridade, e que quando a tristeza tocava a alma íamos fazer compras ao shopping para recuperar a auto-estima abalada. E assim, nesta mania pelo haver e com muito deve à mistura, passámos a ter tudo em triplicado: 3 casas que não usávamos plenamente; três automóveis que não rodavam pela desnecessidade; três frigoríficos que só um se abria diariamente; três televisões em que apenas a da sala principal funcionava em pleno; três computadores, dois sem utilização; três transportes públicos alternativos sem ser transportado por nenhum; três serviços de saúde à escolha servindo-se do privado; três contas bancárias, em que uma chegava perfeitamente; e três amantes, em que nenhum deles, nem mesmo o/a legítimo/a, era amado/a como deveria ser.
Mesmo com o descalabro das contas públicas, e constantes cortes nos rendimentos privados, continuamos, quase na generalidade, a privilegiar o ócio em detrimento do trabalho. Largámos os bens duradouros –aliás, não sabemos o que lhe havemos de fazer. Como símbolos de um tempo que não volta mais, os frigoríficos e tudo o que for excedente jazem abandonados lá em casa à espera de um destino o menos destrutivo possível. Naturalmente que ninguém se interessa por tais velharias que sem idade e uso passaram a ser. Agora estamos transformados numa sociedade hedonista, asséptica, amoral, que tem apenas por objecto o prazer pessoal. Basta-nos uma cabana rudimentar e um amor de ocasião. Os de longa data dão muito trabalho a manter, sobretudo se um dos conjugues tem uma visão mais pragmática, olha o futuro com preocupação e não embarca neste usar e deitar fora do sentido da amizade e da solidariedade. Só precisamos mesmo é de umas boas férias –estas, em vez de serem um meio, passaram a ser um fim em si mesmo. As vacances, enquanto direito inalienável, passaram a ser o essencial e o trabalho, mesmo sendo o único meio de rendimento, passou a ser o assessório plasmado numa obrigação que só de pensar nele cansa. O que importa mesmo é beber umas bejecas. Fazer umas caminhadas à noite para emagrecer, e um ou outro concerto do Tony Carreira. Efectivamente, somos uma sociedade facilitista que vive do biscate e do tapar-buracos à medida que vão surgindo.
O novo-riquismo, a exemplo dos políticos de carreira, como nuvem tóxica, invadiu todos. O que importa é mesmo ter dinheiro. Quem o tiver será rei sem coroa mas com vassalagem prestada por todos. Ser rico a qualquer custo passou a ser uma religião sem ter em conta que é preciso trabalhar duro para o conseguir. Mas também não importa nada. Se a coisa correr mal pede-se a insolvência particular e da família. Não há problema. Fica tudo resolvido.
Respondendo ao título, se é preciso trabalhar ou descansar, é óbvio que no meio estará a virtude, mas, pelo andar da carruagem, tudo indica que o trabalhar terá de se estender cada vez mais e ocupar o espaço destinado ao lazer. Seguindo o exemplo dos nossos pais, está de ver, teremos de transpirar cada vez mais para ganhar cada vez menos. É a roda da história a dar a volta, infelizmente.



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