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É dos livros da sociologia, sabe-se que as nações
subdesenvolvidas à medida que vão caminhando para o desenvolvimento pleno,
progressivamente, vão abandonando a terra e tudo o que seja trabalho árduo,
incluindo indústrias pesadas. Tenderão em virar-se para os serviços e para a
terciarização. Aparentemente, como se caminhassem na direcção do pico da eficácia
e da excelência distributiva, exigirão dos governos nacionais cada vez maior
atenção à satisfação do seu bem-estar individual e familiar. Se é certo que
esta reivindicação popular acaba por funcionar para o bem geral, porém, salvo
excepções, este interesse é profundamente egoísta e pouco interessado no
bem-comum. Sempre em crescendo, os cidadãos autóctones, para além de
trabalharem cada vez menos e outorgarem cada vez mais direitos, imporão a sua
força unitária que, ajudados pela comunicação social e pela mimética, se
tornará colectiva enquanto massa abstrata com poder de influência junto do
poder central. Através das reivindicações sociais junto dos eleitos, continuarão a
somar sucessos e verão todos os seus pedidos satisfeitos, alguns até ridículos.
Por sua vez, os executivos, banqueteando-se em opíparos festins, gastando à
tripa forra e legislando em causa própria e satisfazendo o séquito clientelar, acima
de tudo mais interessados em ganhar eleições do que gerir a coisa pública com
eficiência e racionalidade, vão cedendo, cedendo, até um momento em que não será
mais possível continuar. Já só resta o crédito internacional para satisfazer e manter
os vícios acumulados. Significa que, seguindo o passado histórico, se atingiu o
ponto zero e, portanto, estará eminente a bancarrota da classe média, a tal burguesia que sempre esteve à frente das
revoluções. Quer dizer que se atingiu o vértice da pirâmide e a partir daí se
entra no plano descendente. Numa espécie de eterno retorno, onde o
reajustamento surge como uma necessidade absoluta, vão tombando todas as
conquistas sociais até aí conseguidas. Se não acontecer um corte societário
horizontal, um motim, só pararão de cair quando se conseguir um nivelamento
entre a riqueza produzida e os serviços públicos oferecidos à população.
Em retrospectiva, olhando para o
nosso país, foi o que aconteceu mais incisivamente a partir de Abril de 1974
até aos nossos dias. A sociedade portuguesa, produzindo cada vez menos, através
do crédito bancário fácil, transformando-se numa obsessiva máquina de consumo,
passou a querer cada vez mais e mais. Entrámos todos neste túnel sem retorno e
chegámos à realidade. Em choque, verificamos, todos, que foram décadas de
desenvolvimento ilusório e, agora, vamos pagar com juros de língua de palmo. De famílias
maioritariamente tristonhas e miseráveis, sem quase nada, na década de 1970, nestes
quarenta anos passámos a proles felizárias e contentes, a balouçar na
bipolaridade, e que quando a tristeza tocava a alma íamos fazer compras ao shopping para recuperar a auto-estima abalada.
E assim, nesta mania pelo haver e com
muito deve à mistura, passámos a ter
tudo em triplicado: 3 casas que não usávamos plenamente; três automóveis que
não rodavam pela desnecessidade; três frigoríficos que só um se abria
diariamente; três televisões em que apenas a da sala principal funcionava em
pleno; três computadores, dois sem utilização; três transportes públicos
alternativos sem ser transportado por nenhum; três serviços de saúde à escolha
servindo-se do privado; três contas bancárias, em que uma chegava perfeitamente;
e três amantes, em que nenhum deles, nem mesmo o/a legítimo/a, era amado/a como
deveria ser.
Mesmo com o descalabro das contas
públicas, e constantes cortes nos rendimentos privados, continuamos, quase na
generalidade, a privilegiar o ócio em detrimento do trabalho. Largámos os bens
duradouros –aliás, não sabemos o que lhe havemos de fazer. Como símbolos de um
tempo que não volta mais, os frigoríficos e tudo o que for excedente jazem abandonados
lá em casa à espera de um destino o menos destrutivo possível. Naturalmente que
ninguém se interessa por tais velharias que sem idade e uso passaram a ser.
Agora estamos transformados numa sociedade hedonista, asséptica, amoral, que
tem apenas por objecto o prazer pessoal. Basta-nos uma cabana rudimentar e um
amor de ocasião. Os de longa data dão muito trabalho a manter, sobretudo se um
dos conjugues tem uma visão mais pragmática, olha o futuro com preocupação e
não embarca neste usar e deitar fora
do sentido da amizade e da solidariedade. Só precisamos mesmo é de umas boas
férias –estas, em vez de serem um meio,
passaram a ser um fim em si mesmo. As
vacances, enquanto direito
inalienável, passaram a ser o essencial
e o trabalho, mesmo sendo o único meio de rendimento, passou a ser o assessório plasmado numa obrigação que
só de pensar nele cansa. O que importa mesmo é beber umas bejecas. Fazer umas caminhadas à noite para emagrecer, e um ou
outro concerto do Tony Carreira. Efectivamente, somos uma sociedade facilitista
que vive do biscate e do tapar-buracos
à medida que vão surgindo.
O novo-riquismo, a exemplo dos
políticos de carreira, como nuvem tóxica, invadiu todos. O que importa é mesmo
ter dinheiro. Quem o tiver será rei sem coroa mas com vassalagem prestada por
todos. Ser rico a qualquer custo passou a ser uma religião sem ter em conta que
é preciso trabalhar duro para o conseguir. Mas também não importa nada. Se a
coisa correr mal pede-se a insolvência particular e da família. Não há problema.
Fica tudo resolvido.
Respondendo ao título, se é
preciso trabalhar ou descansar, é óbvio que no meio estará a virtude, mas, pelo
andar da carruagem, tudo indica que o trabalhar
terá de se estender cada vez mais e ocupar o espaço destinado ao lazer.
Seguindo o exemplo dos nossos pais, está de ver, teremos de transpirar cada vez mais para ganhar
cada vez menos. É a roda da história a dar a volta, infelizmente.
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