quarta-feira, 3 de agosto de 2016

AFINAL QUEM É QUE CHUTA OS MEIRELES PARA CANTO?






        Hoje, durante a manhã, quando o duo Meireles, pai e filho, actuava na Rua Visconde da Luz um agente da PSP, alegando queixa de comerciantes da principal artéria da Baixa, dirigiu-se ao Fernando Meireles para que este, na companhia do primogénito, se deslocasse para outro local já que, alegadamente, com o som amplificado saído dos instrumentos de corda, estaria a incomodar. “Chamou-nos à parte e disse: você tem de sair daqui porque os comerciantes fazem queixa. O agente até foi simpático. Até disse que gostava de nós, mas que estava a cumprir a sua função.
Para quem não conhecer os Meireles, dois talentos da cultura musical coimbrã, em poucas palavras, resumo apenas que são dois ícones sem reconhecimento público. E o puto é uma revelação. Repetindo o que já escrevi mais vezes, o Fernando Meireles (pai), artesão, investigador, músico de talento indiscutível, membro do grupo “Os Realejo”, e que já tocou com Júlio Pereira, Pedro Caldeira Cabral, Amadeu Magalhães, é um exemplo vivo de que a cidade que o alberga não o merece. Quando o seu “know how”, o seu saber fazer, deveria estar ao serviço da comunidade, na Baixa, num prédio camarário, e a ser aproveitado como professor de construção de instrumentos de artes e ofícios, o que se constata é o oposto, está a trabalhar numa sala esquecida da Associação Académica de Coimbra. Meireles, auto-didacta, instrumentista e estudioso da música tradicional portuguesa, entrega-se à sua arte de corpo e alma e, felizmente, não tem dificuldade em sobreviver, mas é triste verificar que, por falta de visão holística, do todo, os políticos que exercem o poder local percam uma boa oportunidade de serem úteis e neguem o conhecimento aos vindouros. Ninguém entende que estamos perante um talento extraordinário, singular e diferenciado, no modo como fomos habituados a ver muitos músicos saídos dos conservatórios e escolas de música tradicionais.
Salienta-se que já por várias vezes esta acção por parte de agentes da PSP se tem verificado. Também é verdade que, na maioria dos casos, é sempre feita com cordialidade. No entanto, é de ver que o que é de mais aborrece e faz transbordar o copo mesmo do mais paciente.

E A CÂMARA, NÃO DEVERIA MANDAR CUMPRIR?

Há vários anos que a ocupação de espaço público por artistas de rua não é cumprido. Ou seja, quem quer exibir a sua arte fá-lo livremente na via pública. Em princípio este procedimento até estaria correcto se não provocasse injustiças e abusos. Isto é, no tocante à equidade, como a edilidade não aceita inscrições nem passa licença, acontece que qualquer um pode estar sujeito à arbitrariedade de quem manda, como já foi o caso do Luís Cortez, que foi recambiado para a imediação da Loja do Cidadão. No que fere o bom-senso, a raiar o abuso, basta verificar um ajuntamento diário que ocorre habitualmente na Rua da Sofia, em que se juntam no passeio várias pessoas andrajosas acompanhados com cães e a consumirem vinho. Os queixumes dos comerciantes locais são vários mas, como é preciso dar a cara e a coragem é coisa rara nos tempos que correm, até agora o acantonamento vai continuando e à espera que sejam terceiros a resolver a situação.

E COMO DEVERIA SER?

Já se sabe que a liberdade mal usada conduz ao libertarismo -a maximização da liberdade de escolha, que por sua vez conduz ao caos e ao anarquismo, enquanto filosofia. E quando acontece passar-se os limites da decência, num egoísmo individual sem precedentes, o instrumento necessário para lhe pôr cobro é a lei. O problema é que nestas alturas não se procura somente ratificar e disciplinar o costume mas, pelo contrário, vai-se do oito aos oitenta. Por parte do legislador, há sempre um aproveitamento económico da questão em análise. Quero dizer que, sobre este quadro dos músicos de rua, se até agora a exibição dos artista é gratuita no caso de haver uma postura municipal, mais que certo, os preços pedidos pelo licenciamento da actividade serão incomportáveis para quem o solicitar. A meu ver, regulamentar para disciplinar, o que deveria ser obrigatório era a inscrição prévia na autarquia, com dados identificativos -e a entrega do requerimento já obriga a um custo de 10 euros. No caso de ser permanente -ainda que a prestação seja ambulante-, poderia ser licenciado com um custo mensal mínimo. É bom não esquecer que quem recorre à rua para apresentar a sua perfomance, na maioria, por um lado, fá-lo porque não terá outro palco nem outro meio de subsistir, por outro, o que dá à comunidade é muito mais do que recebe -é aqui, neste equilíbrio precário que o poder decisório municipal, sendo justo, tem de pesar os prós e contras.

MAS VOLTANDO AOS MEIRELES...

Ora, se o argumento empregue pelos agentes da PSP é que os comerciantes da Rua Visconde da Luz se queixam a esta polícia, interessa saber o que pensa a maioria dos profissionais do comércio e, sobretudo se possível, tentar saber quem é contra a permanência do músico. Por isso mesmo, fui ouvir alguns deles.
Carlos Barros, do “Caco – o Original”, à pergunta o que pensava sobre a prestação dos Meireles, disse o seguinte: “é muito agradável. É muito bom para a rua. Há clientes que aproveitam para se sentarem na esplanada a ouvir a sua musica. E também para nós, que estamos a trabalhar. Animam o dia e tornam-no menos enfadonho. É um absurdo pensar que alguém está contra uma prestação desta qualidade, e gratuita ainda por cima?! Querem o quê? Uma cidade inodora? Sem cheiros, sem ruídos, sem movimento?

Jaime Fernandes, da Óptica Fernandes, explanou assim: “a prestação musical desta família, pai e filho, é uma acção que enaltece a rua. Eu gosto!

Rosinda Henriques, de A Casa dos Enxovais, manifestou assim a sua declaração de vontade: “gosto de os ouvir. Às vezes têm a amplificação muito alta. Se o som estivesse mais moderado era ouro sobre azul. É bom para a rua. É interessante para o turismo. Todos devemos ter alguma compreensão e paciência. É muito bom para a Baixa.

Francisco Braga, da casa Bragas, L,da, enfatizou assim: “ouve-se bem, sem enfado. É bom para a rua porque dá animação e torna a via pública diferente, quebrando a rotina. Há outros aí bem piores, e, pelo princípio da tolerância, temos de ter alguma paciência! Nesta altura do turismo faz todo o sentido. Alegra o nosso meio envolvente. É importante.

Nádia Baptista, da loja Calcedónia, à pergunta formulada se o barulho incomodava, respondeu assim: “não incomoda nada (o miúdo toca tão bem, coitadinho!). É muito bom para a rua. As pessoas param para os ver actuar. Vê-se sempre muita gente à sua volta. Ajuda a dinamizar a Baixa -já que ninguém faz nada! Acho que faz todo o sentido. Prefiro ouvir este duo que outros que por aí passam, cujo ruído, por vezes, é infernal.

Margarida Santos, da Casa Baltazar, mostrou assim a sua opinião: “acho bem este grupo fazer parte da nossa rotina diária. Não faz mal nenhum, antes pelo contrário. Os turistas adoram. Animam a rua. É um contra-senso não gostar destes músicos de excelência.

Paula Costa, da casa Brancal, à pergunta se conhecia algum colega que estivesse contra a manifestação cultural, disse o que pensava: “ É bom para a rua. Anima e altera uma quietude que, por vezes, se torna triste e monótona. È muito agradável. Tocam muito bem. Gosto muito de os ouvir. Nunca ouvi dizer nada contra. Por outro lado, parece-me inconcebível haver alguém que não goste de um espectáculo assim. É uma pena! Bem sei que, apesar de todos precisarem de ganhar a vida, há por aqui alguns músicos que exageram, mas estes não.

Ana Filipa, da loja Namib, extrapolou assim o seu pensamento sobre este assunto: “animam a rua. Não costumam estar muito tempo. Estão uma horita, pouco mais, e vão-se embora. É bom para os passantes. Quando vamos para o estrangeiro, por lá, também gostamos de ver. Há por aqui outros bem piores, que, para além de não terem qualidade, fazem bem mais barulho.

Liliana e Clarinda, funcionárias da MultiÓpticas, a uma só voz, falaram assim: “é óptimo podermos contar com a sua sonoridade para animar a nossa zona envolvente. Dinamizam a rua. É diferente, para melhor. Quebram o tédio. Para nós, que estamos a trabalhar, é muito agradável. Para o turismo, que nos visita, é fantástico. As pessoas param e ficam ali especadas a ver. É certo que alguns, pelo som por vezes estridente e monocórdico, incomodam, mas estes não.

Ricardo Veiga, da Casa dos Linhos, disse o seguinte: “É agradável ouvir estes músicos. Desenvolvem e animam a rua. Há outros -esses sim- que incomodam mesmo. Estes não perturbam!

Em resumo final, em apelo dirigido ao comandante da 2ª esquadra da PSP, talvez fosse bom que os agentes policiais, sempre que se dirigirem ao Fernando Meireles para circular e invocando o nome de comerciantes para justificar o seu mandado, dessem o nome dos descontentes. Sem duvidar da alegação, pelo princípio da transparência dos actos administrativos, seria bom que, futuramente, assim acontecesse.

1 comentário:

Super-febras disse...

Amigo:

Quando um agente nao tem capacidade de actuar consuante a sua intectualilade e humanismo
e age cegamente a ordens vocifradas, estamos perante a prova que estas forças servem os magnos e suas corporaçoes.
Apesar de em maioria ser o Zezinho a pagar a factura dos seus ordenados e subidas imeritas de suas carreiras
baseadas, (haja padrinhos, cunhas ou patuscadas) quaze ordinariamente nos anos de servico e nao na distincao
do saber e, ou, predicado laboral, e' mais que evidente que brutalmente exercerao, accoes contra nos e em defesa
dos que estao no poleiro e que de maneira alguma querem o putrificado e viciado galinheiro vasculhado.
Conheco o duo artistico de que nos fala nao pessoalmente mas ha' muitos anos que vao passando, gracas a sua
aptidao artesanal e dom artistico, pelos ecrans tanto das nossas televisoes como os dos nossos monitores de computador.
Certamente a primeira vez que os vi foi, varios anos atraz, num grande documentario de varios episodios, apresentado
pela Globo TV Internacional e que estudava a historia do nosso cavaquinho, aqui ukalele, e seu desenvolvimento como instrumento e
envolvimento na musica de varios povos mundo fora. Ai' conheci o pequerucho. Ainda ao colo do pai, fiquei a saber que ja
estudava violino.
Saiba caro amigo, nao e'O Sr. Meireles que me peocupa pois tal como um bom lavrador sabe quando mete os bois ao carro qual e'
a besta que mais depressa se espanta, tambem ele se sabera' defender das investidas dessas feras e pelo que conheco dele
tem calibre de quem pega a rez pelos cornos. Mas o menino, que pensa ele, de nos adultos 'a sua volta? E das forcas policiais?
E do mundo que o rodeia? Digamos que esse mundo nao sera muito maior que a cidade de Coimbra e que nas suas viagens a
outros lugares nunca tera presenciado e sentido a brutalidade com que a rejeicao a uma face tao especial da sua vida lhe
esmurra a alma e a afinidade musical que dentro dela vive.
Nao seria nosso dever, dever de todo o Coninbricence, ate' causa politica defender esta crianca, esta mais valia a Coimbra?
Nao e' ele embaixador sem salario, de Coimbra e Coimbroes, no pais e estando eu aqui a seis mil kilometros a escrever sobre ele, no mundo?

Ou sera'grande a perturbacao aos assalariados?

Um grande abraco
Alvaro Jose da Silva Pratas Leitão

P.S. Desculpe ter sido escrito com teclado para Ingles.