Tétisq deixou um
novo comentário na sua mensagem "EDITORIAL:VARRER OS TOXICODEPENDENTES PARA DEBAIXO...":
São questões interessantes e pertinentes, mas não comungo daquilo que me parece uma excessiva desculpabilização desses indivíduos, 'doentes sociais'. Se cometem crimes devem ser punidos, se uns consomem outros traficam pelo que será importante terminar com esse tipo de negócio para fazer dispersar essa comunidade.
No final dos anos 80 a minha vila ocupava o lugar de maior centro de consumo e tráfico de droga da zona Norte. Desde os 6 anos que convivo com a imagem de indivíduos a injectarem-se, as seringas abandonadas eram frequentes no caminho da escola e sendo que nessa altura havia um 'entendimento' da comunidade toxicodependente de que era importante viciar os mais novos, foi nessa altura que comecei a recusar os 'doces' que me tentavam impingir no portão da escola.
Cresci a ter medo de circular nas ruas da minha vila, e nas ruas do Porto, e quando vim para Coimbra fiquei feliz porque me sentia segura e podia gabar-me aos amigos de que em na cidade dos estudantes andava na rua sozinha a qualquer hora, mesmo que fosse noite. Mas, agora. até de dia sinto medo e nojo quando ando nas ruas da Baixa.
Tenho medo porque já assisti a discussões entre indivíduos desse grupo onde empunhavam facas, que não me ameaçando directamente me podiam prejudicar.
Tenho medo e nojo
porque os animais, principalmente cães, que estes indivíduos trazem
com eles parecem uma ameaça à saúde publica. E, no fundo, tenho
medo porque me cruzo mais vezes com eles enquanto praticam ilícitos
do que com patrulhamento policial.
Tirando o policia que fica em frente ao Banco de Portugal como se fosse um meco, já que não pode sair de lá, raramente vejo policia nas ruas da Baixa.
Tirando o policia que fica em frente ao Banco de Portugal como se fosse um meco, já que não pode sair de lá, raramente vejo policia nas ruas da Baixa.
Acho que as várias
entidades, Câmara Municipal, Cáritas, associação comercial e
autoridades deviam chegar a um acordo para que o patrulhamento
aumente e todos se sintam mais seguros. Os turistas que já vi muitas
vezes desistir de entrar nos becos da Baixa por medo e que deixaram
certamente de consumir nas lojas aí situadas, os cidadãos que
assistem às cenas que descrevi, e os trabalhadores que têm nessa
zona o seu local de trabalho, desde “call center NOS, Pingo Doce,
Continente e diversas estruturas cujos trabalhadores maioritariamente
jovens, começam a ter medo de estacionar ou simplesmente apanhar um
autocarro ali perto.
Nem na minha vila nem nas zonas mais problemáticas do Porto situações semelhantes a esta se resolveram sem o aumento do policiamento. É imperativo eliminar o tráfico para evitar outros pequenos delitos que por ali se repetem e perpetuam.
Nem na minha vila nem nas zonas mais problemáticas do Porto situações semelhantes a esta se resolveram sem o aumento do policiamento. É imperativo eliminar o tráfico para evitar outros pequenos delitos que por ali se repetem e perpetuam.
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RESPOSTA
DO EDITOR
Muito
obrigada, Té Tisq, por ter respondido ao meu repto de uma forma tão
clara.
Começo por fazer uma
ressalva em jeito de introdução. Pode até parecer que sou um
defensor acérrimo da liberalização de drogas e de salas de chuto
medicamente assistidas. Puro engano. Defendo estes instrumentos,
legalizados por lei da Assembleia da República, como último
recurso, que pode ser experimental, numa batalha (contra a droga)
declaradamente perdida por todos, pela sociedade, pelas polícias,
pelos governos, que fazem o que podem para manter a situação sob
controle, mas que já deu para ver que com o actual “status
quo”, situacionismo, não se sai do mesmo lugar, se é que não
estamos a piorar. Continuamos a assistir, impávidos e serenos, à
destruição de famílias, com mortes associadas -eu já passei e
continuo a passar por essa experiência. Tenho vários familiares com
este problema. Já vi desaparecer jovens na primavera da vida que gostava
muito.
O que se passa é que,
colectivamente, fizemos do consumo e tráfico de droga um anátema,
uma execração, uma maldição contrária ao modus vivendi
societário, na forma
como entendemos a perfeição na convivência humana, e, fugindo, não
procuramos enfrentar o cancro. Sobretudo o consumo de droga é um
comportamento que, quer pelos envolvidos directamente, os viciados,
quer pela família, uns e outros tentam esconder. Sem enfrentar a
consequência de frente. Pela segunda, a família, há um retrato
comum: os pais, em face da adversidade não se unem em bloco,
dividem-se, e um deles passa a considerar o filho como doente,
“coitadinho do menino”, alega-se em repetido, e a
manipulação passa a ser uma constante. Esta super-protecção de
uma das partes leva à desvalorização da autoridade paternal do
outro. Por seu lado, o protegido cada vez se sente mais forte e vai
manipulando cada um dos entes a seu bel-prazer e tendo sempre em
conta a sua conveniência egoísta e mesquinha. O resultado desta
divisão é o esboroar das relações familiares e o desmantelamento
da família. É um erro assacar culpas na educação.
O que deveria acontecer
(e na maioria não acontece) deveria ser a família unir-se em bloco
e impor regras que passam pelo tratamento compulsivo do afectado. Sem
cedências, o ultimato deve ser uma escolha: ou te tratas ou vais à
tua vida, mas sozinho. É fácil lidar com esta constatação? Claro
que não -só quem passa por isso sabe do que escrevo. Logo aquando
da descoberta de consumo os pais deveriam assumir friamente que é
uma luta de vida ou de morte. A perda do ente querido é uma
inevitabilidade. Se nada se fizer e se manter a situação, o mais
certo, mais tarde ou mais cedo, é, no caso das leves, ele acabar com
os neurónios queimados, ou estendido com uma overdose, no
caso das drogas pesadas. Se a pé juntos se optar pelo tratamento e
o viciado não aceitar, o melhor, antes que destrua tudo em redor, é
obrigá-lo a ir -repito, é muito difícil, mais fácil é escrever,
mas é a única possibilidade dos primogénitos se manterem juntos.
O
consumo de droga é uma institucionalizada condenação
à morte. Quando não percorremos os carreiros desse mundo terrível,
a forma como lidamos com o assunto, alheando-se da solução, na
generalidade, entendemos que não é um problema nosso. Pensamos que
só acontece aos outros. Com o espectáculo público de injecções
na veia acontece a mesma coisa: só nos tira o sono quando
verificamos que está junto à nossa porta. Então, quando assim é,
gritamos, estrebuchamos que nem peixe fora de água.
MAS
PORQUE É QUE TUDO CONTINUA IGUAL?
É
uma pergunta sem resposta objectiva. No entanto, tenho para mim que
tudo continua na mesma e igual à lesma porque, por um lado, como
disse em cima, as famílias preferem enterrar a cabeça na areia, não
dando a cara, ao invés de se procurarem soluções, exigindo dos
governos nacionais um novo testar do problema do consumo e tráfico
de droga, por outro, há demasiados interesses envolvidos nesta
questão. Sem ofensa para ninguém em especial, desde as instituições
ligadas à prevenção e combate à droga, passando pelo lobi
farmacêutico, até aos cartéis, que envolvem governos
internacionais e personalidades ditas intocáveis, ninguém está
interessado em alterar o actual panorama.
MAS,
VAMOS AO COMENTÁRIO OU NÃO?
E
finalmente vamos às suas questões.
“São
questões interessantes e pertinentes, mas não comungo daquilo que
me parece uma excessiva desculpabilização desses indivíduos,
'doentes sociais'. Se cometem crimes devem ser punidos, se uns
consomem outros traficam pelo que será importante terminar com esse
tipo de negócio para fazer dispersar essa comunidade.”
A desculpabilização
de que você alude, a meu ver, surge a jusante como um benefício em
resultado da incapacidade (de todos) de não se ter actuado
preventivamente a montante. Isto é, logo na detecção do problema
dever-se-ia actuar em conformidade, com mão forte e o Estado chamar
a si a terapêutica, o tratamento de doentes. Como se prefere actuar
depois do mal-feito, de certo modo, é como se, pacificamente,
aceitasse a tese de Rosseau, século XVIII, de que todos nascemos puros e bons e é a
sociedade que nos conspurca, tornando-nos selvagens.
Se atentarmos, a justiça
é o braço pretensamente justo que pune os ilícitos em nome da
sociedade. E será tão justa tanto quanto, pela sentença ou
acórdão, consiga, ao mesmo tempo e num equilíbrio precário,
satisfazer os vitimizados e os agressores. A tal paz social, de que
se fala, assenta e é conseguida mais nesta premissa de ressarcimento
individual do que pela restrição de liberdade ou custo monetário.
No
caso a que alude, na punição de tráfico e consequência do
consumo, como vemos, está logo viciado à partida e a justiça, por
ser parte da parte (Estado), utiliza um paternalismo (talvez)
exacerbado na análise e conclusão do processo.
Poderia ser diferente?
Penso que sim se a responsabilização começasse logo na
educação/formação e não apenas na idade da alegada tomada de
consciência dos actos, seguindo o Direito Romano, de há mais de
dois mil anos, como se uma pessoa de 14/16 anos tivesse hoje a mesma
mentalidade de há milhares de anos e não percepcionasse a
consequência de modo diferente, límpido e calculista.
“Cresci
a ter medo de circular nas ruas da minha vila, e nas ruas do Porto, e
quando vim para Coimbra fiquei feliz porque me sentia segura e podia
gabar-me aos amigos de que em na cidade dos estudantes andava na rua
sozinha a qualquer hora, mesmo que fosse noite. Mas, agora. até de
dia sinto medo e nojo quando ando nas ruas da Baixa.”
Com todo o
respeito pela sua opinião, retirando o pequeno furto, aqui e ali com
assaltos à propriedade, e escaramuças próprias de uma cidade
média, Coimbra, e sobretudo a Baixa, que é a zona de que falamos, é
garantidamente segura. Para fundamentar a minha afirmação, trabalho
e resido na Baixa. Mais, por vezes, percorro estas ruas noite dentro
e nunca tive qualquer problema. Acredito que, pela desertificação a
que a área está votada, sobretudo durante a noite, o medo é mais
formal, psicológico, que efectivo, material.
“Tenho
medo porque já assisti a discussões entre indivíduos desse grupo
onde empunhavam facas que não me ameaçando directamente me podiam
prejudicar.
Tenho medo e nojo
porque os animais, principalmente cães, que estes indivíduos trazem
com eles parecem uma ameaça à saúde publica. E, no fundo, tenho
medo porque me cruzo mais vezes com eles enquanto praticam ilícitos
do que com patrulhamento policial.
Tirando o policia que fica em frente ao Banco de Portugal como se fosse um meco, já que não pode sair de lá, raramente vejo policia nas ruas da Baixa.”
Tirando o policia que fica em frente ao Banco de Portugal como se fosse um meco, já que não pode sair de lá, raramente vejo policia nas ruas da Baixa.”
Tanto
quanto julgo saber, o grupo a que se refere costuma estar
“estacionado” ora na Rua da Sofia ora nas artérias
largas. Não quero entrar em desculpabilização gratuita mas, no
caso, creio, será mais de “vadios sem eira nem beira”
onde o álcool jorra de garrafa para garganta do que propriamente os
“drogados” com substâncias opiáceas de que falamos. Se por um
lado concordo que a sua exposição pública não é muito
gratificante para a Baixa, por outro, sejamos justos, as polícias
pouco podem fazer -pelo direito constitucional de liberdade de
circulação.
“Acho
que as várias entidades, Câmara Municipal, Cáritas, associação
comercial e autoridades deviam chegar a um acordo para que o
patrulhamento aumente e todos se sintam mais seguros. Os turistas que
já vi muitas vezes desistir de entrar nos becos da Baixa por medo e
que deixaram certamente de consumir nas lojas aí situadas, os
cidadãos que assistem às cenas que descrevi, e os trabalhadores que
têm nessa zona o seu local de trabalho, desde “call center NOS,
Pingo Doce, Continente e diversas estruturas cujos trabalhadores
maioritariamente jovens, começam a ter medo de estacionar ou
simplesmente apanhar um autocarro ali perto.”
Concordo
plenamente consigo. Apesar de não considerar a insegurança
preocupante na Baixa, defendo que o policiamento a pé, durante a
noite e não só à luz do dia, deveria ser uma obrigação da PSP.
“Nem
na minha vila nem nas zonas mais problemáticas do Porto situações
semelhantes a esta se resolveram sem o aumento do policiamento. É
imperativo eliminar o tráfico para evitar outros pequenos delitos
que por ali se repetem e perpetuam.”
Mais uma
vez concordo consigo. Por isso mesmo continuo a dissertar sobre este
assunto e até, quase a parecer provocação, me dou ao trabalho de
escrever este lençol.
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