(Imagem do jornal Público)
Começo por dizer que já sou velho. Não aquele
velhinho ancião de bengala na mão direita, curvado e psicologicamente vencido
pela idade, mas um desgastado que, apesar da meia-idade, se tornou precocemente
envelhecido. Nasci em 1956, ano em que Zacarias Oliveira publicou a “Teoria do Jornalismo”, aqui, e que analisa
a imprensa católica. “Refere o autor que,
para ele, assim como para a maior parte das pessoas, “os jornais têm grande
importância, uma vez que os jornais entraram no lugar comum da existência.
Influenciam, esclarecem, orientam, determinam. Numa caracterização do
jornalista o autor afirma que este é “um ser de excepção”, porque “é um homem
marcado pela inquietação da verdade, pela beleza que ele não descobre” e porque
“é um especialista da verdade e do bom senso”. Alguns fins da imprensa são,
segundo o livro, “calar a nossa curiosidade”, “vencer distâncias e aproximar os
homens”.
Socorri-me
deste apontamento para tentar perceber como é que neste ano de 2015, em que
parece que estamos em democracia e a imprensa é, de facto, um sustentáculo do
regime, um tribunal, no caso o Tribunal da Comarca de Lisboa, ainda que em
Providência Cautelar, pode suspender e proibir um grupo de informação, com televisão, jornais e revistas, de publicar notícias sobre determinado processo -mesmo até que esteja em causa o segredo de justiça.
Como se vê, o grupo é a Cofina, do jornal “Correio
da Manhã”, e o processo é a “Operação Marquês” e visando directamente o arguido José Sócrates.
Precisamente pelo antecedente extraído
do Estado Novo (1933-1974), em que a toda a imprensa era visada pela “Comissão
de Censura”, foi plasmado na Constituição da República Portuguesa, no artigo 38,
a “Liberdade de Imprensa e meios de
Comunicação Social”. Nesta cláusula, no ponto 1, é imperativo: “É garantida a Liberdade de Imprensa”. No
ponto 2 está doutrinado: “A liberdade de
imprensa implica: a) A liberdade de expressão e criação dos jornalistas e
colaboradores, bem como a intervenção dos primeiros na orientação editorial dos
respectivos órgãos de comunicação social, salvo quando tiverem natureza
doutrinária ou confessional;”
Antes de avançar, para tentar
compreender a motivação do juiz na suspensão de uma prerrogativa constitucional,
só poderemos entender que a defesa de Sócrates conseguiu provar ao tribunal que
o grupo Cofina se orienta por princípios de “natureza doutrinária ou confessional” – e aqui, na minha natural
ignorância funcional, gostava de saber o que significa a “natureza doutrinal ou confessional”. Por doutrinal, segundo o
dicionário Priberam: Doutrinal; do doutrinarismo; Pessoa que participa na elaboração de uma doutrina;
Conjunto de teorias ou ideias”. Por confessional: “Relativo ou semelhante a confissão (ex.: tom confessional).
Relativo a uma crença religiosa”. Isto é, se eu já era ignorante ainda fiquei mais. Acontece
que eu sou inculto demais mas não sou parvo de todo e consigo entender que,
numa forma pouco clara, o legislador com este emaranhado queria dizer simplesmente
que sempre que estiver em causa a doutrina (ideologia) fascista ou confissões (religiosas)
que visem a violência a interdição está justificada –e diz isto mesmo no número
4 do artigo 46º, relativo a Liberdade de Associação: “ Não são consentidas associações armadas nem de tipo militar,
militarizadas ou paramilitares, nem organizações racistas ou que perfilhem a
ideologia fascista.”
Ou seja,
especulando e em silogismo, devemos entender que, na óptica do tribunal, o grupo de media defende a ideologia fascista –já que
a contrária, esquerda radical, não é contemplada na magna carta- e porque
certamente não sustentarão uma qualquer seita religiosa. Como não sabemos mais
nada, ficamos por aqui.
É evidente que a minha alma está parva. Só me
falta mesmo ver um porco a andar de bicicleta. Mas deve faltar pouco. E ainda
fica mais quando depois de ter visto na televisão, no último fim-de semana, o
ex-primeiro-ministro socialista –arguido, suspeito, mas também inocente até ao
transitado em julgado- numa conferência em Vila Velha de Ródão sobre política e
justiça ser aplaudido de pé.
Como velhote, é como se tudo em que
acreditava, aos poucos, se esteja a desmoronar. Já não vejo os defensores deste regime denunciarem atentados à democracia. Ou o pugnar pela liberdade depende da cara de quem está em causa? Se calhar! Verdadeiramente, este não é
mesmo o meu tempo. Estou ultrapassado. Sou anacrónico, pronto! Ou melhor, ponto
e parágrafo.
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