Utilizando como meio de transporte um
autocarro, neste fim-de-semana desloquei-me a uma cidade do interior do País, que
dista cerca de 150 quilómetros de Coimbra. Embora navegue pouco, sempre que
faço uma jornada mais ou menos longa gosto de levar comigo um livro ou um
jornal para ler. Bem sei que, com este gosto, sou antiquado. Eu deveria ser um
tipo moderno e levar comigo um “Tablet”,
ou, sei lá, um “Smartphone”. Mas qual
quê? Sou um irascível resistente a estes meios de comunicação. Para além de
serem viciantes, considero-os totalmente invasores da minha privacidade, e continuo
com o meu velho telemóvel Nokia que volta e meia e quem sabe para me aborrecer falha-me a rede mas nem assim me descolo dele.
Então no Sábado, quase ao pôr-do-Sol, como
habitualmente em cima da hora, coloquei os pés na direcção da Rodoviária
Nacional, na Avenida Fernão de Magalhães, em Coimbra. A meio do caminho, entre
a minha casa e o centro rodoviário, dei pela falta do livro que deveria ser meu
companheiro de viagem. Porém, como estava literalmente em cima da partida, já
não pude voltar atrás. Dei por mim a pensar que não haveria problema já que,
recordei, existia um quiosque de jornais no terminal das camionetas. No "guichet" adquiri o bilhete –por acaso a uma funcionária simpatiquíssima. Que bom é
encontrar pessoas assim! Foi então que me apercebi que a venda de jornais e
revistas estava encerrada para férias. Por segundos, senti que me faltava o
chão e, como caminheiro perdido num deserto, comecei a olhar para todo o lado, para
ver se, no limite, vislumbrava uma ponte, uma solução, para a carência do meu
problema. Mas nada. Ali à volta não havia qualquer negócio de jornais ou
revistas. Para tentar saciar a minha ansiedade, imaginei que dentro do
autocarro haveria alguém que transportasse consigo um jornal e, depois de o
tresler, mo cederia. E entrei no meio de transporte que três horas depois me
deixaria na cidade do interior –a propósito saliento a frota de veículos de
elevada qualidade que fazem este trajecto regular.
Às 18h30, conforme a hora indicada, o
mastodonte motorizado, de cor azul e praticamente cheio, fez-se à estrada.
Começando pelos fundos, iniciei então a minha busca com o olhar para encontrar
um passageiro que levasse consigo leitura em papel. Ocupados entre o seu
pequeno computador aberto, o Tablet e o Smartphone, verifiquei in loco, nem um único lia um livro, uma
revista, ou um simples jornal de papel. Perante aquele cenário inimaginável,
rendi-me à evidência: teria de escolher entre dormir, pensar na minha cada vez
maior diferença entre estes tempos que teimo em não me englobar, ou apreciar a
paisagem. Como não dormi, entretive-me a pensar e a ver. Perante os meus olhos,
num contraste absoluto entre o progresso e o retrocesso, surgiam estradas novas
como nunca vi e um incontável universo de pequenos negócios encerrados. É um
apocalipse. Desde mercearias, a instalações de pneus, a fábricas de alumínios,
até pequenas oficinas de mecânica, é um doer de alma assistir a este extermínio
colectivo de criação de emprego nas localidades. No panorama, são esqueletos
vivos, perdidos, marcas de uma memória comercial e industrial que se finou. E lá
cheguei ao meu destino.
Regressei no Domingo à noite. Claro que, inevitavelmente,
acompanhado de um livro que tomei de empréstimo ao meu amigo: “O Segredo”. Embora visse o filme, não tinha
lido a história escrita.
Por volta das 21h30, na viagem de
regresso, eu era comparte de um grupo de cerca de uma dúzia de passageiros com
destino à cidade dos estudantes. Sem surpresa, verifiquei que, mais uma vez,
quase todos estariam ligados à Internet e nenhum deles se ocupava a ler.
O autocarro arrancou e as luzes
ficaram num lusco-fusco. Como cego a apalpar uma parede, comecei a carregar em
todos botões por cima da minha cabeça mas nenhum parecia dar-me importância e a
luz necessária para eu poder ler. Numa ambiguidade, entre o aperto premente e
ao mesmo tempo sabendo que era só para mim, hesitei em levantar-me e indagar o
motorista acerca da falta de luminosidade. Vou, não vou? E fui! Fez-se luz no “machimbombo” e eu passei o percurso
quase sem sentir a diferença da distância.
Como questão final, deixo uma pergunta um
bocado estúpida: e se os autocarros levassem consigo uns jornais do dia e umas
revistas? Mesmo que aumentasse uns cêntimos nos bilhetes, será que não se estaria
a contribuir para que a leitura em papel não se perdesse na vacuidade? No fundo
estariam a dar continuação ao princípio do livro “O Segredo”, que é, como se sabe, a universal lei da atracção: boas iniciativas trazem bons resultados.
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