(Imagem de Leonardo Braga Pinheiro)
António
Horta Pinto deixou um novo comentário na sua mensagem "UMA
CARTA PARA OS JUSTOS REFLETIREM":
O idoso pagava uma renda de 69 euros e o senhorio exigia-lhe 600 quando a pensão dele era apenas de 390.
Quem tem pensões milionárias vive normalmente em casa própria.
Quanto à pessoa que refere, muita sorte tem ela por ter herdado um prédio; poucos têm esse privilégio.
Os senhorios não são todos maus nem muito menos fascistas, nem os inquilinos são todos bonzinhos ou coitadinhos. Mas é absolutamente desumano, seja em que circunstâncias for, pôr na rua um velho de 80 anos, exigindo-lhe uma renda superior ao montante da sua pensão.
Unknown
deixou
um novo comentário na sua mensagem "UMA
CARTA PARA OS JUSTOS REFLETIREM":
O sr. António Horta tem toda a razão quando diz «Os senhorios não são todos maus nem muito menos fascistas, nem os inquilinos são todos bonzinhos ou coitadinhos.». Quando dei a minha opinião não foi acerca do inquilino idoso referido na noticia, a leitura da noticia é que teve como consequência aquele pensamento em relação a este tema em geral, em abstrato e não no caso em concreto.
Mas desde já lhe digo que tenho quase a certeza que não é proprietário, nem recebe um arrendamento de 69 euros! Esta quantia quase não dá para pagar as despesas de electricidade e água, quanto mais de uma renda!
Quanto à sua afirmação que se é um privilegiado em receber uma herança destas... que sorte! Um comerciante falido receber em mãos uma carga de trabalhos destas...
Abraço, Marco Pinto
RESPOSTA
DO EDITOR
Antes
de entrar no caso aflorado, começo com uma ressalva: vou exercer o
contraditório a favor do que considero injusto. Isto é, vou
argumentar no sentido de dar uma opinião sobre um texto apresentado
por Marco Pinto. Ao fazê-lo, procurarei ser justo, não por estes
ganharem o reino dos céus, mas porque qualquer cidadão comum, como
eu, independentemente de ser de direita, centro, ou de esquerda, ou
de ter frequentado qualquer faculdade de direito -mesmo tendo ou não
concluído o curso-, facilmente consegue destrinçar o correcto do
indigno. O princípio da Justitia
nasce no interior, na
alma de cada um de nós e, como água límpida e pura saída de
nascente, brota o seu espírito de equidade de dentro para fora no
indivíduo. Ou seja, a justiça é um sentimento individual imanente
que radica na intuição e na convicção de que, em sentido
restrito, cumpre a
lei. Por sua vez, em
complemento de universalidade, em sentido lato, que realiza a
igualdade entre os homens, é um direito natural que fundamenta a sua
aplicação no bom-senso, na equidade e no pragmatismo, na prática
do dia-a-dia. O seu propósito é avalizar a razão e encaminhar o
humano para o bem -o direito positivado (escrito) apenas o corrobora
e afirma. Por sua vez o direito escrito assenta em três preceitos:
“Viver
honestamente, não ofender ninguém, dar a cada um o que lhe
pertence”
(Ulpianus,
jurisconsulto romano, 150-223, depois de Cristo)
E
então, agora, vamos ao caso concreto, em que foi noticiado pelo
Correio da Manhã (CM) o acontecimento de um idoso que, recebendo de
reforma 390 euros e pagando de renda 69 euros -valor alegado por
António Horta Pinto-, foi despejado pelo tribunal depois do seu
senhorio ter reivindicado 600 euros.
Para
melhor compreender, pegando nas partes em conflito, proprietário e
inquilino, incidindo em cada um deles, vamos aplicar os três
preceitos do direito na ocorrência publicitada pelo CM.
Comecemos
pelo inquilino:
Vive
honestamente?
Partimos
do pressuposto de que sim.
O
sucedido ofende
alguém?
Sim,
ofende a chamada moral social -mas nem sempre a moral caminha ao lado da lei. Em justificação, é inconcebível
que um cidadão aufira uma reforma tão baixa, de 390 euros. Se há
ofensa, naturalmente, há agressor. Quem é? Antes de apontar um
culpado, temos de dizer que o organizativo de pensões assenta num sistema
de descontos cumulativo. Porém, a aposentação só foi levada a
sério a partir de 1970 -por Marcelo Caetano-, mas apenas para
algumas profissões. Embora já antes os descontos para a antiga
Caixa de Previdência e Abono de Família fossem obrigatórios em
algumas classes nem sempre eram executados. Só passou a ser geral e
com direito a reforma para todas as classes trabalhadoras em
1976 com a promulgação da Constituição da Republica Portuguesa, e
com a implementação, ainda que ténue, do Estado Social de
Bem-estar. Portanto, sendo justos, apesar de haver actualmente um
Complemento de Reforma para Idoso, os cidadãos de
vetusta idade continuam a ser prejudicados em comparação com os
mais novos.
Mas
não é caso único! Há milhares de portugueses no mesmo escalão.
Só para melhor exemplificar, e apenas por isso, o redactor, agora
com 61 anos, trabalha desde os 10 anos, por conseguinte há 51 anos,
e tem 48 anos de descontos efectivos para a Segurança Social. Pediu
agora a reforma. Quanto vai receber? A verba de 441 euros.
A
este idoso noticiado no CM, está
a ser-lhe dado o que lhe pertence?
Perante
a lei, no sistema de proteção que vigora, imagino, está a ser-lhe
atribuído o que tem direito. No entanto, pela prerrogativa de ter
começado a descontar tarde, não tenho dúvida de que está a ser
prejudicado. Sabendo nós que entre tantos milhões desbaratados para
apoiar a banca e outros sectores que deveriam responder por si, o
Estado, criando leis que lhe dão jeito e sempre visando resultados
eleitorais, continua a ser uma entidade abstracta de pouca
credibilidade e pouco preocupada com os mínimos de bem-estar para os
cidadãos mais carenciados.
Claro
que, embora não escrito, há um princípio de defesa na velhice que
deve acompanhar todos enquanto são novos: trabalhar
esforçadamente e poupando o máximo para prevenir um eventual fim de
vida não acompanhado pela Segurança Social.
E,
utilizando o mesmo método de análise, passemos para o senhorio:
Vive
honestamente?
Partimos
do pressuposto que sim.
O
sucedido, ou seja, ter pedido um aumento de renda de 600 euros,
ofende
alguém?
Enquanto
proprietário de um imóvel, a lei confere-lhe o direito de,
independentemente dos rendimentos do inquilino, pedir uma
actualização com base no valor fiscal do edifício. O aumento foi
legal? Foi especulativo? Como não possuímos dados, não sabemos.
Cabe ao inquilino contrapor o valor através das instâncias
judiciais. Se o processo não foi acompanhado de perto por desleixo
do arrendatário -que, como se sabe o desconhecimento da lei não
escusa- e inoperância da Segurança Social e prescreveu o direito de
contestação, a culpa não pode ser nunca atribuída ao senhorio.
Portanto, à luz da lei, que é o que interessa aqui, a
ofensa é considerada improcedente.
Acrescenta-se
ainda que, por obrigação do princípio Social de Bem-estar mínimo,
cabe ao Estado, através da boa distribuição e justa aplicação
dos impostos, assegurar o constitucional direito a uma habitação.
Por conseguinte, querer passar a obrigação para os privados, como
no caso, só por má-fé ou má interpretação da lei se pode
aceitar. Compreendem-se certas posições extremadas porque este
processo está inquinado por uma apreciação ideológica por parte
do cidadão comum, mal formado, e muito profissional, funcionário ou
técnico independente da justiça, injusto. Por parte da classe
política partidária, interessada apenas na sua eleição, nem vale
a pena falar.
Segundo dados oficiais das Finanças, existem 115,828 contratos de arrendamento
antigos, anteriores a 1990. A levar em conta a posição de tantos, só quando estes
arrendatários morrerem- ou os edifícios caírem de velhos- se
resolverá este cancro social que continua a minar o desenvolvimento das cidades, vilas e aldeias do país.
Está
a ser dado ao proprietário o que lhe pertence?
Sem
dúvida alguma! Se o o direito à impugnação não foi exercido pelo
inquilino e a prescrição extinguiu o processo de contraditório, como
foi dito em cima, naturalmente que a devolução do locado ao seu
legítimo proprietário é meramente uma justa retribuição.
É
certo que o procedimento por parte da Segurança Social, ao demorar
seis meses para responder ao pedido de assistência jurídica ao
inquilino, é a todos os níveis escandaloso, reprovável e
condenatório e, pelo menos nos que defendem a justiça justa, igual,
para pobres e ricos, não pode deixar ninguém insensível. Mas,
atenção, essa responsabilidade apenas terá de ser assacada à
instituição social e não às partes em confronto. Por uma questão
partidária, de cor política, sendo sério, não se devem misturar
alhos com bugalhos.
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