No
próximo Sábado, 6 do corrente, vai encerrar a Bijou Brigitte, na
Rua Ferreira Borges, um estabelecimento com cerca de uma dezena de
anos de existência naquele local nobre da Baixa.
A semana passada, duas
lojas, uma de roupa e outra de consertos de electrodomésticos,
cerraram portas nas ruas estreitas.
Embora a busca de espaços para arrendamento comercial continue em alta -já que é uma solução
possível para criar o próprio emprego- e as rendas, aos poucos, até
se tenham ajustado ao mercado, a verdade é que os encerramentos
continuam. As deslocalizações em busca de um contrato mais
económico são uma espécie de tiros em cruzamento numa barraca de
feira.
Embora as projecções
macro-económicas não o refiram, os preços, acompanhando o índice
da procura, continuam a cair. Para não assustar, não se fala em
deflacção, mas o certo é que estamos a caminhar em direcção ao
abismo.
Apesar das medidas
anunciadas pelo Governo de reforço do rendimento das famílias,
apesar da anunciada Bazuca do Presidente do Banco Central Europeu,
Mário Draghi, para criar estímulos a economia continua a cair sem o
fundo à vista.
E
O MILAGRE DO TURISMO?
Mesmo
com os publicitados aumentos de turistas entrados no país, o certo é
que este ano, pelo menos na Baixa, notam-se menos estrangeiros e com
menor poder de compra. Se 2015, mais que certo pela classificação
de Coimbra como Património Mundial, foi uma experiência positiva
para o comércio de rua em geral, até agora está muito longe das
metas alcançadas no ano passado.
Tudo indica que,
infelizmente, o comércio tradicional continuará a cair e a ser,
cada vez mais, o parente pobre da economia do país.
E
PARA A HOTELARIA?
Obviamente
que escrevo pela observação e sem conhecimento de dados
estatísticos substantivos de fundamento, o que me parece é que
mesmo para a hotelaria -refiro cafés e restaurantes- as diferenças
continuam a pesar.
É irrefutável que o
sector hoteleiro, com a redução do IVA, teve um bónus do Governo
mas, mesmo assim, este ramo de transformação continua a penar. Até
porque, sobretudo na Baixa, verifica-se uma tendência natural para
que o comércio a retalho vá desaparecendo e dê lugar a típicas
casas de fado -vale a pena fazer uma visita à zona do Quebra Costas.
A revolução começou ali e, creio, progressivamente irá alastrar à
Baixa.
MAS,
AFINAL, COMO É QUE ESTÁ A BAIXA?
A
Baixa desde tempos remotos, continua a dividir-se em duas partes: a
Calçada, constituída pelas Ruas Ferreira Borges e Visconde da Luz,
e as vias estreitas. Nas palavras escritas de Fernando Assis Pacheco,
“in Trabalhos e Paixões de Benito Prada”, “Jorge Galo, que
também mudara o estabelecimento para a zona chique, era o autor da
teoria segundo a qual o comércio de Coimbra estava escalonado em
reinos contíguos e bem caracterizados: o inferno, estendendo-se pelo
labirinto da Baixinha, cuja sobrevivência assentava numa prática de
preços populares, pouco acima do custo de fábrica; o céu,
constituído por um largo, da Portagem, e duas ruas, Ferreira Borges
e Visconde da Luz, formando juntas a calçada, onde podia restar
alguma exploração mais modesta, mercearia, capelista, engraxador,
mas a tendência era para concentrar o negócio fino; e o purgatório,
que ocupava territórios de passagem como as Escadas de de São Tiago
ou fronteiriças tipo Sansão -chamado na toponímia oficial Praça
Oito de Maio, adjacências tão naturais que se protestaria terem o
mesmo concurso da Calçada nobre e afinal não tinham, pois um
cavalheiro não se abastecia de ordinário nesses ermos, e uma
senhora muito menos. Eram factos sem explicação por virem de
bastante longe no tempo. “O mais”, filosofava Jorge Galo, “é
Marrocos, bom para aviar sabão macaco e alcagoitas.”
Por conseguinte, quer
dizer-se que as ruelas e becos, em contraposição às ruas largas,
continuam a ser Marrocos e prosseguem a sua histórica dificuldade.
E
NÃO HÁ ESPERANÇA DE MELHORAS PARA O COMÉRCIO?
Tenho
para mim que, por vários motivos, o comércio tradicional, tal como
o conhecemos com a pequena loja de bairro, está condenado ao
desaparecimento. Um deles, são as cada vez maiores exigências
(obrigações) para os lojistas -em contraposição com as vendas
online de particulares que, fazendo disso um negócio, nada pagam.
Outro, são as constantes promoções nas grandes superfícies no encadeio da linha de destruir para reinar. Outro ainda, é a filosofia da “mão invisível” -na teoria da Economia
Clássica- em que o Estado deixa de intervir na Economia e é o
mercado a estabelecer o preço entre a oferta e a procura. O problema
é quando a oferta (global) é uma diarreia quotidiana e a procura é
uma bufa temporal.
Com a liberalização, que começou em 1985, entrou-se numa escalada de
abaixamento de preços de venda sem fim à vista. Se até aí, com os preços
tabelados pelo Estado, por um lado, o que contava era atingir a maior
margem de lucro possível, por outro, os grandes e pequenos
empresários estavam todos defendidos e, por isso mesmo, no mesmo
patamar de concorrência.
Com a liberalização
total que se seguiu passou a procurar-se o menor lucro marginal
vendendo cada vez mais barato. Entrou-se na lei da selva com o mais
forte a derrubar o fraco somente com meros intuitos de destruição. O
resultado desta política ultra-liberal, numa primeira fase, foi bom
para todos os consumidores (que somos todos). A democratização do
acesso a todos os bens pelo preço baixo, ao trazer uma aparente
felicidade, transformou-nos em instrumentos de fácil manipulação
política. Na segunda fase, a partir de 2000, veio a factura para
pagar. Como o abaixamento contínuo de preços e acréscimo de custos médios leva ao encerramento
paulatino de indústrias, comércio e serviços, e por isso mesmo ao
desmesurado aumento de desemprego, com os rendimentos das famílias a
diminuírem cada vez mais, a consequência está à vista de todos.
Não saímos da cepa torta, com a dívida pública a não parar de
subir.
MAS,
POIS SIM! E O COMÉRCIO DA BAIXA?
Já
não são muitas as lojas mais antigas ainda em exercício. Como a
maioria não terá seguidores e a idade dos comerciantes destes
estabelecimentos, neste momento, caminha acima dos sessenta anos, é
de prever que nos próximos cinco anos vai ser uma razia. Pode até
pensar-se que desaparecendo estes velhos lobos do comércio outros
ocuparão o seu lugar. Puro engano. É impossível porque, por um
lado, estas pessoas, na generalidade, estão bem de vida e não
dependem da caixa diária, por outro, o seu amor ao comércio, à sua
loja, é insubstituível. Quem vier a seguir, por impossibilidade
financeira e falta de experiência empírica, vai limitar-se a fechar
a porta.
Apesar de ser muito diferente do que foi há cerca de vinte anos, e já pouco ser em semelhança, o modo como conhecemos hoje a Baixa vai só restar na memória. Para os conformados, dirão que é a dinâmica natural das coisas. Para os outros, para os optimistas/realistas perguntarão: mas tinha mesmo de ser assim? Não poderia ter sido de modo diferente?
Apesar de ser muito diferente do que foi há cerca de vinte anos, e já pouco ser em semelhança, o modo como conhecemos hoje a Baixa vai só restar na memória. Para os conformados, dirão que é a dinâmica natural das coisas. Para os outros, para os optimistas/realistas perguntarão: mas tinha mesmo de ser assim? Não poderia ter sido de modo diferente?
2 comentários:
vou mandar parte do comentário que fiz, como o bloque tem limite de caracteres e o comentário e longo mando o resto por email
Na zona histórica há quem seja optimista e diga que vamos voltar à Baixa do tempo de 1980. E até superar esses anos de glória. Outros dizem que já deu o que tinha a dar e vai se afundar como o Titanic. No meu entendimento, morador na zona, nem oito nem oitenta. Exemplifico:
1 -A meu ver a Baixa estagnou no tempo. Não se modernizou não se adaptou aos tempos actuais.
Sim, também houve muitos culpados, mas já foi tantas vezes debatido neste blogue que não vou falar deles. Há vários aspectos que ninguém vislumbra com olhar atento. Vou mencionar alguns.
Na Baixa dos anos de 1980, e mesmo 1990, havia um factor que hoje é pouco expressivo, ou quase nulo: habitantes. Havia muitos moradores. Juntamente com os serviços que havia na época e que lentamente foram desaparecendo, faziam fervilhar esta zona comercial. A meu ver a retirada do trânsito das Rua Visconde da luz e Ferreira Borges foi uma tentativa de ligar a Alta, que já era um bairro de residentes, à Baixa, que foi sempre um centro comercial a céu aberto. Transformando estas vias largas em pedonais, logo seriam mais turísticas. Projecto semelhante, parece, querem fazer na Rua da Sofia. Será que irá acontecer na rua da sabedoria o mesmo? Não será mais uma facada mortal para a Baixa? Não havendo moradores nestas zonas não podemos esperar milagres.
2 -A situação económica dos anos 80 e 90, do século passado, era totalmente diferente de hoje. Na altura havia poder económico. Desde 2001, a partir do derrube das Torres Gémeas, nos Estados Unidos, que o país começou a afundar-se numa crise económica sem precedente, onde cada ano que passa o Orçamento Geral do Estado aplica mais impostos estrangulando as famílias. A maioria passou a poder comprar apenas bens de primeira necessidade e deixando para segunda escolha outras, como o vestir e calçar.
Mas, apesar do contexto depressivo, há uma luz para a Baixa: os jovens. Na minha rua (Visconde da Luz) vejo algumas lojas às moscas, sem negócio, mas curiosamente há outras que têm sempre clientes. Estes espaços cativam mais pois são direccionadas para o publico mais novo, desde roupa calçado, acessórios de moda. Os jovens adoram variar, de gastar dinheiro em novos artigos, gostam de estar na moda. Essencialmente, a Baixa terá que passar pelos jovens, ter lojas exclusivas para esta faixa etária. Sendo uma urbe universitária, é de lamentar ser uma cidade envelhecida na oferta.
3 -Durante a noite, principalmente no verão onde bom tempo convida a passeios, vejo na minha rua e pela zona envolvente as montras com os expositores sem luz. Compreendo que numa altura de contenção se deva poupar na electricidade, mas havendo hoje lâmpadas de alto brilho e que pouca energia gastam -falo das LED-, não entendo como há lojas apagadas. Como querem os comerciantes atrair potenciais clientes, com suas montras sem luz? Aqui os lojistas têm culpa.
Depois, para combater as grandes superfícies, porque é que não estão abertas, pelo menos no verão, até as 22h00? Há lojas na minha rua a fazê-lo. Não aceito que certos lojistas mesmo em cima das 19 horas já estejam a encerrar. Com tantas pessoas a dar o seu passeio até à meia-noite, é desolador ver a maioria dos espaços fechados, sem luz nas montras, já para não falar nos locais que não têm comércio.
PODE LER AQUI O COMENTÁRIO POR INTEIRO, ISTO É, SEM CORTES:
http://questoesnacionais.blogspot.pt/2016/08/um-comentario-recebido-sobre_5.html
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