quinta-feira, 23 de dezembro de 2021

AOS LEITORES: “BO’NATAL”

 

(Imagem da Web)



Neste mês de Dezembro, a palavra mais badalada, falada e repetida à exaustão, será, porventura, “bo’natal” - exactamente assim, com a consoante suprimida. Com a poupança da letra”m”, mas com certo sentido missionário de apaziguamento em cenário de ameaça epidemiológica, soltamo-la ao vento, no beco, na rua estreita, na praça, como se pretendêssemos com o seu espírito de paz e bonomia acalmar a nossa ansiedade e de quem se cruza connosco. Como se a sua luz, interior e refulgente da alegoria em remissão, fizesse apagar outras palavras que nos conduzem a um buraco negro, fundo e depressivo. Embora não deliberado, por contexto, tornámo-nos, individualmente um elo em cadeia, uma espécie de colectivo messiânico que, mesmo sendo efémero, parece querer anunciar a reconciliação social. Em vez do aperto de mão e do abraço, físico e envolvente, cumprimentamos com “Bo’natal”.

Já não se pode ouvir e conviver diariamente com vocábulos como “Covid-19”, “desconfinamento”, “testes rápidos de Antigénio”, “certificado digital”, “Casa Aberta”, “RT, Índice de Transmissibilidade”.

Num tempo em que a Civilização tomou conta da nossa existência em detrimento da Cultura – a Cultura vai à génese, à raiz, ao âmago das coisas, a Civilização alimenta-se da folhagem, dos ventos secos dos dias, do emorredoiro. Enquanto a Cultura, pelo enraizamento social, é pura e incorruptível, resiste e persiste no tempo, a Civilização, sendo auto-fágica, destrói-se e recria-se a si mesma. É interesseira e presta-se à corrupção da sua verdade histórica.

Segundo a história, o Natal, enquanto símbolo religioso Cristão, tem pouco mais de 1700 anos. Teria sido no século IV que a Igreja Católica fixou a data de 25 de Dezembro como dia universal da nascimento do Menino Jesus. Por certo, teria por pretensão ser uma época de armistício temporário em tempo de guerra, uma paragem para a reflexão existencial, uma catarse, uma regeneração da alma, um aperfeiçoamento, ainda que rudimentar, para o Ser. A recriação do nascimento através de figuras em presépio teria começado em 1223, com S. Francisco de Assis.

Com o passar dos séculos a data foi sendo cada vez mais profana e a concorrer para o Ter.

Diz-se que a tradição de enfeitar o pinheiro começou por alturas do século XVI.

É por volta de 1836 que, em Portugal, pela primeira vez, se distribuem presentes e se evocou a figura mítica de São Nicolau.

Nos últimos anos o presépio, enquanto figura representativa do mistério do nascimento, tem vindo progressivamente a desaparecer. Só os mais velhos o continuam a reverenciar. O velho das barbas brancas, criado pela Coca-cola, ocupa agora a imaginação dos mais novos, sobretudo pela materialização e apropriação que o comércio mundial fez da figura.

E comecei a escrever esta lenga-lenga para desejar a todos os leitores do blogue, portugueses e estrangeiros, um Feliz Natal. Que esta quadra, na sua universalidade de paz, seja o melhor que puder ser para todos. Evidentemente, acautelemos, o Natal não é igual para todos, o que um homem quiser, mas, no seu circunstancialismo, o que puder ser. Ressalvando este facto, quero deixar para aqueles que, por razões adversas, estão a viver um momento menos bom uma mensagem positiva: não esquecer que embora os dias, na sua rotação, pareçam ser iguais não são. Como uma roleta do destino em torno das nossas vidas, nunca saberemos o que vai acontecer amanhã.

Muita saúde!

Muito obrigado por ler os disparates que aqui plasmo.

BOAS FESTAS!



 

2 comentários:

Super-febras disse...

Amigo:
Desculpe o atraso. Por aqui os "belhoses" ja' estao um pouco rijos mas eu continuo a teimar em mergulha-los no cafe' da manha, e que bem me sabem. Do bolo-rei ja' so' ha' uma fatia. Tenho que lembrar a minha mulher para que traga mais um da padaria portuguesa aqui ao norte de Toronto. O haver ou nao bolo-rei, parece influenciar o tempo que perdura a quadra aqui por casa. Como sou lambareiro peco ao menino ou ao "Santa" que dure pelo menos ate' a uma semana depois de Reis.
Sem mais e com pena de nada ter para lhe oferecer, nem um cantar das Janeiras, sabendo eu que tanto gosta de musica, fico-me pelo envio de desejos. Desejo-lhe em primeiro muito saude, familiares que gostem de o embracar, boa vizinhanca e um bom amigo que ao balcao enquanto toma um cafe, ou na barbearia enquanto corta o cabelo, ou no parque enquanto le o jornal saiba faze-lo sentir que nao esta' so' e o faca perder a nocao das horas a passar com boas e amistosas conversas. Por ultimo, desejo-lhe boas festas.
Nao se esqueca de confirmar se ainda tem bolo-rei. E' que faz toda a diferenca!

Um abraco
Alvaro Jose da S. Pratas Leitao
Bradford, Ontario, Canada'

LUIS FERNANDES disse...

Muito obrigado, Senhor Álvaro Leitão. Há quanto tempo, meu caro amigo. Fico muito contente por saber que está bem de saúde. Respondendo à sua questão, por aqui ainda se mantém o Bolo-Rei, e melhor do que nunca. Como foi criado o Bolo-Rainha, imagine, depois de mais de um século sempre sozinho, o nosso bolo identitário anda nas núvens. Não tardará, creio, em surgir o Bolo-Reizinho.
Um grande, mas grande abraço.
Boas festas.