sábado, 15 de outubro de 2016

Ó COIMBRA, NÃO ME LIXES!

continente
(Imagem desviada, sem autorização mas com a devida vénia, do site Notícias de Coimbra)





Seguindo o exemplo do passado no acrescimento, igualmente como no Orçamento Geral do Estado já com um tradicional desmesurado aumento de impostos, este ano, a dois dias da festa académica, “mais de mil carrinhos terão sido furtados para a Latada”, in Diário de Coimbra (DC) de hoje.
Embora tenha noção que estou a chover no molhado, até por que já escrevi vários textos sobre este assunto e, agora, corro o risco de me repetir, antes de prosseguir, uma pergunta emerge: que adultos responsáveis esperamos destas crianças imberbes? A resposta óbvia é que, com o proteccionismo exacerbado que as autoridades lhe conferem, Câmara Municipal, Universidade, Polícia de Segurança Pública, jamais vão crescer e não se tornarão homens, cidadãos respeitáveis e cuidadores da coisa pública, que é de todos. Quando os dirigentes de uma colectividade, em nome de um (mau) hábito -contrário ao costume que tem acoplada uma convicção valorativa de virtude- protege uma classe, permitindo-lhe uma série de atropelos notoriamente atentatório às boas regras sociais, está a discriminá-la positivamente e a transformá-la numa casta, grupo social fechado sobre si mesmo, gozando de privilégios especiais e atribuindo-lhe um espírito de elite e prerrogativas de auto-exclusividade. E não se pense que esta aura de divindade na classe estudantil é recente, tal como o vento já vem de longe. São séculos de história na (in)cultura portuguesa. Este nepotismo, sobrelevando e valorizando os alunos universitários, tem levado à produção em massa de execráveis idiotas da pior espécie. É a “veneração da cátedra” numa cidade de cócoras perante uma Torre de Babel, que pretende confundir o geral com o individual. Enquanto aspirantes, começa logo ao transpor a porta férrea pela primeira vez e acaba quando, mais tarde, estes discípulos sobem na hierarquia social e alcançam um lugar decisório de poder. Se vivêssemos numa colectividade justa, capaz de dirimir o bom do mau, expurgando naturalmente o mal, há muito tempo que esta situação de pedantismo local, em exagero negativo, tinha sido denunciada e colocada uma pedra tumular. Mas não, em vez de se discutir o essencial como as boas práticas societárias, para desviar a atenção, perdemo-nos todos em longos discursos sobre a praxe académica.

A CUMPLICIDADE TÁCITA

Como uma construção erguida sobre a água, economicamente, Coimbra, na sua longa história de sete séculos de Universidade na cidade, assenta em estacas de suporte estudantil -a recente classificação de Património Mundial da Humanidade, pela Unesco, veio interromper o ciclo. Daí se entender que, apesar dos abusos identificados, não haja um protesto generalizado. Por um lado, os estudantes são a alma da cidade, logo, por inerência, são intocáveis, por outro, é assim como a expressão “são crianças, senhor!”. E, por isso mesmo, são inimputáveis civilmente. O lema é sujar e destruir que, à custa dos impostos de todos, alguém virá remediar
Mas não é só uma questão lesiva do social que está em causa e a identificar uma urbe acobardada, é também económica, política e de autoridade.
É económica por que não se entende -ou talvez sim- que cada carrinho furtado às grandes superfícies, tendo um custo unitário de cerca de cem euros -que notoriamente lesam as cerca de meia-dúzia de grandes empresas alimentares que estão implantadas dentro da malha urbana-, não gere uma reação de repúdio generalizado, sobretudo com queixas na PSP contra desconhecidos. É evidente que pelo receio de afrontar desordeiros preferem ser prejudicadas em milhares de euros. É pena que não procedam do mesmo modo quando um qualquer “zé-ninguém” furta um artigo de pouco mais de uma dezena de euros.
É política porque, tendo a completa cobertura do executivo camarário, mostra que a edilidade, confundindo o bem comum, está extasiada e presa nas diatribes organizadas e orquestradas nas festas estudantis. Ou seja, para caso igual a autarquia procede de modo diferenciado -veja-se o caso do horário de encerramento das Festas da Latada, licenciado um evento para terminar às 04h00 encerra às 06h00 -é o próprio coordenador-geral a admiti-lo, hoje, no DC. Não se pode compreender que, em face de uma lesão de interesse público -no caso, ao arremessarem os carrinhos para o rio Mondego, incorrendo num crime ambiental, se assobie para o lado.
É uma questão de lesa-autoridade porque, estando à vista de todos o material furtado -já que os carrinhos são facilmente diferenciáveis- a apatia, o “dolce far niente”, da PSP, ao não intervir nem que seja na identificação dos possuidores dos artigos desviados do seu legal proprietário, mina a credibilidade e a autoridade desta polícia pública. Em 2014, sem alcançar o ridículo em que se caiu, a PSP chegou a elogiar o promotor da iniciativa "Não Lixes o Mondego".
Até quando vamos assistir a este espectáculo pouco dignificante para a cidade?

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