A indicar que a Natureza estava furiosa fosse lá com quem fosse, a manhã deste 4 de Abril estava sulcada por forte ventania. As rajadas sopravam no beiral com tal força que o som saído era semelhante a uma gataria em Janeiro.
Para quem fosse supersticioso, certamente, faria analogia entre o tempo que fazia lá fora e com tempestade anunciada no Salão Nobre da Câmara Municipal.
Para quem ali fosse agricultor a tempo parcial o mais certo era ter o pensamento no quintal, nas batatas que iriam secar com este clima agreste, nas couves, no cebolo e nos pimentos postos a semana passada.
Mas o relógio da torre da Igreja matriz já tinha batido as nove badaladas e o ofício “litúrgico” chamava os “diáconos” nesta Quaresma pouco santa e de pouca paz para o mundo.
Porque era preciso decidir, estava na hora de começar mais uma sessão transmitida via Internet, esta como janela aberta para todo o planeta.
Ainda no “nim”, tudo indica que a transmissão directa veio para ficar. Com mais um esforcinho e, digo eu, dentro em breve teremos as gravações áudio e vídeo disponíveis para todos.
E como é protocolar, “com um bom dia a todos”, o presidente da autarquia, António Jorge Franco, deu por aberto o “Período de Antes da Ordem do Dia”.
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Rui Marqueiro, ex-presidente da edilidade e agora vereador eleito pelo Partido Socialista, o “enfant terrible” desta legislatura, cujo desempenho no executivo parece depender dos seus estados de humor, e que, pelas suas tiradas, umas vezes com graça outras sem ela, já ganhou o estatuto daquele actor carismático, experimentado e calejado, que prende o espectador numa peça cénica. Contrariamente ao que fazia prever o cepticismo ciclónico, hoje o homem que prende o nosso olhar estava calmo e sereno. Como se estivesse num grupo de “amigos do peito”, trazendo à colação histórias vividas e arquivadas no seu longo mandato de reinado, alertou que teve uma má experiência com os políticos de Anadia. “há uma enorme sobranceria em relação à Mealhada”, enfatizou.
António Jorge Franco, o pacificador, atalhou que mudam-se os tempos, mudam-se as pessoas e tudo se altera.
Continuou Marqueiro interrogando sobre o que se fala da possibilidade de instalação na cidade das empresas Continente, Pingo Doce e Aldi.
Respondeu o chefe da mesa ser verdade que as três marcas alimentares pretendem ter representação na cidade.
O Continente, provavelmente, será próximo da rotunda que dá para a auto-estrada; o Pingo Doce será, em princípio, junto à Escola Secundária; quanto ao Aldi o parecer ainda está a ser analisado, esclareceu o general da edilidade.
Marqueiro, pretendendo ganhar pontos, em conversa sobre a passagem do TGV nas proximidades da cidade, interrogando a mesa, atirou a frase do dia: “quais foram as contrapartidas para a Mealhada?”.
Sem conteúdo concreto, a resposta ficou vazia e o reconhecido economista foi convidado a dizer quais foram. E o retorno foi: “Não digo!”
Na parede em fundo, sempre vigilante, o rosto de Marcelo (em fotografia) pareceu retorcer-se e dizer: pronto, já está o caldo entornado! Estes socialistas dão-me cabo da saúde!
Mas o regedor Franco, que nestes seis meses de presidência, alegadamente, foi obrigado a tirar um curso intensivo de psicologia aplicada, atalhou a questão com um sorriso e uma penada: “se o senhor vereador não quer dizer não diga. Não há problema”. E o busílis morreu ali.
Marqueiro, aceitando o veredicto, encolheu-se. E o quadro institucional de Marcelo, sem mexer um músculo, voltou à normalidade.
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Como resumo desta primeira parte, ficou saliente o ambiente de harmonia entre contendores que se dividem entre a performance política individual e o desempenho partidário “para fora”, para eleitor ver. Mas, apesar de se entender a procura de protagonismo, foi notório o respeito inter-pares. Não podemos esquecer, nunca, que ali, naquela pequena sala, cada reunião é uma batalha pela conquista de poder. E não se vê que, por aí, por uma saudável prestação argumentativa, venha qualquer mal.
Amanhã conto com mais pormenor, mas deu para ver que estes decisores, maioria e oposição, têm uma noção muito delineada do momento grave que se vive e, por isso mesmo, o seu apoio é fundamental à colectividade.
Com muita sinceridade gostei muito da actuação de António Franco. E este meu pensamento não foi apenas construído hoje. O homem do leme, devagar devagarinho, tem vindo a conquistar o respeito de todos, penso, incluindo o próprio ex-presidente.
“Habemos” Homem.
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