terça-feira, 8 de maio de 2018

EDITORIAL: OS NOVOS COLISEUS

(Imagem de Leonardo Braga Pinheiro)




Ontem um membro da Página da Câmara Municipal de Coimbra (não oficial) pediu para ser publicado um post. No caso, apresentava uma fotografia com três pessoas, com rosto truncado, num compartimento onde se viam vários sacos de cor e uma delas a comer de uma pequena caixa em plástico. A imagem era acompanhada com uma legenda que, falando de fome e dos funcionários e estagiários de um hotel, em Coimbra, serem obrigados a comerem em marmita, tecia comentários pouco abonatórios para a gerência da estrutura hoteleira.
De salientar que o imóvel turístico não era identificado -uma vez que não era referido o nome do estabelecimento, por isso mesmo, foi publicado.
Acontece que no seguimento de muitos comentários de outros membros desafiando a proponente a denunciar os empregadores, apenas interessados em culpar os empresários, o membro cedeu à pressão e acabou por descrever o logótipo e a área onde está inserido na cidade. E aqui é que a pintura ficou borrada. Como quem diz, sem se dar conta, aposto, o membro entrou na área criminal, passível de ser demandado por difamação agravada pelos visados hoteleiros. Apercebendo-nos do “escorreganço” de consequências imprevisíveis, tratámos de alertar o “denunciante” para o ilícito que, sem tomar noção, estava a cometer e para a injustiça que poderia estar a dar aso. A haver irregularidades, a queixa deveria ser canalizada para as autoridades competentes, nomeadamente a Autoridade para as Condições do Trabalho.
Ao mesmo tempo, alertámos também um dos proprietários do hotel para o que estava a acontecer com os imensos comentários pouco abonatórios. Ou seja, para que a fogueira em nome brando de um projecto de milhares ou milhões não continuasse, que se defendesse, se assim o entendesse.
Felizmente, a pessoa que colocou o post, perante o nosso alerta, mostrando alguma humildade, parece-nos, vendo que tinha errado, eliminou a sua publicação imediatamente e tudo acabou em bem. Pelo menos é este o nosso desejo.
Em conversa, através do mensenger, com a gerência do empreendimento, ficámos a saber que os funcionários e estagiários, para além das condições prévias contratuais prescreverem a não alimentação, recebem subsídio de refeição correspondente e, alegadamente, o levar alimentos de casa será, porventura, uma decisão individual que cabe a cada um. Isto quer dizer o quê? Apenas isto: que a empresa, alegadamente, está a agir dentro da lei. Logo, quem afirmar o contrário, mesmo que aos seus olhos seja imoral um hotel não dar alimentação aos empregados, está a difamar.
Mais que certo, o leitor estará a interrogar a razão deste escrito. Porque o fazemos, questionará? Tão só porque as redes sociais estão transformadas num grande coliseu romano onde o imperador, constituído por uma massa de leitores anónimos, num egoísmo e mesquinhez soezes, pede sangue para todos sem levar em conta um julgamento equitativo e justo.
Só devemos sentenciar alguém depois de ouvir os seus argumentos. Actualmente, as redes servem para emprenhar muito facilmente pelos olhos. E as consequências para a economia, para o social no seu todo, para a pessoa individual afiguram-se cada vez mais trágicas.
A liberdade de expressão tem limites. Não é um fim em si mesmo que se perde no infinito, mas um meio para, respeitando os pontos de vista de cada um, com responsabilidade, calibrar um certo sentido de verdade factual. Bem sabemos que, apesar de 44 anos de democracia portuguesa, o que nos querem impingir não é isto, mas, para convivermos melhor, cada vez mais temos de ser capazes de pensar pela nossa cabeça.
Vale a pena pensar nisto?

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