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das 16h30 de ontem, nos HUC, Hospitais da Universidade de Coimbra
onde se encontrava internado em cardiologia, faleceu o Carlos Alberto
dos Santos Duarte, mais conhecido por “Carlitos popó”
ou “Carlitos pipi” consoante os dois destinos a que
esteve ligado na Baixa de Coimbra. Para uns, era o “Carlitos
popó” por, na década de 1970 e seguintes, andar nas ruas
ao papelão e às vezes para passar mais rápido entre os transeuntes
que atrofiavam as ruas imitava o motor de um automóvel com buzina e
tudo. Para outros, tinha por alcunha o “Carlitos pipi”
por, em alturas de festas da cidade e da Rainha Santa aparecer bem
vestido, com fato e gravata.
O
“Carlitos” sofria do coração, tinha um problema na aorta, e já tinha estado internado numa Unidade de Trabalhos Continuados
em Novembro de 2014, quando sofreu o primeiro abanão na saúde. Mesmo assim era um multifunções. Um homem dos sete ofícios, sempre pronto, uma espécie de embaixador da paz e da concórdia.
Mais
logo, cerca das 18h00 o seu corpo será trasladado para a igreja de
São José, Capela da Torre, em cima e na lateral -alegadamente, por
a capela usual, em baixo, estar ocupada. As exéquias, cerimónia
fúnebre e funeral, iniciar-se-ão às 10h00 de amanhã, sexta-feira.
Em
meu nome pessoal e em nome da Baixa comercial e habitacional, se
posso escrever assim, os nossos sentidos pêsames à família e ao
seu amigo Bruno Morais, o seu grande protector e orientador
administrativo.
FOI-SE O
ÚLTIMO FIGURANTE CARISMÁTICO
O
“Carlitos popó” fazia parte de um leque de
figurões que marcaram a Baixa e a cidade durante duas gerações,
pais e filhos, e entre dois sistemas, autoritário e democrático.
Desde o “Taxeira”, o “Tatonas”, o
Adelino Paixão até ao “Pirilau”
-este anda por aí, de boa saúde, mas, pela discrição, não dá
nas vistas- foram personagens marcantes. Não quer dizer que não
tenham sucessores -enquanto houver lugares habitados continuará a
haver sempre disfuncionais, em metáfora, as rosas bravas
de um jardim que é demasiadamente regulamentado por leis escritas,
carregadas de obrigações, a formatarem e a quererem manobrar os
usos e costumes. Talvez por isso, pela liberdade manifestada numa
total irresponsabilidade social perante as normas, estes “cromos”
exercem no colectivo um misto de admiração e fascínio. Quando se
vão criam uma tal consternação como se de uma alta individualidade
se tratasse, um chefe-de-estado, um artista de renome, um benfeitor
da humanidade. Talvez pela impossibilidade de compreender as nossas reacções perante estas pessoas diferentes do comum, que geram
vários sentimentos, resida o mistério do nosso deslumbramento, um quase feitiço
pelos seus desempenhos na sociedade. Por muito que pensemos
conhecê-los, para sempre ficarão na nossa memória como “rostos nossos (des)conhecidos”.
O “CARLITOS POPÓ
(Poema póstumo)
Sou o Carlos Alberto Duarte,
todos me conhecem na Baixa,
uns tomam-me como baluarte,
outros como louco que encaixa
na senilidade do seu encarte;
Sou quase um vivo monumento,
na paisagem envolvente,
tenho um pressentimento
que para muitos não sou gente,
sou coisa sem sentimento;
Mas eu sou pessoa que ama,
dentro de mim bate um coração,
olho para quem passa, para a dama,
para a viúva triste sem consolação,
que olhando para mim, exclama:
“Olha, é um maluco que aqui vai,
caminhando nas ruas sozinho,
pouco fala, parece que nunca sai
do Largo das Ameias, do cantinho,
pobrezinho, valha-o Deus, ajudai!”;
Mas contrariamente ao pensar,
sou feliz com pouco ter,
basta-me apenas não chorar,
que me importa não saber ler,
ou não ter telemóvel para falar?;
Apesar de não ser religioso,
mas até sou um bom cristão,
tantas vezes sou caridoso,
dou um braço, dou a mão,
por alguém mais andrajoso;
Desconheço o ódio, pois então!
gosto de qualquer humano,
quando vou na procissão,
em passo solene franciscano,
julgam-me um igual na razão.
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