quinta-feira, 22 de junho de 2017

BAIXA: CLASSIFICAÇÃO UNIVERSAL EM BALANÇO DE QUATRO ANOS





Ontem, pelas 18h00, no Café Santa Cruz, estava anunciada uma tertúlia/debate para, em balanço, se analisar os efeitos para a Alta e Baixa da classificação de Património Mundial da Humanidade.
Inserida no programa “Sons da Cidade”, promovido pela Universidade de Coimbra e que está a decorrer entre 17 e 24 de Junho, foi uma organização do Lions Clube de Coimbra e com a colaboração dos Rotários de Coimbra. Em vez de um debate de ideias saiu uma conversa vazia em caixa fechada de auto-elogio. Um lamentável espectáculo anti-democrático patrocinado pela Universidade de Coimbra que, em modelo continuado que já vem de longe e que todos conhecemos bem, só pode redundar em divórcio entre as instituições e a sociedade civil. Foi um execrável exercício de cidadania. Uma vergonha, foi assim que escrevi a crónica sobre esta tertúlia falhada.
Sendo os operadores comerciais os mais beneficiados com esta distinção mundial, que ocorreu em Junho de 2013, fui para a rua ouvir o que significou para os seus negócios esta declaração pela UNESCO.
Foi boa? Foi assim assim? Foi má?
A todos, com quem falei, fiz as mesmas interrogações. Como é de calcular as respostas são variadas. As perguntas foram:

-O que significou para o seu negócio a declaração de Coimbra património Mundial da Humanidade?
-Foi melhor nos dois primeiros anos? Como foi no ano passado? E este ano?

Comecei no LARGO DA FREIRIA

Restaurante Padaria Popular. Falou o Sérgio Ferreira:

Para o meu negócio, e sobretudo para a hotelaria em geral, foi muito positivo. As vendas têm vindo a subir. Antigamente o movimento era entre Julho e Setembro. Agora, depois da classificação, começa na Páscoa. Logo a partir desta quadra nota-se muito turismo sénior. Para além disso, passou a ver-se por aqui muitos visitantes de leste.
Este ano, em jeito de balanço, está igual ao ano passado. Para mim, o Maio deste ano foi melhor, mas já o corrente Junho está a ser pior”.

RUA EDUARDO COELHO

Célia Neto, responsável pela sapataria “Hush Puppies” declarou o seguinte:

Certamente resultado da classificação, os dois primeiros anos foram muito bons. No ano passado já foi fraco. Este ano está a ser péssimo. Os turistas entram e vêem mas acham tudo caro. Este ano, desde Janeiro para cá, o negócio tem vindo sempre a cair”.

Modas Veiga. Falou Francisco Veiga:

Para o meu estabelecimento, a classificação não trouxe nada de acrescento em termos de vendas. Para a cidade, pelo grande aumento de visitantes, foi muito bom sobretudo para a hotelaria. Na minha loja, ou no meu ramo, não compram nada. Este ano o meu negócio está mais ou menos igual ao ano passado. Embora, como disse, é feito com portugueses”.

Casa das recordações. Elisabete Cravo disse o seguinte:

O turismo para a cidade, no geral, foi muito bom. Para o meu negócio foi bom nos dois primeiros anos. No ano passado já foi pior. Este ano está a ser fraquíssimo. Este ano está muito mau. Os turistas oferecem metade do valor pedido. Eles não têm dinheiro para gastar em recordações. Adquirem o mais barato possível”.

PRAÇA DO COMÉRCIO

Uma loja de artigos de “souvenir”. Pediu o anonimato:

A classificação de Património Mundial foi boa para a cidade. No geral, trouxe mais turismo. Os dois primeiros anos foram melhores. O negócio no ano passado foi relativo. Este ano há muito turismo mas gastam muito menos nesta zona da baixinha. Os guias turísticos não trazem os visitantes para aqui. O maior volume de transacções são feitas entre o Largo da Portagem, Arco de Almedina e Universidade. Sinto-me muito prejudicada. Já assisti várias vezes aos grupos quererem descer as Escadas de Santiago e a serem imediatamente desviados para o Largo da Portagem”.

Restaurante Praça Velha. Falou o Victor Silva:

A classificação foi boa para a cidade. Passámos a ter muito mais turismo na época baixa, que não havia. Este ano, em relação ao ano transacto, está mais fraco. As pessoas procuram o barato. E outras nem procuram. Se calhar nem comem. Este ano está pior, embora, saliento, ainda é cedo para fazer o balanço”.

LARGO DA PORTAGEM

Café Toledo. Manuel Marques contou assim:

A classificação para a cidade foi boa, mas relativamente. Quero dizer que o turismo que temos é muito pobre. É um turismo que gasta pouco. É um turismo arrebanhado (de pastores) com a bandeira ao alto, mas sempre a andar. Este ano está fraco. Mas já no ano passado foi igual. Temos um turismo de meio-dia. Param o autocarro junto ao Hotel Astória e desaparecem rumo à Universidade. Quase sem tempo, mal páram para beber um café. É muita parra e pouca uva. Há de facto muita gente mas não consomem nada ou pouca coisa. Não é um turismo que interesse muito à Baixa.

RUA FERREIRA BORGES

Casa Malabar. Fala Isabel Silva:

A declaração universal feita pela UNESCO, para o meu negócio, não significou nada. Há muita gente. É tudo com dinheiro contado. Gastam pouco. Em minha opinião, eles nem sabem que Coimbra foi classificada como património mundial. É um turismo fraco, e nem se esforçam para falar português. Nós temos de falar várias línguas, eles não.
Este ano o meu negócio está melhor do que no ano passado -também é certo que tenho mais uma loja. Já são oito. Quero dizer que, naturalmente, pelo maior número de estabelecimentos, tenho de vender mais. Digamos que subiu um bocadinho. Mas podia ser bem melhor se a Câmara Municipal não estivesse a fomentar o “saco azul”. Ou seja, ao patrocinar cada vez mais feiras sem que os vendedores paguem alguma coisa, está a prejudicar o meu negócio. Quer dizer, eu faço aqui uma qualquer venda tenho de dar um talão de caixa e quem vende na rua não dá uma prova de pagamento? Estará certo o que a autarquia está a fazer?

Ourivesaria Costa. Falou José da Costa.

Acho que esta declaração universal foi muito boa para a cidade. O turismo subiu brutalmente. Sinto nas ruas um estado de alegria constante. Vejo passar muita gente com sacos com o logótipo da Universidade. Pode nem haver muita diferença no meu negócio mas existe. Ao ver passar gente na rua, sinto-me outro. O turismo tem vindo a decrescer nas compras. Este ano sinto uma ligeira melhoria. Em relação ao ano passado, a diferença é pequena. Talvez seja mais uma questão psicológica, pela satisfação de estar aqui. Antes da classificação, eu tinha dias em que, pelo pouco movimento de pessoas, sentia muita tristeza. Agora sinto um certo estado de excitação pelo facto de estar aqui. Do alto dos meus 85 anos, estou muito satisfeito com esta distinção que a cidade recebeu. Há mais gente a passar na Baixa, embora, tenho de dizer, não seja muito expressivo nos números de caixa.”

Loja de recordações “Coimbra na bagagem”. Fala Tânia Pinto:

Para a cidade, no geral, foi muito boa esta distinção. Nos dois primeiros anos, após a classificação, não tivemos grande variação nas vendas. Este ano está igual ao ano passado. Na comparação com os dois primeiros achamos que temos vindo a melhorar.
A Universidade devia estar mais interligada connosco. Isto é, devia estar do lado de todos os operadores e não está. Parece que nos quer fazer concorrência.”

Papelaria Cristal. Fala José Reis:

O negócio na minha loja nos primeiros dois anos foram fracos. No ano passado foi assim assim. Este ano está melhor.”

RUA VISCONDE DA LUZ

Pronto-a-vestir Estrela Verde. Fala Américo Oliveira:

Este ano, noto que há muitos estrangeiros. Alguns compram, outros não. No que adquirem é essencialmente artigos em promoção. Este ano, comercialmente, é o pior. É para esquecer. No ano passado já foi fraco, mas este ano... é mesmo para esquecer!

PRAÇA 8 DE MAIO

Pronto-a-vestir Sansão. Fala Horácio Mendes:

No conjunto dos quatro anos, em termos de negócio, não foi bom. Há muitas queixas de quem nos visita a lamentar as obras em todos os sítios. E também que não há estacionamento gratuito.
Em termos de negócio, este ano está muito pior do que no ano passado. Em 47 anos de actividade comercial nunca vi uma coisa assim. E, parece-me, está para acentuar. Estou na Praça 8 de Maio há 65 anos. Tenho 80 anos. Tenho dois empregados que já estão reformados, mas continuo a a pagar a sua Segurança Social. Não consigo ter lucro. Não vale a pena continuar.

RUA DA SOFIA

Tabacaria Estrelinha da Sorte. Fala Luísa Braga:

Com a classificação não notámos nada nas vendas. Muito menos gente. Está cada vez a fazer-se pior negócio. Este ano, então, está muito fraco. Agora, há certas partes do dia sem gente. Nunca me aconteceu. Chego a estar duas horas sem ninguém. A Rua da Sofia, por ter sido classificada ainda veio prejudicar mais. As igrejas continuam fechadas. Sinto-me muito desanimada. Chego aqui às 06h00 e encerro às 20h00... Para quê?”

Café Sofia. Fala Aguinalda (Guida) Simões Amaro:

Em termos de negócio para a Rua da Sofia, esta classificação não trouxe nada. A Rua da Sofia continua vazia. Ao longo destes quatro anos vi passar três ou quatro grupos de turistas com guias, mas nunca páram.
Este ano o negócio está muito pior que no ano passado. Estou muito desanimada com tudo isto. Esta rua tem um potencial bruto e ninguém liga. Só tem uma igreja aberta. As políticas respeitantes ao turismo estão a prejudicar a Rua da Sofia.

Pronto-a-vestir Sofimoda. Fala Arménio Pratas:

No ano de 2013 (ano da classificação pela UNESCO) o negócio foi relativo. A partir daí foi sempre a cair. Este ano de 2017 é o pior de sempre. Estou a entrar numa curva que não sei onde vou bater. O turismo não chega à Rua da Sofia. Após quatro anos de classificação como Património Mundial da Humanidade os monumentos continuam fechados. Os turistas isolados -como está tudo encerrado- passam aqui como cão em vinha vindimada.


E encerra-se aqui este longo inquérito aos representantes de várias actividades cujo turismo é nuclear para a sua sobrevivência. As declarações, “ipsis verbis”, são as que foram proferidas e ficam para quem lhe entender dar tratamento adequado. A ideia foi, com estes depoimentos, poder contribuir de algum modo para a análise de quatro anos de classificação. Aos comerciantes e hoteleiros, que fizeram o favor de me aturar, o meu muito obrigado.

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