quarta-feira, 17 de maio de 2017

MATAR O MENSAGEIRO E INDULTAR O VÂNDALO

(Imagem de Leonardo Braga Pinheiro)




Ao que parece, na última semana de Queima das Fitas do Porto, ocorrida há poucos dias, uma rapariga foi violada, com introdução de uma mão masculina nas partes genitais, dentro de um autocarro de transportes colectivos no Porto. Este acto, que nos deve fazer pensar a todos, foi visionado pelos passageiros do veículo e filmado pelos colegas do agressor. Pelos vistos, ninguém moveu um dedo para acudir à rapariga -no vídeo não se percebe se o ataque foi, ou não, consentido pela vítima. Aparentemente, pelo descontrolo da mulher, parece não ter sido com consentimento. Mesmo a sê-lo, a passividade dos ocupantes do veículo deve fazer questionar o que está acontecer com a sociedade. Alegadamente, as imagens foram difundidas nas redes sociais.
O jornal Correio da Manhã noticia o facto e colocou o vídeo online salvaguardando as identidades das pessoas envolvidas em causa. Pode o jornal ser acusado de estar a fazer um jornalismo de caserna por difundir o vídeo e fazer disso uma notícia? Pode sim. Nas redes sociais, por muita gente, a direcção do jornal foi acusada do pior, de aproveitamento, e até de patologia mental.
Começo com duas ressalvas. A primeira, só agora visualizei o vídeo -e isto pode até parecer que não o fiz anteriormente para não entrar na classificação de voyeur, mas não é nada disso. Por acaso, escrevi este texto antes de o ver. Quero dizer que ao manifestarmos uma opinião temos obrigação de começar por ler a notícia -ou neste caso ver o vídeo. Depois, se não tivermos hipótese de outro contraditório, tendo em conta os factos apresentados, maturar as premissas até chegar à (nossa) conclusão. Espicaçando o nosso espírito crítico, devemos perguntar-nos se, passivamente, aceitamos a explicação dada, ou seja, se, dentro da ilicitude e prevaricação humanas, nos parece razoável e não entra nos mitos criados nas redes sociais -que faz com que se embandeire em arco em sindroma de carneirada. Na segunda emenda, declaro que não sou leitor diário do Correio da Manhã (CM).
Isto tudo para dizer que, apesar de alguns apregoados erros de informação dados pelo CM -e quem não os dá?-, tenho um enorme respeito por este órgão de informação. Goste-se ou não do género popular (ou populista), é o único meio de informação nacional que está em todas -com o devido exagero, naturalmente. Sabendo todos a acentuada crise que se está a verificar na imprensa escrita -que, na generalidade, só noticiam casos em que se verifiquem mortes ou muito sangue-, o CM é um caso de estudo num país com cerca de 8% de iliteracia pura e dura. Tiro o chapéu a este jornal diário pelo serviço público que presta a Portugal.
Passando ao caso em concreto do vídeo, agora que já o visionei, devemos matar o mensageiro e absolver os vândalos que lhe deram origem? Quem está doente e a precisar de tratamento? O jornal ou a sociedade? Imagine-se que o CM não dava notoriedade a este caso que afronta as mais elementares regras societárias, será que alguma vez este assunto seria ponto de discussão? Por uma questão de pudor social (muitas vezes assente numa elevada hipocrisia) devemos assobiar para o lado e fazer de conta que não se passa nada? Então, entre um DEVER (de escolher as notícias, entre as que não provoquem choque e outras) e um DIREITO público de informar, a seu ver leitor, qual o que deve prevalecer? O DEVER ou o DIREITO?

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