sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

UM COMENTÁRIO RECEBIDO SOBRE E UMA RESPOSTA







Anónimo deixou um novo comentário na sua mensagem "CMC: TANTO FAZ SER SOCIAL-DEMOCRATA COMO SOCIALIST...":



O Estado Social é isso mesmo, em qualquer lugar do mundo e já nasceu há muitos anos. Há menos tempo em em Portugal, embora eu próprio tenha crescido num bairro camarário, de renda baixa. Portanto, é também aos meus pais que se dirige, sr. Luis Fernandes. Em Inglaterra, onde vivi, muitas pessoas pobres até recebem um subsídio especial para o aquecimento, muitas vezes também em bairros sociais, onde pagam menos do que outros. É injusto para os que pagam os preços normais? Se é assim, vamos acabar com o Estado Social e cada um que trate da sua vida como puder e quiser.

António


RESPOSTA DO EDITOR

Em primeiro lugar, senhor anónimo, os meus calorosos cumprimentos. Feliz Natal para si (que nos conhecemos bem) e toda a sua família.
Em segundo, vamos então à minha contra-argumentação. Começo por lhe dizer que em abstracto está certo, no concreto está enganado. Antes de explicar melhor, vamos a um pouco de história.
Em teoria, nenhum Estado-nação, na sua contratualização social, que deixe cair um anormal número de pessoas isoladas, cidadãos, ou famílias na miséria poderá persistir no tempo. Sem políticas sociais distributivas, equitativas -praticando uma política equilibrada, não de confisco aos que mais trabalham para ter para, de forma gratuita, dar aos que nada têm, e contrária a extremismos- pode transformar-se num Estado insolvente, que está condenado ao desaparecimento. Mas, sem o tal equilíbrio de que aflorei, pode sempre incorrer na falência. O curioso é que pode falir de duas formas: por dar absoluta importância aos mais vulneráveis, exagerando nas transferências sociais -parecendo desenvolver o ócio-, e por aumentar demasiadamente os escalões de incidência contributiva aos que mais ganham e têm.
Convém lembrar que o Contrato Social, de 1762, elaborado pelo suíço Jean Jaques Rousseu (1712-1778) preconizava que o cidadão condicionava a sua liberdade, isto é, depositava na outra parte contratante, o Estado, para que este, como bom chefe de família, justo equidistante em relação a todos, distribuísse de forma equitativa os direitos e obrigações por igual. Assim seria na SAÚDE –que só viria a acontecer, embora timidamente, a partir da década de 1930, com o advento da Social-democracia e a criação do estado social de bem-estar com maior incidência nos países do norte da Europa. Assim seria na JUSTIÇA, onde o Estado patrocinaria a sua administração e se encarregaria de a aplicar a todos os indivíduos de forma igual, embora tendo em conta as diferenças de cada um. Seria assim na HABITAÇÃO, onde o patrono chamaria a si políticas de desenvolvimento que conduzissem a que a cada família ou indivíduo correspondesse uma habitação condigna. Assim seria na EDUCAÇÃO, em que seria facilitado a todos o acesso a um conhecimento literato e de modo a que, para além de todos saberem ler e escrever, o ensino universitário fosse acessível universalmente por igual. Assim seria no TRABALHO, criando, quer, através da iniciativa pública e dos serviços necessários à sua própria máquina administrativa, e tributando todos com alguma contenção, quer através dos privados, políticas de fomento empresarial e de modo a que economia floresça e, pelo seu desenvolvimento contínuo, gere empregos.
Como se sabe, tentando ser recto, estas políticas começaram ao de leve em Portugal por volta de 1970 com Marcelo Caetano e algumas reformas sociais como a aposentação, por exemplo, para alguma profissões.
Depois, com maior preocupação e ratificado no livro maior, na Revolução de 25 de Abril de 1974, com a Constituição da República Portuguesa, em vários direitos sociais consignados universalmente, e aprovada em 02 de Abril de 1976.
A seguir, tocados pelos ventos provindos da adesão à então CEE, Comunidade Económica Europeia, em 1986, foram sendo alterados direitos e obrigações comunitárias.
As prerrogativas sociais viriam a tomar velocidade de cruzeiro em 1996 quando o então primeiro-ministro António Guterres, para acudir à pobreza extrema, criou o Rendimento Mínimo Garantido -chamado a partir de 2004, e ainda agora, Rendimento Social de Inserção. Na altura a dar grande celeuma e grande oposição pelo CDS, de Direita, orientado por Paulo Portas, pela facilidade com que era atribuído a esmo e sem critério -chegando várias famílias, sobretudo de etnia cigana, inscrevendo-se em vários distritos, a acumular o subsídio.
Sem querer retirar totalmente o mérito da acção, creio que, por norma e excluindo os incapacitados, se continua mal. Um Estado, por princípio e em respeito a todos os cidadãos contribuintes ou não, nunca deveria atribuir absolutamente nada sem exigir contrapartidas.

O PROBLEMA É A PRÁTICA

A meu ver, é na forma de atribuir subsídios que verdadeiramente reside a linha divisora entre a Esquerda e a (verdadeira) Direita. A Esquerda, sempre disponível para doar sem olhar ao merecimento, nem que seja pelo facto de se nascer cidadão, não olha a encargos que endividam a Segurança Social e recaem sobre os restantes para dar sem olhar ao esforço para amealhar. A Direita, a verdadeira direita -não é a do PSD dos últimos vinte anos- está mais preocupada em aferrolhar e distribuir equitativamente e proporcionalmente ao mérito profissional de descontos apensos.
Aliás, os países do norte da Europa com o melhor estado de bem-estar do mundo, atribuem a todos os seus cidadãos várias prerrogativas sociais, nomeadamente na saúde, na justiça, na habitação e na Segurança Social, mas qualquer trabalhador desconta cerca de 50 por cento para acautelar o seu futuro.
Mesmo até o Reino Unido -que refere no comentário- já foi um bom país para redistribuir pelos mais necessitados. Pelo que leio, actualmente, está a restringir várias medidas de apoio social outrora conseguidas.
Não há volta a dar, meu caro anónimo. Só se deve (e pode) dar o que se tem. A teoria, em filosofia, é muito linda. O problema é o endividamento do Estado e a falência (anunciada) da Segurança Social que, numa escandalosa discriminação, está a sobrecarregar os mais velhos, aqueles que trabalharam toda a vida e não sabem se, pelo desvario dos governos, vão poder almejar uma reforma.


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2 comentários:

Anónimo disse...

Sr. Luis, obrigado pela longa explanação da história, teoria e prática da segurança social. Eu sou mais curtinho: segundo percebo, segurança social, sim, mas com contrapartidas. Que contrapartida deve exigir o Estado a uma mãe, com um filho, que ganha dois euros à hora como auxiliar de geriatria, a recibo verde e a descontar um mínimo de 60 euros de segurança social?

António

Anónimo disse...

Entretanto, após o último comentário, fui tomar café com um velho amigo que já foi vendedor de telecomunicações porta a porta, operador de call center e trabalha agora num centro de explicações, a ganhar o salário mínimo. Vive com a mulher e um filho em casa dos avós, porque ainda não conseguiram dinheiro para pagar casa. Que contrapartida é que deve este dar ao Estado, para se candidatar a um bairro camarário? Note que eu estou a tentar ser prático e arranjar uma qualquer norma no regulamento camarário da atribuição de habitação social, que preveja contrapartidas dos beneficiários.
António