Hoje
a Lusa, Agência de Notícias de Portugal, S.A., na pessoa do
jornalista João Gaspar, andou pela Baixa da cidade a recolher
depoimentos de vários comerciantes sobre a “anunciada” crise que
se abateu sobre as vendas no comércio tradicional nesta quadra de
Natal.
Naturalmente
que, por desconhecimento, não me vou debruçar sobre o que foi dito
pelos lojistas -vamos aguardar até amanhã para saber. O que sei é
que, pelo que converso com colegas, este ano de vendas e mais
concretamente nesta época, está-se a verificar uma situação nunca
vista -provavelmente pior do que aconteceu no período entre 2012 e
2013. Estamos a regredir.
Numa
curta análise, sem grande rigor, vou perorar sobre o que está
acontecer. Tendo em conta as notícias económicas recentes, de certa
maneira, não deverá ser uma completa surpresa. Ou seja, perante os
últimos dados do INE, Instituto Nacional de Estatística, do mês
passado que, face ao trimestre anterior, o PIB, Produto
Interno Bruto, cresceu 0,8% no terceiro trimestre deste ano. Em
comparação com o período homólogo de 2015, a riqueza produzida no
país cresceu 1,6. Afirmou ainda o INE que uma das razões é o
aumento das exportações -em detrimento das importações.
“O consumo privado também deu uma ‘perninha’, mas
em menor dimensão, graças a um aumento das compras de bens não
duradouros e serviços, enquanto que a venda de bens duradouros
desacelerou, o que ajuda a manter as importações a crescer menos
que as exportações neste período”. Por conseguinte, perante
o anunciado, é fácil de constatar que aumentou o consumo dos bens
não duradouros (que são destruídos após a utilização, como o
pão, a comida e as bebidas) e diminuiu o consumo dos duradouros,
como exemplo, electrodomésticos e automóveis e, embora não se faça
a divisão, pressupõem-se, que neste grupo estão incluídos
os semi-duradouros, como calçado e roupas.
Claro
que poderemos aventar que esta retracção no consumo dos bens
duradouros e semi-duradouros, por si só, não afecta somente o
retalho no comércio de rua mas também a economia de grande escala,
como as grandes superfícies. É verdade. Mas o que estamos assistir
nos últimos dois meses nas grandes áreas comerciais? Uma
agressividade brutal em descontos directos na venda de milhares de
produtos. Basta lembrar o “Black Friday”.
Se é certo que a pequena
loja de rua, em face das poucas vendas e para realizar caixa, lhe segue as pisadas, com descontos directos de 50 por cento, é também
facto que estamos perante uma ofensiva de destruição massiva do
pequeno comércio. Isto é, se os comerciantes, por necessidade
emergente, optam por vender sem lucro somente para realizar dinheiro
para fazer frente aos custos fixos e compromissos assumidos perante
fornecedores está de ver que o futuro, que é já no Ano Novo, de
aqui a poucos dias, vai ser uma tragédia.
Mas há outras premissas
a considerar para as poucas vendas de artigos tradicionais oferecidos
nesta fase do ano.
MUDANÇA
DE COSTUMES
Desde
há cerca de uma década que se verifica uma menor representatividade
do mês de dezembro no total de vendas do ano. Se nessa altura, há
cerca de dez anos, já só se sentia o espírito de Natal nas vendas
na última quinzena, nos anos mais recentes foi diminuindo,
diminuindo, até só ficar pelos três últimos dias, como foi o caso
do ano passado. E a este comportamento do consumidor não serão
alheios dois factores: o fraco rendimento disponível das famílias e
a mudança de costumes.
Tenho para mim que apesar
da reposição de subsídios deste Governo em alguns cortes
realizados pelo executivo PSD-CDS de Portas e Passos Coelho estas
alterações foram mais psicológicas que reais. No concreto não
teriam tido qualquer efeito prático na economia. A ter tido, e
fazendo fé no estudo do INE, teria sido repercutido numa melhor
alimentação das famílias portuguesas. Continuamos sem grande
margem para grandes compras que possam alavancar o comércio interno.
A pergunta que se poderá fazer é quem vai dar trabalho aos milhares
de desempregados que, a ser certo, se adivinha no desemprego no
comércio. Que já não diz respeito apenas a funcionários mas
também a empresários que, diariamente, passam para a barra dos
necessitados -processo em curso que nunca, como até agora, se
assistiu em tão grande número. É o anátema do vencido.
Por
outro lado, há uma evidente mudança de costumes da população
portuguesa. Se os mais idosos ainda continuam a frequentar a loja
física e a oferecer nesta quadra roupas, sapatos e artigos
decorativos aos mesmos pares, como quem diz aos mais velhos, já nas
oferendas destinadas aos mais novos, filhos e netos, mudaram para
artigos das novas tecnologias.
Há ainda outro pormenor
não menos importante neste cliente clássico: para além de querer
originalidade no que dá, quer gastar meia-dúzia de euros. E esta
queda do orçamento nas compras está a ser fatal para o comércio em
geral. Estamos a assistir ao funeral, ao folclore e à indiferença.
Quanto
aos mais novos a adquirem prendas para os mais velhos, para além de,
igualmente, procurarem obsessivamente algo pouco visto e que custe
pouco, provavelmente, uma maioria opta pelo comércio online -a meu
ver, esta é a verdadeira ameaça que surge do éter e que,
naturalmente, vai arrumar também a grande superfície. São os tempos que vivemos.
A contribuir para uma
procura rarefeita, penso, também contribui muito a oferta
desmesurada em todos os géneros. Os bens de consumo, comparando com outros
tempos, pelo embaratecimento, fácil aquisição e emergência a grande velocidade de
novos produtos, perderam o desejo de obtenção num cliente cada vez
mais exigente e que, como criança que tudo tem, fácil e rapidamente
se enfastia da novidade. Estamos na era do descartável. Entrámos num movimento contínuo de desvalorização das coisas. Esta overdose de oferta, como se
adivinha, não vai trazer nada de bom para o comércio. A marcha lenta continua. Vá-se lá perceber a Economia Nacional!?! Mas os economistas terão mesmo explicação para o que está a acontecer?
O
QUE É QUE PASSOU DE MODA?
Volto
a repetir a falta de rigor desta informação, estou em crer que
neste Natal, comparando com anos anteriores, poucos livros em papel
serão colocados no sapatinho; perfumes idem aspas; roupas; calçado;
brinquedos; objectos em ouro, prata e jóias. Não haverá qualquer dúvida de que a prenda tradicional comprada nesta altura do ano passou de moda. No caso do ouro perdeu completamente a atracção que lhe dava vida. Devido aos aumentos abruptos ocorridos há cerca de cinco anos e que levou muitos portugueses a desfazerem-se deste metal precioso por necessidade por meia dúzia de patacos -quando julgavam ser um pé-de-meia seguro-, mostrou uma realidade de ilusão nunca até aí constatada. Por outro lado, pela insegurança que se vive, o ouro passou a ser unicamente uma amante de luxo para quem pode.
E ainda, já só os mais velhos continuam a fazer a representação do presépio nas casas portuguesas. É como se a magia do Natal se tivesse esgotado, houvesse um endurecimento no homem, perdendo a capacidade de sonhar, se tornasse mais pragmático e menos nefelibata (que se esquiva da realidade e anda nas nuvens), e em seu lugar tivesse implantado uma nova filosofia.
E ainda, já só os mais velhos continuam a fazer a representação do presépio nas casas portuguesas. É como se a magia do Natal se tivesse esgotado, houvesse um endurecimento no homem, perdendo a capacidade de sonhar, se tornasse mais pragmático e menos nefelibata (que se esquiva da realidade e anda nas nuvens), e em seu lugar tivesse implantado uma nova filosofia.
1 comentário:
Senhor Luis Fernandes, alguma coisa aqui não bate certo, porque efectivamente o consumo está a subir, coisa natural, pois muitos rendimentos perdidos foram repostos, como se sabe. A Baixa de Coimbra tem problemas específicos, e não serve de barómetro para os índices de consumo do país, e mesmo da nossa cidade. Se for perguntar nos centros comerciais, onde agora as pessoas escolhem comprar, a opinião dos comerciantes já será diferente. Também ao que dizem as estatísticas, as insolvências estão a descer. Mais uma vez, não se pode tomar a Baixa de Coimbra pelo todo e mesmo na Baixa, deve diferenciar-se a “baixinha” do canal Ferreira Borges-Visconde da Luz.
António
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