No
dia 1 de Outubro, último, descrevi aqui em palavras a angústia do
José António Ferreira da Costa. Durante décadas foi arrumador de
automóveis na margem esquerda. Estou convencido que é conhecido por
mais de dois terços dos habitantes da cidade de Coimbra. Durante mais de vinte
anos, a troco de uma moeda doada voluntariamente, ajudou muitas
pessoas a encaixar a sua viatura num lugar seguro e à sua guarda.
Relembrando
o artigo que escrevi, no ano passado, em Setembro de 2015, quando as
folhas começavam a amarelecer e a se desprenderem das árvores, numa
das vezes que nos encontrámos, contou-me que, através do Instituto
de Emprego e Formação Profissional (IEFP), se tinha candidatado a
um concurso para técnico de profundidade, vulgo coveiro,
promovido pela Câmara Municipal de Coimbra, que tinha sido
seleccionado, e já estava a trabalhar no Cemitério da Conchada.
Parecia irradiar felicidade. Pensei para comigo como, contrariando a
precariedade e a insegurança do rendimento, um trabalho garantido
pode constituir o fermento para uma boa cozedura no futuro de cada um
de nós.
Então
em Outubro, último, o Ferreira, trémulo e ansioso, carregando no
rosto o desespero de desempregado, veio pedir auxílio: “Depois
de um ano a trabalhar no Cemitério da Conchada, por conta de um
contrato estabelecido entre os Recursos Humanos, da Câmara
Municipal, e o IEFP, sem que nada o fizesse prever, mandaram-me
embora. O meu vínculo contratual era através de um POC, Programa
Ocupacional, do desemprego. Anteriormente ouvi o engenheiro dizer ao
encarregado que o contrato era para revalidar se eu me portasse bem.
Como eu precisava deste trabalho como pão para a boca, é claro que
fiz tudo para cumprir. Estava convencido que era para continuar. Sem
uma palavra de despedida, no dia 31 de Agosto, no último dia do
contrato, o encarregado ordenou apenas que deixasse o fardamento, e
mais nada! À minha pergunta se o que estavam a fazer estava
correcto, o mestre respondeu que, embora não entendesse a medida do
superior hierárquico, estava a cumprir ordens. Tinham falta de
pessoal. Este despedimento não fazia sentido, disse-me o encarregado
à laia de despedida, sem abraços nem palavras de incentivo. Não
lhe disse mais nada. Valia de alguma coisa? Que lhe importava a ele
ou ao superior se eu, sem aquele ordenado de 508,00 euros, ficava
literalmente na miséria? Se eu lhes dissesse que sem a minha
mensalidade o único rendimento que passa a entrar no meu lar é o da
minha mulher, que ganha cerca de 450 euros, iriam perder o sono? Se
eu mostrasse o meu recibo da renda de 300,00 euros, quereriam eles
saber disso? Se eu contasse que agora não tenho direito a qualquer
subsídio e estou a passar mal?”
De
pouco valeu eu ter escrito este texto. Até hoje o Ferreira da Costa,
como náufrago, continua à procura de um apoio que lhe permita
sobreviver e viver com dignidade neste mar encapelado. De lágrimas
nos olhos, muito mais tristonho e acinzentado, hoje veio novamente
pedir ajuda. Já foi a dezenas de empresas, já foi a recursos
humanos de várias instituições e em todas lhe é transmitido o
seguinte: “como o senhor não está a receber pelo IEFP, Instituto
de Emprego e Formação Profissional,
não o poderemos admitir”.
Faz
sentido esta prerrogativa? Se o Costa está inscrito não deveria
bastar? Quer dizer, ele, que nada tem -nem sequer dinheiro para ir de
autocarro a uma entrevista nos arrabaldes da cidade- fica atrás dos
que têm alguma coisa? Não recebendo subsídio de desemprego ou
Rendimento Mínimo Garantido (RSI) não deveria ser colocado à
frente?
O
que roga o José António? Pede bens alimentares? Pede roupa? Pede
uma casa à Câmara Municipal? Não! O Costa pede trabalho. O Costa
quer trabalhar para poder manter a família -nas entrelinhas entendi
que se não conseguir emprego a desunião está em marcha.
Nesta
quadra de Natal, como em anos anteriores, onde a hipocrisia reina em
dádivas de sacola que servem para humilhar quem recebe e lavar a alma
de quem dá, para quem precisa e quer trabalhar não há benevolência
nem humanidade. Em silogismo, é como se a sociedade estivesse mais
interessada em manter os pobres “ad eternum” no mesmo
patamar de miséria.
Retirando
as minhas bacocas análises de circunstância, e escrevo para si,
leitor, que me lê neste momento: se você pode, de algum modo nem
que seja com informação, ajudar o José Costa, por que não o faz?
O que é que fez de solidário neste Natal? Que tipo de humanismo
carrega você nesse seu coração? Ajude o Costa, porra!
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