(Imagem de Leonardo Braga pinheiro)
Durante mais de quatro décadas foi um comerciante
muito reconhecido na Baixa. Como muitos negociantes, devido a vários factores
de más opções e conjuntura, encerrou há dois anos por insolvência. Uma vida de
trabalho que se finava numa declaração. Hoje, sem qualquer outro rendimento
além da reforma, sobreviverá dividido entre a culpa do falhanço e o desespero
de se ver na ruína. O prédio onde exercia foi colocado à venda no site de uma
imobiliária da cidade e com um valor fixo.
Evaristo –nome truncado-, hoteleiro na Baixa,
interessado em adquirir um imóvel nesta zona, há cerca de um ano, vendo a
imagem do prédio na Internet para venda, telefonou para o número indicado a
solicitar que lhe fosse mostrado o bem. Entre um certo remoer na resposta do
outro lado do encarregue da venda, pareceu a Evaristo que não havia grande
interesse em alienar o casa. A verdade é que o representante da Imobiliária
nunca mais contactou o candidato à compra para mostrar a residência e comércio.
Há cerca de meio-ano Evaristo insistiu: “então
nunca mais me disse nada?”. Do outro lado ouviu por resposta: “sabe?, é que já temos uma oferta pelo valor
anunciado”. E entre um certo arrastar de palavras, Evaristo intuiu que
havia uma certa intenção em desmotivar.
Passado um tempo, como o anúncio continuasse
na Internet, ligou uma terceira vez para o mesmo vendedor. Ouviu a seguinte argumentação:
“as propostas já estão todas na mão do
juiz. Quando for atribuído, o anúncio na Internet será retirado.”
Há cerca de quatro meses, vendo uma fotografia
de um outro prédio na Baixa e a ser alienado pela mesma empresa, Evaristo
telefonou para o número indicado e a manifestar interesse em visitar o interior
do prédio. Do outro lado, “ai, sabe, há
lá uns problemas com herdeiros, aquilo está muito embrulhado. Depois se vê!”. Nunca
mais o vendedor contactou o provável interessado.
Há dias Evaristo reparou que o primeiro
prédio, do comerciante falido, e o segundo edifício na zona já não constam no
site digital de vendas.
Evaristo, homem pacato e de bem,
que mal não quer mal não pensa, não pára de cogitar que poderá haver cambalacho
na negociata. Alegadamente, alguém se está a aproveitar da desgraça alheia.
REGRAS CLARAS, POR
FAVOR
Apesar da reforma executiva ter sido há poucos
anos, está de ver que a forma actual de se publicitarem os bens arrestados por
dívidas é tudo menos clara e, no mínimo, gera suspeitas de tramoias e
enriquecimento sem causa.
E COMO É QUE DEVERIA
SER?
Tenho para mim que, quando uma venda é “forçada” por questões de dívidas, o
Estado deveria ser mais severo e impor regras de modo a salvaguardar o máximo
os interesses do executado.
Nestes casos de vendas através da Internet e
tratando-se de execuções deveriam ser seguidos os seguintes passos:
-Colocar o bem à venda sempre em leilão –sujeito
à obrigatoriedade de a oferta ser por escrito e dirigida em carta registada com
aviso de recepção ao juiz do processo;
-Durante o prazo de venda, o preço oferecido
deveria ser actualizado diariamente;
-Contrariamente ao que se está a fazer, nunca
atribuir um preço único ao bem anunciado sem permitir a licitação por
interessados;
-Depois da consumação da venda, na atribuição,
o preço final deveria constar no anúncio e manter-se online durante 30 dias para permitir a fiscalização dos
concorrentes e subsequente impugnação.
Não é ilícito alguém enriquecer à custa de outro
desde que os meios utilizados sejam claros e legais. O que é escandaloso e
imoral –no caso de se provar- é alguém, que já terá muito e pouco precisa, espezinhar
alguém que trabalhou a vida inteira e está no chão e não se pode defender.
Em nome da justiça, pelos valores da cidadania, investigue-se.
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