sexta-feira, 13 de setembro de 2013

O EGOÍSMO TRADICIONAL



 Esta “estória” começa assim: tive conhecimento que no fim deste mês de Setembro vai encerrar uma das mais antigas lojas tradicionais da Baixa de Coimbra. Situada numa rua estreita, este antigo estabelecimento terá cerca de oito décadas de existência. Embora nos últimos anos se defendesse em têxteis variados, o seu forte ao longo do último século foi as fazendas a metro. Na sua frontaria, identificativo de uma época e a lembrar as lojas de Marrocos, conserva os tecidos estendidos ao longo do seu toldo. Lá dentro são visíveis os balcões e prateleiras de madeira que, se estivéssemos numa sociedade com memória e mais interessada em preservar o passado, deveriam ser guardados para um futuro museu, ou, no mínimo, conservá-los para colocar num espaço onde as crianças e alunos tivessem contacto com uma realidade que desaparece a olhos fechados. Este será, porventura, o último exemplo vivo de um comércio tradicional que todos os dias morre um pouco pela apatia de quem manda e, acima de tudo pelo desinteresse de quem está a aguentar-se mal, não reclama não dá um ai a pedir socorro, e de quem parte, de quem desiste da actividade, como que envergonhado, com o rabo entre pernas, e com o seu silêncio a pedir desculpa por ter existido no universo comercial.
Sabendo do valor patrimonial e museológico deste vetusto e histórico ponto de venda, e o quanto significa o seu desaparecimento na paisagem urbana da Baixa da cidade, fui ao encontro dos donos a pedir-lhe umas palavras para uma crónica de “últimos dias”. “Não senhor, não queremos falar disto. Fechamos e mais nada!” –argumentaram em duo. E umas fotos ao interior, para memória futura, para que fique registado, posso tirar? Interroguei. “Não senhor! Não queremos. Venha cá depois do fim do mês, que ainda vamos estar por aí a tratar de umas coisas, e depois fotografa”. De pouco me valeu insistir que as fotos valiam como documento, como amostragem corriqueira de um dia-a-dia normalíssimo. “Não senhor, venha depois de encerrarmos ao público. Isso não interessa nada. Não precisamos de publicidade”. 
Tenho de confessar, perante certos egocentrismos não me controlo. Fico fora de mim. E foi o que aconteceu. Puxei da culatra argumentativa e disparei: é por isto mesmo, por esta vossa posição de nunca darem a cara, que o comércio tradicional está como está. É pela vossa forma de estar, egoísta e conformada, aceitando a morte como uma inevitabilidade e sem um queixume que ninguém se importa com o que está acontecer. Já pensaram que umas simples palavras de testemunho, agora que estão de partida, podem fazer toda a diferença para quem fica? E sobretudo o vosso depoimento é muito importante para quem manda -pensemos que sim! Para que quem governa a cidade saiba que terá de se fazer alguma coisa para evitar este morticínio patente ao nosso olhar. Respondeu um deles: “ai sim, e o que é que vocês fizeram para evitar que fechássemos?”

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