O Diário as Beiras de hoje, na segunda página,
anuncia que “pelo menos oito viaturas
foram vandalizadas na madrugada de terça-feira, na rua de Aveiro, em Coimbra.
PSP recebeu queixas. Em todos estes carros, o vidro do para-brisas foi partido
sem que tenha havido um motivo para tal.”
Nos últimos anos, talvez seguindo a tendência
nacional, a cidade tem sido alvo de vários atentados ao património e sem que
esta onda crescente tire o sono às autoridades responsáveis. Sabendo todos que
estes comportamentos, quando não penalizados atempadamente a montante, na
origem, pela sensação de impunidade, geram simpatia, isto é, a inacção policial
é um convite à repetição. Então, pela assiduidade, o que se verifica é que,
contrariando o assunto em questão, raramente uma devastação de bens é notícia. Basta
visitar o Jardim da Sereia para concluir que não iremos longe com este laxismo.
Segundo o lamento de vários
moradores no bairro alto da cidade, na zona da Sé Velha, a destruição de automóveis
durante a noite, por energúmenos, é lana caprina.
Descendo um pouco, na Rua Corpo de Deus a mesma coisa. Na Baixa idem aspas,
aspas. Rara é a semana que não me chegam desabafos de moradores a referirem
terem sido os seus automóveis vandalizados. Tanto quanto sei, na maioria dos casos, já não
apresentam queixa na PSP. À indignação subjaz um sentimento de conformismo que quebra qualquer revolta. A
sua argumentação –e quanto a mim, é compreensível- é que dar conta da ocorrência
na PSP só serve para as estatísticas. O resultado é perder tempo e o final
é sempre o arquivamento sem conclusões atribuídas.
O INALIENÁVEL SER
PESSOA
Antes de prosseguir vou fazer uma deriva. Se é
certo que a segurança se divide em dois binómios, pessoas e bens, é certo
também que nas últimas décadas os governos nacionais optaram claramente pela garantia
da pessoa, enquanto individualidade e sujeito de direitos, que, no seu percurso
de vida e até atingir a meia-idade é gerador de rendimento. Depois, deixando de
ser útil, atingindo a aposentação, passando a ser um peso económico, é abandonado
e entregue à sua sorte como se nunca tivesse concorrido para a riqueza nacional.
PASSAR A BOLA, DEIXAR
ARDER E CONFISCAR
Deixando os bens entregues aos proprietários e
desonerando-se da sua segurança, que implica a sua defesa –incentivando a
proliferação de empresas de segurança privada e obrigando à instalação de
câmaras de vídeo-vigilância-, desincentivando a mão-de-obra humana no emprego
de agentes, no desamparo, contribui declaradamente para a desvalorização do
património, quer privado, quer público. Com uma legislação confusa e a convidar para o incumprimento por parte do cidadão, estes governos parecem apenas obsessivamente
interessados em criar novos impostos. O empresário e o trabalhador por conta de
outrem são cada vez mais entes desmotivados em busca de uma esperança perdida e
um número no mundo vazio da cibernética. Veja-se, por exemplo, a obrigação de
cursos para quem manusear pesticidas na agricultura. Com um custo médio de uma
centena de euros, quem tiver um pequeno quintal com meia dúzia de árvores,
seguindo a lógica, o que vai fazer? E a nova legislação para os estabelecimentos
de compra e venda de metais preciosos e gemológicos? Até se pode conceber que,
por parte das governações, há um excesso de zelo pela segurança das pessoas,
mas é puro engano. Procura-se, simplesmente, gerar receita. E se assim não
fosse, como entender, agora, com entrada em vigor este mês, de todos os
operadores que trabalhem com crianças, privados e públicos, estarem obrigados a
apresentar na entidade empregadora, anualmente, uma cópia do registo criminal, que, no
mínimo, custa cinco euros? É fácil de fazer as contas, quantos milhares de euros, em renda, vai gerar esta medida?
A PROPRIEDADE PERDIDA E
A DESMOTIVAÇÃO
Em contradição absoluta com o inalienável
direito à propriedade instituído pela Revolução Francesa de 1789, a posse, pelo
constante gerar de obrigações labirínticas que conduzem a um aumento
desmesurado de coimas e multas, tem vindo a ser atacada na sua essência e a
conduzir à desmotivação geral. Pode até interrogar-se: o que se pretende para o
futuro de Portugal? Se quem trabalha é atacado ferozmente, será que há uma
intenção deliberada de gerar uma nova geração de incapazes?
A DESTRUIÇÃO COMO FORÇA
REGENERADORA
Voltando atrás, escolheu-se o dano pessoal porque,
obrigando a sua cobertura através das seguradoras, é mais fácil de passar para
outro a assunção dos custos ao lesado. Por outro lado, politicamente, invocando
os direitos humanos –e dos animais- é mais saliente num eleitor mais receptivo
a novas questões humanitárias, ao ser, e que, progressivamente, despreza o ter.
A possibilidade de substituição de agentes policiais por câmaras de vigilância,
leva a uma enormíssima poupança de meios financeiros para o país. O Estado é
cada vez mais uma supra-entidade de direitos, cujo saque de confisco é notório,
e poucas obrigações a favor e para o cidadão.
Por outro lado, uma destruição de
um bem é sempre um acto económico regenerador. Pela necessária substituição vai
criar trabalho e originar mais impostos. Logo, em imaginação, sendo parte
interessada é de supor que ao Estado, enquanto organização política que tem por
fim um objectivo egoísta, só interessa gerar receita a qualquer custo, e, por
isso mesmo, deixa correr o marfim. Arrase-se quanto mais melhor. À tristeza de
uns, lesados, segue-se a alegria de muitos mais.
O património é cada vez mais um
ónus para o seu possuidor. É de supor que, perante a acentuada desvalorização das coisas e dificuldade de obtenção de rendimentos das famílias, o Estado se
torne, a cada dia que passa, um abastado dono disto tudo –o que, em
especulação, poderemos supor que, por um lado, estaremos a caminhar para um previsível
sistema económico centralizado.
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