(Imagem de Leonardo Braga Pinheiro)
A RTP, através do programa “Sexta às 9”, a pedido de um grupo de
comerciantes que acompanhou e solicitou apoio para o Paulo Simões, vai fazer
uma reportagem sobre o Decreto-lei fantasma 12/2013 –lei que, a partir de Janeiro de 2015, estabeleceu o regime jurídico de protecção social na
eventualidade de desemprego dos trabalhadores independentes mas, por trafulhice
superior, até agora não foi aplicada. A captação de imagens estará a cargo do
jornalista João Ricardo Vasconcelos e serão gravadas nos primeiros dias de
Janeiro.
Para melhor ilustrar a débil situação
financeira dos visados, são necessários três testemunhos. Se for caso disso, os
depoimentos podem ser com voz distorcida e imagem em câmara escura. Conforme já
escrevi várias vezes, num altruísmo de salientar, um já temos: o próprio Paulo
Simões –que num extraordinário acto de abnegada coragem aceitou ser a cara, o
mártir que pode desencadear o virar de página desta infame e escandalosa discriminação
entre cidadãos. Acontece que, após vários contactos com ex-comerciantes que
entraram em decadência económica, está a ser tremendamente difícil de conseguir
as suas declarações. Ainda hoje de manhã, mais uma vez, falei com um ex-lojista
que entrou em desgraça. Atente-se nas suas explicações: “Lamento, senhor Luís, mas não quero mais mexer nesse assunto. É uma
passagem negra da minha vida que pretendo esquecer. Estive internado. Desfiz a
minha família. Desgracei a minha vida. Desculpe, mas, mesmo ocultando a minha
identidade, não quero mais falar disso!”
De pouco valeu apelar à cidadania
e o quanto o seu testemunho pode ser fundamental para dar a volta a esta
situação vergonhosa e atentatória aos mais elementares princípios da dignidade
humana.
Vou tentar analisar este comportamento sob
dois prismas: o visível e o invisível. No primeiro, no visível, olhando a frio,
do ponto de vista racional estamos, ou não, perante uma cobardia? Um egoísmo,
uma falta de generosidade e solidariedade para quem, na mesma classe
profissional, ainda não caiu mas está à beira do abismo? Não me pronuncio,
deixo a resposta a cada um que ler esta crónica.
Sob o ângulo invisível, começo
por escrever que, historicamente e nos nossos dias, a sociedade sempre manifestou
o mesmo comportamento: enaltecer o vencedor até ao espasmo e desprezar o vencido
até ao ostracismo. Para estender a passadeira vermelha ao triunfante basta
apenas que o seu império seja para além do horizonte. Pouco importa se a sua
riqueza foi conseguida a pisar carne humana e regada com lágrimas de sangue vermelho de
muitos. O que interessa mesmo é que a sua posição social esteja acima da média
e, em caso de necessidade, possa garantir um apoio ao que está abaixo da
bitola.
Ora, por silogismo, poderemos
pensar que os governos seguem a mesma linha. Para os empresários que tentaram e
conseguiram romper as malhas da pobreza e até atingiram o cume mas, devido a
vários factores, sobretudo de conjuntura, caíram, num exemplo deplorável, os
executivos, como a condená-los pelo falhanço, abandonam-nos à sua sorte. Tantas
vezes concorrendo para empurrar o investidor para a insolvência, quer por permitir concorrência
selvática, quer por impor impostos de confisco. Poderemos ser levados a pensar que, de
certo modo e tomando em conta alguns apoios ao investimento a montante, até
parece que este desamparo a jusante surge como um castigo. Em ilação é como se
dissessem: falhaste? Agora tens de
percorrer o caminho de pedras! Aguenta-te!
O problema maior é que esta forma
de encarar o insucesso tem custos demasiado enormes para a colectividade. Basta
ver o número de suicídios ocorridos no país nos últimos quatro anos. Em Coimbra
foram vários. Se bem que acoplados, e na subsequência de dificuldades, estivessem sempre problemas de saúde, em boa verdade nunca se saberá o que fez pender a
vontade para colocar termo à vida.
Talvez valha a pena pensar que, de igual modo
ao bem-sucedido, por uma questão de respeito, deveríamos ovacionar também quem
arriscou tudo e perdeu. É uma questão de bom-senso.
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