Pelo anúncio necrológico da realização da
missa do sétimo dia colado em várias esquinas da Baixa, só hoje me apercebi do
desaparecimento do António Rocha. Embora uma semana depois do seu funeral,
nunca será despropósito pelo mérito do finado, não posso deixar de fazer aqui o
seu elogio fúnebre.
Durante décadas e até há cerca quinze anos, como
vigilante numa guarita, exerceu a profissão de sapateiro na entrada de um
prédio, no número 13, na Rua da Fornalhinha. O Senhor Rocha, como era assim
tratado, foi, durante muitos anos, o espírito vivo, de alegria e convivência, da
curta artéria transversal à Rua Eduardo Coelho. Era uma boa pessoa, simpático e
amigo do seu amigo.
Era um homem de compleição baixa
e anafado. Curiosamente, o que retenho mais na memória era a sua voz palheta,
meio arrastada, e um humor sibilino estampado num sorriso escancarado. Depois do encerramento da sua pequena
oficina de arranjo de sapatos aquela pequena ruela nunca mais foi a mesma. Não
deixa de nos fazer pensar como a partida de alguém pode contribuir para o
definhamento de uma zona da cidade. Prestadores de serviços como ele marcaram
uma época da Baixa que não voltará mais. São samurais que deram tudo e partem sem mérito e sem glória. Por ele e outros, juntamente com alguns
comerciantes também já desaparecidos como o Magalhães, compus esta canção em
sua honra: Hino à cidade perdida.
Onde quer que esteja agora o
espírito do senhor Rocha, em nome de tantos que o conheceram, em nome da Baixa,
se posso escrever assim, que descanse em paz. Para a família enlutada, pela dor
causada pela morte do seu ente querido, os nossos sentidos pêsames e um grande
abraço de solidariedade.
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