quarta-feira, 20 de julho de 2016

EDITORIAL: O VAI E VEM DA INSEGURANÇA





Este blogue foi criado em 2007. Com quase uma dezena de anos, e a raiar o milhão de leitores, é feito na completa carolice do editor, que, por acaso sou eu. É um sítio da Internet sem grandes ambições. Não se fazem grandes coisas para a sua promoção. Actualmente, em média semanal, tem 500 visitas diárias. Sem escala hierárquica, nasceu pela minha intrínseca necessidade de escrever; pela necessidade de intervir na zona onde estou inserido; pela necessidade de contar histórias do homem comum; pela necessidade de relatar os acontecimentos a frio, na subjectividade, sem ter de agradar a alguém; pela necessidade de falar de assuntos comezinhos que normalmente passam ao lado da imprensa local; pela necessidade de usar a escrita como catarse, como desabafo, para acalmar os demónios que me consomem o interior. Tenho necessidade de explanar o meu pensamento. Também não ficará mal dizer que, provavelmente, também pela necessidade de protagonismo. Como se vê, demasiadas necessidades para um homem só e para deixar de continuar a escrever, apesar de cada vez mais desmotivado.
Talvez também por achar que a nossa imprensa escrita local -devido à conjuntura económica e revolução no sector- está cada vez mais afastada e enviesada. Prejudicando o leitor diário, escreve cada vez mais para agradar a um certo poder instalado. O futuro deste calcorrear caminho em pezinhos de lã, perdendo o seu legítimo direito/obrigação de intervir na sociedade, denunciando arbitrariedades, não pode trazer grandes benesses para o fosso da desigualdade crescente.
Desde os primeiros tempos, o blogue teve sempre três géneros distintos de leitores. Um, é aquele que se move por saber notícias descomprometidas da Baixa. Tenho visitantes no mundo inteiro, na diáspora, desde a China à Austrália. Outro, constituído pelas instituições, é aquele que lê somente por obrigação, no fundo, para estar a par de assuntos que, na sua resolução, são da sua competência. Outro ainda, é o constituído por um grupo de comerciantes, colegas, que detestam a minha forma de estar na Baixa. Se eles pudessem, há muito tempo que este blogue estava arrumado. Este grupo tem uma ideia formatada de que, por exemplo, ao noticiar sobretudo os assaltos estou a “destruir” a Baixa. Desde os primórdios do blogue que sou acusado de promover a desclassificação da Zona Histórica. Entendem que ao publicitar assuntos pouco agradáveis estou a espalhar ao mundo que esta área é insegura. Reconheço que das várias premissas extraídas aquela é uma delas. Mas como é que se faz a triagem? Quem como eu escreve sabe que estamos obrigados a relatar o bom e o mau. E porquê? Porque o que é mau para uns poderá ser bom para outros. Quem escreve com honestidade, sem interesse partidário, está somente sujeito à verdade e ao leitor, que é o primus da existência do escritor.
O tempo veio sempre a dar-me razão. Quando estes comerciantes são assaltados são os primeiros a gritar “Ó DA GUARDA”! Aconteceu assim em 2008/2009/2010, quando uma vaga de assaltos varreu a Baixa e esteve na origem da implantação das câmaras de video-vigilância -que foram uma espécie de barriga de aluguer para suster a criminalidade que assolava esta parte da cidade. Depois de milhares de euros aplicados, nunca funcionaram em pleno e em direcção ao objecto que se propunham. Tanto quanto tive conhecimento, apenas uma vez deram origem à prevenção e os assaltantes foram presos no local por acção das imagens visionadas. Num procedimento egoísta estes lojistas, sem levar em conta a situação económica do lesado, procuram abafar o incidente, o grito individual para não prejudicar o colectivo.
Por outro lado, a contribuir para a ignorância dos factos, muitos dos ofendidos, para evitar passos inúteis que conduzem normalmente ao arquivamento, não comunicam as ocorrências à PSP e, como é óbvio, o que não é transmitido por queixa escrita, logo, não existe. Ou seja, as polícias trabalham com estatística e, pelos chefes, o maior gozo que lhes podem dar é mostrarem os baixos valores casuísticos numa colectividade urbana, numa mistura de facto político e princípio da segurança -para não levar ao alarme social e à imitação da criminalística.
Diz-me a experiência, a questão é que se ocultarmos os episódios de violência contra o património a PSP não age. Repito, isto mesmo aconteceu no período citado de 2008/2009. Volto a lembrar que, na altura, a violência urbana foi sustida e as coisas acalmaram pelo clamor gerado e também porque se “obrigou" as autoridades a agir em conformidade. O “gangue” acabou preso pela PSP -e com isto não se pense que estou a desvalorizar o trabalho árduo deste corpo de polícia pública.
Isto tudo para, por um lado, para explicar a razão de eu, quase como missão, dar nota de todas as ocorrências criminais e outras que se passam na Baixa -pelo menos as que tenho conhecimento. Por outro para dizer que depois de um certo período de acalmia -isto é cíclico, como se sabe-, progressivamente, sem querer ser alarmista, estão a acontecer demasiados assaltos na Baixa nos últimos tempos.
Naturalmente não tenho dados que me permitam consubstanciar a minha análise, mas, lendo os jornais diários em que se noticiam várias apreensões de droga nesta área da cidade dá para ver que a toxicodependência está a aumentar por aqui. Há dias, quando conversava com uma amiga ligada a instituições de apoio à toxico-dependência sobre o aglomerado de viciados concentrados e a injectarem-se à vista de todos junto à Loja do Cidadão, dizia-me ela: “sabe, tem havido uma preocupação enorme em encerrar becos junto à Rua Direita para impedir o acesso dos dependentes de drogas. E com as obras do Terreiro da Erva a mesma coisa. O resultado é que não havendo espaços mais recatados eles são obrigados a vir para a frente dos olhos de todos. E lembre-se, se mandarem embora as instituições de apoio a estes párias -como parece ser intenção do presidente da Câmara Municipal, Manuel Machado, vocês, comerciantes, preparem-se para o pior. É uma falácia pensar que transferindo os serviços para outra zona da cidade os toxicodependentes vão atrás.

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