O
nosso prestigiado e reconhecido colega das lides comerciais, Manuel
Mendes, com três estabelecimentos com o mesmo nome na Praça do
Comércio e outro na Rua dos Combatentes, o Kilo Americano, todos
dedicados à decoração para o lar, comemorou ontem 87 anos. Muitos
parabéns! Se posso escrever assim, são os desejos de todos os
comerciantes da Baixa de Coimbra.
Nascido
em 1931 numa família de cinco filhos onde o bichinho do comércio
era o sangue que corria nas veias e artérias e alimentava o coração
da prole, nem o facto de a economia mundial se encontrar em profunda
depressão – originada pelo “crash da bolsa”, em que os
valores cotados na Bolsa de Nova Iorque caíram a pique e, com essa
queda abrupta, ter desencadeado uma crise mundial – levou a que o
velho Mendes, o progenitor do agora homenageado, deixasse de
incentivar o seu rebento a seguir as suas pisadas logo a seguir aos
estudos básicos.
Decorria
o ano de 1946 quando, com 15 anos de idade, começou a trabalhar no
número 99 da antiga praça velha, no estabelecimento familiar.
Quis
o destino que seu pai, o timoneiro do negócio, adoecesse
precocemente e, por este facto anómalo, fosse empurrado ainda novo
para o leme do barco mercantil. Apesar dos tempos difíceis que se
viviam em Portugal, sobretudo com o rebentamento da guerra nas
ex-colónias, o jovem Mendes, então com 33 anos, sonhador e com
grande sensibilidade para a nobre arte de negociar, balouçava entre
atirar-se para novos projectos na área do desporto ou na decoração
de interiores. Como o gosto pela segunda tocava mais fundo e era uma
paixão, acabou por enveredar num longo caminho que até hoje, apesar
das dificuldades que todo o comércio a retalho atravessa, ainda não
se arrependeu.
O
COMÉRCIO TRADICIONAL VISTO PELO OLHAR DE UM VETERANO
“As
grandes superfícies comerciais são as grande causadoras da morte da
decoração de interiores e de vários ramos do comércio
tradicional. Prometem muitos empregos mas depois vê-se que
não é assim. O grande empregador foi sempre o comércio
tradicional” - enfatiza Manuel Mendes numa conversa que, pelo
gosto em ouvir, me deu muito prazer.
Você
já viu o Leroy (Merlin)? Tem tudo! Não é barato! Tem é mais
quantidade que qualquer loja. Tem stocks brutais!
O
comércio está muito enfraquecido! Os comerciantes, no geral,
perderam a capacidade financeira. O comerciante está desmotivado e
afogado em dívidas. O comércio de rua continua a perder qualidades.
Hoje a concorrência está em roda livre. Estamos subjugados ao
grande capital Global. O pequeno comerciante não pode competir.
E
COMO VÊ A BAIXA, SENHOR MENDES?
Vejo
o futuro da Baixa muito complicado. Um dos muitos problemas é o
estacionamento a pagar, porque afasta os clientes. Outro ainda foi a
saída das lojas-âncora da zona histórica.
Para
a Câmara Municipal de Coimbra o comércio não tem qualquer registo
de importância.
A
Agência para a Promoção da Baixa de Coimbra tem feito um bom
trabalho para trazer pessoas para a Baixa, mas para o comércio,
especificamente, traz pouco retorno.
O
metro ligeiro de superfície é fundamental para o desenvolvimento da
Baixa. Estou muito esperançado. Se for concretizado, vai haver uma
mudança muito grande nesta zona.
Para
inverter a actual situação é preciso haver menos casas abertas mas
de melhor qualidade - e aqui estou a incluir o comércio e a
indústria hoteleira. A maioria não tem qualidade.
Por
outro lado, há uns anos falei com o engenheiro Craveiro (João
Paulo Craveiro) e ele defendia uma tese que eu não
concordei. Dizia o engenheiro que, devido ao facto de algumas ruas
serem muito estreitas e impedirem o sol de entrar, se a oportunidade
surgisse, era preciso que a autarquia adquirisse e mandasse demolir
alguns quarteirões com prédios centenários para construir ilhas
onde a luz entrasse e evitasse o cheiro fétido que se respira por
vezes. Hoje, passado algum tempo, concordo inteiramente com ele.
Repare o que se fez no Largo do Romal. Há cerca de cinquenta anos
mal se respirava. Alguns edifícios foram abaixo e hoje, como vê,
está lindo.
Estou
muito feliz por ainda estar a trabalhar diariamente nas lojas. Cumpro
três horas de manhã e outras três durante a tarde.
Nunca atropelei ninguém. Fiz
sempre o mais correcto com a concorrência. Por isso tenho muitos
amigos. Nas minhas lojas foram muitos os comerciantes que ali tiraram
o curso.”
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