Cerca
das 10h00 de ontem, na Rua Paço do Conde, no meio de uma altercação,
faleceu subitamente o proprietário do restaurante Retiro do Conde.
Manuel Gonçalves, de cerca de 60 anos, natural da zona de Cantanhede,
explorava a conhecida casa de comidas há cerca de meia-dúzia de
anos. Embora contido, era um empresário muito respeitador e respeitado por todos em redor, nestas ruas
estreitas. Pelo que julgo saber, teria estado emigrado na Venezuela à
volta de 30 anos.
Por
detrás deste desfecho trágico, ao que parece, a originar toda uma
quezília está a abertura de um novo estabelecimento em frente ao
Retiro do Conde.
Em
meu nome pessoal, em nome da Baixa comercial de Coimbra, se posso
escrever assim, nesta hora de profundo sofrimento, os nossos mais
sentidos pêsames à família enlutada.
MAS,
AFINAL O QUE ACONTECEU?
As
versões são mais que muitas a circularem nestes becos e ruelas.
Como não consegui encontrar uma única testemunha de facto, que
merecesse crédito, fui falar com um dos intervenientes desta
história que acabou mal para uma das partes. Sem tomar partido,
mesmo correndo o risco de estar a ser injusto, uma vez que só é
ouvida uma das partes, mesmo assim, ouso plasmar o que ouvi. Vou dar
voz a José Neto, dono do café snack-bar Neto, há uma semana em
funcionamento no Centro Histórico:
“Sou
natural de São Miguel, Açores, e estive emigrado nos Estados
Unidos. Gosto muito de Coimbra e foi por isso mesmo que decidi
estabelecer-me, aqui, com um pequeno estabelecimento de hotelaria.
Abri precisamente há uma semana. Sem saber a razão, logo no início
senti uma certa animosidade por parte do meu colega de profissão.
Logo no primeiro dia, mais precisamente na segunda-feira passada,
estava um cliente meu encostado à sua parede e debaixo do seu toldo.
Sem nada o fazer prever, o meu vizinho veio cá fora e, como se
estivesse a abrir o pano de proteção, deixou cair o ferro em cima
da cabeça do meu cliente. A seguir, numa aparente explosão de
raiva, pegou no ferro e sovou o rapaz na zona da barriga. Embora
achasse injusto, vi aquilo, não gostei, mas, para não gerar ali um
conflito logo no meu primeiro dia, não disse nada. Eu só quero
viver em paz. Tenho o meu negócio, só peço que me deixem
trabalhar. Fiz de conta que não se tinha passado nada. Dava os bons
dias ao casal, mas só a senhora me respondia. Eu nunca troquei uma
palavra com ele.
Ontem,
Domingo, seriam 9h30, vi dois agentes da PSP transporem a porta do
restaurante Retiro do Conde. Passada cerca de meia-hora, saíram de lá e
entraram na porta em frente, ou seja, no meu café. Eu estava dentro
do balcão e tinha um cliente, a beber, encostado ao balcão. Os dois
agentes entraram e dirigiram-se-me a perguntar se eu sabia de alguém
que tivesse ameaçado o meu vizinho. Eu disse que não sabia de nada.
Foi então que o rapaz disse: “fui eu!”. Os polícias
identificaram-no, fizeram as perguntas que acharam por bem, e saíram.
Logo que viraram costas, o homem veio cá fora e, à porta do
restaurante Retiro do Conde, teria dito palavras pouco corteses para
o meu confinante. Como estava cá na minha vida não tomei atenção
ao que foi dito. Só sei que, de repente, vi a senhora do restaurante
com duas facas, uma em cada mão, pronta para fazer justiça. Da sua
casa veio um seu cliente que a agarrou. Veio o seu marido e dizia:
“corta-lhe o pescoço que digo que fui eu!”
Os
dois agentes da PSP, que já estavam ligeiramente afastados mas que
teriam ouvido a algazarra, voltaram para trás e tentaram moderar o
conflito. Foi então que subitamente o meu concorrente caiu para trás
e se ficou. Veio a ambulância, foi feita reanimação no local mas,
infelizmente, nada se pode fazer. Acredite, estou consternado com
isto. Palavra de honra! Eu vim apenas para trabalhar, não vim para
causar mal a quem quer que fosse. A morte fez das suas, esta é mesmo
a verdade. Os meus sinceros sentimentos à família. Gostava que
soubessem que estou condoído com tudo o que aconteceu.”
SINAIS...
Sem
pretender ser juiz e aberto a outro exame de interpretação, como disse em cima as versões são mais que muitas e ao sabor de cada freguês, tudo
indica que estamos perante um caso de concorrência mal aceite que
descamba em desgraça.
Já
há muito tempo que escrevo sobre um oculto e silencioso ambiente de
miséria humana que paulatinamente vai corroendo as almas dos que
estão cá estabelecidos e dos que vêm de novo: o medo do
futuro. A ansiedade e a depressão, manifestadas numa
preocupação constante e implantada, geram uma tensão e são suportadas por
ansiolíticos e outros meios mais fáceis e à mão de semear. Os que
por cá lutam há muito tempo, diariamente, tentando resistir,
vêem-se em palpos de aranha para aguentar este continuado e depauperado
ciclo económico. Por outro lado, sem que ninguém lhes possa levar a
mal, os que vêm de novo, num direito legítimo que lhes assiste,
tentam fazer a sua vida. Uns e outros têm razão: se, por um lado, a
oferta é desmesurada, por outro, a procura não chega para todos.
Esta é a causa da inquietação que reina pela zona.
Soluções?
Não há! A não ser esperar que a economia real melhor, mas de
facto. Não a economia que o Governo tanto apregoa, de um enorme
crescimento, mas que não se sente no comércio e outras actividades,
como a indústria hoteleira.
Sem
pretender dar conselhos, devemos praticar um respeito intrínseco por
todos quantos lutam para terem uma vida melhor. Por outro lado, não
esquecer que só temos mesmo uma vida e, para todos, a cada minuto
que passa, cada vez mais curta. Não vale a pena guerrearmos por
detalhes. A todo o momento poderemos fazer parte do pó.
Vale
a pena pensar nisto?
POST SCRIPTUM
O corpo de Manuel Gonçalves encontra-se em Câmara Ardente na capela de São Mateus, em Cantanhede, a partir das 14h00 de hoje, terça-feira, 24 de Outubro. Pelas 16h30 realizar-se-ão as cerimónias fúnebres, seguindo depois para o Crematório de Taveiro onde, pelas 18h00, se fará a cremação.
POST SCRIPTUM
O corpo de Manuel Gonçalves encontra-se em Câmara Ardente na capela de São Mateus, em Cantanhede, a partir das 14h00 de hoje, terça-feira, 24 de Outubro. Pelas 16h30 realizar-se-ão as cerimónias fúnebres, seguindo depois para o Crematório de Taveiro onde, pelas 18h00, se fará a cremação.
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