segunda-feira, 22 de janeiro de 2024

BARRÔ: ENSAIO PARA QUE A FESTA DE ANO NÃO ACABE (1)




Para os que seguem o que escrevo, na semana passada, publiquei várias crónicas sobre as festividades em honra de São Sebastião, o padroeiro da aldeia de Barrô, que se comemorou ontem, 21 de Janeiro.

Através de um ou outro texto mais sério e outros, a maioria, em maneira mordaz (que morde, sarcástico), fui dando conta do evoluir da situação, como quem diz, se iria haver ou não festa religiosa - e já agora que chamo à colação o estilo em jeito de brincadeira, aproveito para pedir desculpa a alguém que se sentisse ofendido.

Praticamente, só nos últimos dias se chegou à conclusão que, em virtude de alguns donativos de maior vulto, seria possível realizar a missa e em seguida a procissão solene.

Relembro que, pelos usos e costumes, esta alegoria divide-se em duas faces: a sagrada e a profana.

A sagrada, constituída pela missa e procissão, tal como o nome indica, destina-se essencialmente aos crentes - para expressarem a sua fé enquanto alimento espiritual - e também àqueles que pretendem pagar promessas ao santo que fizeram durante o ano antecedente, depois de ver os seus desejos realizados.

A parte profana é constituída por pequenos vícios que visam servir o corpo físico com coisas que a igreja poderá não aprovar, isto é, tudo o que é alheio à religião.

Exemplos de profanação: um ou vários eventos com música, com artistas de nomeada ou banda de baile, ou outro teor artístico variado.

De salientar, ainda que opostos, os conceitos sagrado e profano estão ligados entre si como irmãos siameses. Só haverá crescimento de uma se a outra se desenvolver em harmonia. Se uma morrer, inevitavelmente, a outra desaparece em seguida.

Por outras palavras, se não se realizar a festa sagrada, ou se for perdendo importância, proporcionalmente vão decaindo os fiéis e a heresia vai crescendo nas comunidades. Por outro lado, a importância da imagem santífica na hagiografia (estudo da biografia dos santos) vai caindo na acreditação católica e, levando à descrença popular e falta de apelo, este protector, a médio prazo, pode desaparecer.

Não se fazendo as festividades anualmente as portas das casas da aldeia não se abrirão e cada vez mais as pessoas se tornarão vizinhos mais individualistas e solitários. Não virão os nascidos na terra e a residir e a trabalhar noutras cidades portuguesas. E muito menos os distribuídos na diáspora, os dispersados pelo mundo fora.

Estas celebrações pagãs são, sobretudo, um motivo para convívio anual e encontro de gerações.

Mas sabendo que a colectividade se mostra progressivamente mais desinteressada da memória e tradições populares, e, por outro lado, a sua contribuição pecuniária é cada vez mais insignificante – testemunhei um residente contribuir com uma moeda -, como se poderão fazer omeletas sem ovos?


(CONTINUA AMANHÃ)

 

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