sábado, 22 de janeiro de 2022

EDITORIAL: A BAIXA É DE TODOS E PARA TODOS? OU SÓ PARA ALGUNS?

(Imagem de arquivo)
 



Na passada Terça-feira, 18 do corrente, à noite, com organização da APBC, Agência para a Promoção da Baixa de Coimbra, realizou-se um debate entre José Manuel Silva (JMS), presidente da Câmara Municipal de Coimbra, e os comerciantes, no antigo Salão Brazil.

Cheios de expectativas, os operadores comerciais em estado de aflição, olhando-o como o homem providencial, durante cerca de 2h30, salvaguardando uma discutível proposta inovadora, o encontro decorreu dentro do espírito de problemas versus soluções iguais aos anteriores 20 anos, como quem diz, dentro de queixumes e falinhas mansas. Isto é, o tempo foi passado a discutir temas como o “estacionamento”, “higiene”, “segurança”, “iluminação”, “desertificação”.

Talqualmente como no período entre 2007/2008, em que aconteceu uma vaga de assaltos sem precedentes contra o património na Zona Histórica, também não faltou a recorrência a mais câmaras de video-vigilância para suprir a falta de meios operacionais e ineficácia da Polícia de Segurança Pública.

Apesar do melaço que envolveu a conferência, ficou bem patente que a seguir à recessão agravada e não ultrapassada entre 2001/2015 a Baixa, actualmente, está a viver uma depressão profunda e severa com consequências imprevisíveis para quem aqui ganha o seu pão. E que, sem um verdadeiro Plano Marshall, com injecção de capital, sobretudo, na recuperação de edificado municipal destinado à habitação com preços médios, não se curará sozinha. Curiosamente, para além deste plano prometido em campanha eleitoral só ter sido aflorado ao de leve, não foram referidos os dinheiros que vêm aí através da “bazuca” Europeia e nosso PRR, Programa de Recuperação e Resiliência.

No fim da conversa, tal como em outros encontros já vistos, a maioria, depois de despejar o que trazia entalado na alma, bateu palmas e saiu contente. “A recuperação da Baixa está em marcha”, diria JMS.

Em especulação, poderíamos afirmar que presenciámos uma catarse colectiva, libertação de sentimentos ou emoções reprimidas, que conduz a uma sensação de alívio ou pacificação.

Correspondendo ao apelo de proactividade pedido pela presidente da APBC, Assunção Ataíde, nos dias subsequentes, também como é hábito, não faltaram parangonas nos jornais locais, assim: “PREVÊ-SE UMA NOVA ERA NA BAIXA DE COIMBRA”.

Notoriamente, e lamentavelmente, falta massa crítica na cidade.


UMA DISCUTÍVEL PROPOSTA INOVADORA


Ao ser aflorado pelo público o tema da toxico-dependência e a localização de algumas estruturas de apoio que, segundo a sua óptica, concorrem para a proliferação de mais viciados na zona da Baixa, em concordância, respondeu JMS que já tinha encetado conversações com a direcção da Associação das Cozinhas Económicas Rainha Santa Isabel, mais vulgarmente conhecida por “Cozinha Económica”, para a possibilidade desta estrutura, tal como a “Casa dos Pobres”, ser transferida para São Martinho do Bispo. Assim como deixou no ar que concordava com a mudança do Centro Porta Amiga de Coimbra/AMI e Cáritas Diocesana, estruturas de apoio aos dependentes de drogas, com sede na proximidade do Terreiro da Erva.


COZINHA ECONÓMICA


Vamos começar por traçar um pequeno retrato da “Cozinha Económica”. Esta instituição, com quase 100 anos de existência, foi fundada em 1933. Para além da sua crónica dificuldade em se manter solvável, que levou no ano passado a várias iniciativas de inter-ajuda, em servir diariamente centenas de refeições a uma população carenciada com histórico de tóxico-dependência, desemprego, precariedade social, pobreza envergonhada, famílias sem rendimentos, presta assistência também aos mais idosos, quer em Centro de Dia, quer em Apoio Domiciliário. Para além disso, presta também apoio psicológico através do telefone, proporcionado por um grupo de especialistas da psico.

A Baixa, sem esta notável instituição com toda a benemérita vontade do seu pessoal a tentar todos os dias mitigar a fome a quem precisa, numa contribuição para erradicação da pobreza, seria, provavelmente, um território muito parecido com imagens do Sudão.

(Não escrevo por escrever, conheço relativamente bem esta imprescindível entidade)


CENTRO PORTA AMIGA DE COIMBRA/AMI


Com mais de vinte anos a auxiliar e a contribuir para o bem social comum em Coimbra, na Rua Direita, esta instituição – fundada em 1984 - de apoio a pessoas em dificuldade, situação de isolamento/exclusão social, em estreita ligação com a “Cozinha Económica” presta serviços a vários níveis, quer materialmente, na distribuição de alimentação, roupas, artigos escolares, produtos de higiene, quer a nível psicológico. Faz também formação profissional para desempregados e outros carenciados em ocupação de tempos livres. Assim como dar assistência a mulheres vulneráveis. Presta também serviços de lavandaria, apoio jurídico, apoio social, formação, informação e sensibilização, distribuição da Revista Cais.

(Não escrevo de cor. Conheço assim assim os bons serviços e a importância que detém para a erradicação da pobreza na Baixa de Coimbra)


CÁRITAS DIOCESANA


A Cáritas Diocesana, com várias estruturas de apoio na cidade de Coimbra, tem duas valências no coração da Baixa, uma na Rua Direita, o Centro Comunitário de Inserção, e outra no Terreiro da Erva, o Centro de Equipa Reduz – este centro exerce um serviço notável de apoio à prostituição e à toxico-dependência, na sinalização e encaminhamento dos necessitados para a terapia, atendimento, tratamento e cura.

(Conheço mal, mas reconheço a sua importante valia no endémico estado da Baixa)


RESUMO FINAL


Pelo que fica descrito, sem favor, em analogia, estas instituições são as placas tectónicas que suportam o fundo baixo da cidade, o lado negro da sociedade, como é a pobreza e a adição. Mexer nestas infraestruturas em constante desequilíbrio societário pode conduzir a um desastre incomensurável. Com um aumento de assaltos pelo previsível estado de necessidade destas pessoas, pode ser pior a emenda que o soneto.

Em vez de as ostracizar, e de os chutar para canto como se fossem um impecilho, o que seria lógico era propor que, quanto antes, estas entidades fossem agraciadas com a medalha de ouro da cidade.

Espero sinceramente que JMS, talvez para mostrar trabalho político e querer parecer diferente dos seus antecessores, arrepie caminho enquanto é tempo. Mudanças no Centro Histórico, Alta e Baixa, claro que sim! Mexer nestes suportes societários, claro que não!

Quanto aos drogados, enquanto parte disfuncional de uma colectividade, não podendo varrê-los para o vizinho do lado, temos de arranjar soluções de recurso, terapêuticas e penais, mesmo que, pela inovação, choquem alguns cidadãos bons chefes de família. É preciso incluir e não excluir.

Não me posso alongar mais, mas, pelo pilar fundamental que é a segurança de pessoas e bens, aos tribunais também lhe cabem fazer parte da solução. É necessário tratar com maior severidade os toxico-dependentes e deixar cair parte das atenuantes, sobretudo para assaltos à mão armada e arrombamento. Com a sua constante libertação, quando não são detidos em flagrante delito, incentiva ao crime. No mínimo, é preciso reencaminhar os infractores para centros de recuperação. Se o Código Penal não responde com sanções que tranquilizem a comunidade, o Governo ou a Assembleia da República que o alterem. E quanto antes. Por muito que se lamente a recorrência desta criminalidade rasteira, não se pode continuar a alimentar esta desresponsabilização social.



1 comentário:

Anjo António disse...

Não consigo ver qual a diferença de reuniões anteriores bem como não se nota qualquer solução