(Imagem de Leonardo Braga Pinheiro)
É
meio-dia desta quarta-feira, o Sol está a pique e a bater com toda a força. Não se
sabe se o seu efeito calórico será responsável por irónicas
palermices de alguns humanos. A Praça do Comércio, enquanto
plataforma logística de pessoas que ali tomam várias direcções,
está calma. No ar um perfume aflorado sublinha que estamos estamos na estação das flores. Em frente à Igreja de São Tiago, a contemplar o nada, talvez inventariando o passado e contando os dias do futuro, vários idosos perscrutam o vazio do tempo.
De
repente um irado grito atravessa o largo de ponta-a-ponta: “você
olhou para a minha mulher! Isso não se faz! Está a ouvir?”.
Era um homem pequeno, deslambido, sem formusura que se visse e,
enquanto espécime masculino, sem graça. Estava acompanhado com uma
rapariga mais ou menos torneada, talvez para mais, e com um decote
pouco pronunciado onde se adivinhavam dois seios assim, assim, talvez
mais para o Assim (com maiúscula). Logo a seguir juntou-se
ao duo, em coro afinado de setas com pontas afiadas, um mulato,
talvez mais para o negro, mais que certo seu amigo. Em crescendo de
agressividade, a uma só voz, pareciam querer bater num velho que,
pachorrento, sentado num banco de madeira, teria cometido o
sacrilégio de, sem pedir licença, olhar para a "propriedade" do outro.
Se, por um lado,
contrastava a violência verbal dos dois acompanhantes da dama na
direcção do carregado de anos, por outro, impressionava a passividade do idoso,
que nem a boca abriu.
Prosseguiam os ofendidos:
“você tem alguma coisa que olhar para as mamas da minha
mulher?”
Como não houve reacção
do velhote, sempre com a pseudo-estampa de musa a fazer de
pára-choques visual, o trio encaminhou-se para a Rua Eduardo Coelho,
quem sabe, em busca de mais um olhar de lascívia de um outro
qualquer ancião carecente de sexo a quem pudesse encenar mais uma
“mise-en-scéne” no grande palco que é a cidade.
Sem comentários:
Enviar um comentário