sexta-feira, 24 de abril de 2015

DEUS NOS LIVRE DA LISÍSTRATA

(Da esquerda para a direita, a Ana, a Marta, a Anabela, a Hermínia, a Helena e a Graça. Por motivos de agenda a Maria do Patrocínio não pode comparecer à hora do boneco)


Mais logo quando o relógio da torre da Igreja de São Bartolomeu marcar mais ou menos 21h30 o pequeno largo da Rua de Sargento Mor vai estar repleto de mulheres. Se não me enganar, só um homem vai estar lá –no caso, eu porque fui contratado para reportar o evento para o grande público nacional e internacional e, por isso mesmo, peço desculpa ao meu género mas, como se deve entender pela falta de trabalho, não podia dizer que não. Juro pela minha avozinha que estou completamente solidário com a classe masculina. Aliás, até vou mais longe, isto é uma afronta reacionária à classe trabalhadora. Fogo! É uma falta de respeito para quem tanto trabalha. Porque uma coisa é estar de perna-aberta e dizer “anda cá meu amorzinho, salta para cima de mim!”, outra, é um homem diligente, para além de ter de parecer um grande garanhão, ter de ser, mostrar que está à altura e que tem mesmo de desempenhar o seu papel como deve ser. Porque, vamos lá, um sujeito quando está na função não pode representar. Ou é ou não é! Bem sei que você não está a perceber nada da minha prosa, mas faça o favor de ir com calma que já explico tudo. Como sabe a ansiedade é terrível para o ato. Desmancha tudo em três tempos e um homem, perante a mulher, fica estarrecido e mais dócil que um cordeirinho perante a mamã.
Vou então partir para o que me motivou a escrever esta crónica –que, como plasmei em cima, estou indignadíssimo, mas passemos à frente. O caso é este: dois jovens, o Dinis e a Mónica, finalistas do Curso de Teatro, lembraram-se de levar à cena a peça “Lisístrata”, de Aristófanes –calma que já conto o que é isto! Então contactaram sete mulheres, de tomates, salvo sejam, oriundas da Rua de Sargento-mor, a Hermínia, do Cantinho da Anita, a Helena, da loja Lena, a Marta, do Talho Sargento-mor, a Graça, do Restaurante Orpheu, a Anabela, da Retrosaria Ziguezague, a Ana, da sapataria “Low Cost”, e a Maria Patrocínio, do restaurante 007, todas mulheres de negócio na reputada artéria. Então os “miúdos” –porque levar uma peça destas à cena só pode mesmo ser obra de rapaziada nova-, cheios de força e sem calcularem a revolução que pode dar -para o prejuízo, é claro- ao pessoal másculo, toca de as orientar para a representação. Como escrevi em cima, será mais logo, se não chover –mas cá para nós, Deus queira que chova a potes!
Então em que consiste a peça de teatro? Pois! Aqui é que a coisa bate! O argumento gira em torno de um grupo de mulheres que, para impedir que os seus companheiros vão para a guerra, se agrupa e, usando o melhor instrumento que uma mulher tem para os pressionar –refiro a inteligência, pensava que era o quê?-, fazem greve ao sexo. Ora aqui é que bate no rebate! Imaginemos que isto alastra? Como é que eu e outros cá como o “je” ficamos? Não é por nada mas embora custe a admitir, de uma forma não declarada, já somos dominados pelo género feminino. As mulheres, para o género masculino, são a ditadura do proletariado. São a opressão e a instrumentalização através da delicadeza. Contrariando o filósofo Hobbes, que escreveu que o homem é lobo do homem, a mulher é a loba do pobre homem. Claro que a guerra está aberta e, por este andar, vai haver muitas mais baixas –deve ser por isto que os homens estão a dizimar as mulheres, não deve? Por que as guerras têm sempre na génese a perda e a conquista de poder. É ou não é? E não estou a escrever que concordo com a extrema violência, de maneira nenhuma. Eu sou do tempo em que numa mulher não se batia nem com uma flor –é óbvio que isto era a mitologia do tempo, o que se apregoava na rua. Dentro de casa era cada arraial de pancadaria que até metia medo e no dia seguinte aparecia a senhora toda pisadinha. Tinha caído na escada num acidente inglório, invocava a própria.
Voltando à peça de teatro “Lisístrata”, apresentada pelas garbosas mulheres da Rua Sargento Mor, se isto se espalha, se outras mulheres lhe tomam o exemplo, será como derramar gasolina sobre uma fogueira. Pode ser muito pior para nós, homens, que a peste bubónica no início do século XX. Mesmo tendo de aturá-las e sermos seus (in)fiéis servidores, sem elas, a nossa vida é bem mais complicada. Apesar de serem uma dor de alma, sem elas, não sobrevivemos. Não alterem este estado de coisas. Pode ser? Apesar da minha novena prometida à Rainha Santa não choveu e a representação foi muito ovacionada. Deus queira que não repitam!



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