Apesar de ainda ser cedo, cerca de 9h00, e o dia, na sua imprevisibilidade do que iria acontecer nas próximas vinte e quatro horas, ainda há pouco despontar para a realidade, era uma Segunda-feira banhada pelo anátema da canícula. A remeter-nos em pensamento para paisagens áridas do Norte de África, era como se a indolência tivesse tomado conta de todos os presentes.
Num pequeno pedestal instalado no Salão Nobre da Câmara Municipal de Mealhada, a imagem em barro da República, com barrete enfiado na cabeça, parecia sonsa e desenxabida. Era como se cerca de um século pesasse nos seus ombros mais do que o mundo em toda a sua universalidade. Poderia ser somente uma certa desilusão nas suas aspirações escritas e levadas a efeito por homens por volta de 1910. Fosse por isso ou outra coisa qualquer, a verdade é que a fisionomia da musa libertadora estava taciturna e com ar de poucos amigos.
O pretor urbano, António Jorge Franco, como se pensasse que “já que tinha de ser que fosse”, com o tradicional de “bom dia a todos”, avançou para o “Período de Antes da Ordem do Dia”.
2 - Ainda mal se estava a pensar se as janelas deveriam ser abertas ou manter-se fechadas por causa do calor, foi dada a palavra ao vereador Luís Tovim. Como rajada de vento “suão”, o representante eleito pelo Partido Socialista (PS), numa voz titubeante e com pouca convicção, atirou que na última reunião, realizada em 27 de junho, tinha votado a favor num ponto da agenda e, depois de ir para casa e aprofundar melhor o assunto, decidira alterar a sua indicação de voto e queria votar contra.
Caiu um silêncio estranho e envolvente na pequena sala. Talvez por isso o barulho dos maxilares inferiores da maioria a cair no peito foi atroador.
Depois do espasmo inicial, o prefeito, retomando a compostura, mandou prosseguir. Logo Rui Marqueiro, ex-presidente da Câmara Municipal e agora líder da bancada socialista, saltou em defesa do seu correlegionário. (Ver crónica em separado)
Depois de uma intervenção em torno do ser ou não ser acto jurídico eis a questão, a meu ver, algo desajustada por parte do ex-homem forte que chegou a entrar em confronto com a Chefe de Divisão da Área Jurídica, prosseguiram os trabalhos.
E novamente o apontador de serviço ajustou a mira e disparou: “a queda do senhor Porfírio. Caiu do telhado. Interrogo: quem foi o responsável?”
Respondeu Franco que o acidente com o funcionário camarário está entregue às autoridade que tutela os desastres.
Sobre uma insinuação levantada sobre o CineTeatro Messias, diria Gil Ferreira, vereador da Cultura: o aparte de Rui Marqueiro sobre o que se passa no Teatro Messias, sobre o facto do ex-presidente ter dito que houve corrupção na bilheteira do teatro.
Prosseguiu Ferreira; “foi lançada uma difamação sobre pessoas edóneas. (…) Para quem é o paladino das denúncias anónimas, estamos conversados.”
Retorquiu Marqueiro: “Eu tenho uma mágoa na vida: fui acusado de ser desonesto. (…) Eu tenho uma vida de impoluto; a minha fortuna resume-se a cento e tal mil euros. Pode ver a declaração no tribunal.”
Em resposta ao eleito pelo PS numa outra observação, diria Filomena Pinheiro: “eu tenho o coração ao pé da boca; não sou um animal político”.
E acrescentou ainda: “deixemo-nos deste tipo de política… Massacra!”
Apoiou Franco: “há gente que quer que tudo corra mal. (…) Estive sempre, dentro ou fora da política, a trabalhar para desenvolver o concelho de Mealhada. (…) Eu continuo a vir com muita vontade, todos os dias…”
Atalhou o chefe da oposição: “eu venho sempre contente para as reuniões…
Se me querem calar, tirem o cavalo da chuva. Eu vou estar cá quatro anos” – relembra-se que, numa reunião realizada em 30 de Maio, Marqueiro afirmou textualmente: “(…) é muito provável que tenha de abandonar a vida política, pela minha saúde e a da minha mulher…”
Prosseguiu ontem o ex-presidente: “eu tenho muita estima pela senhora vice-presidente, Filomena Pinheiro. (…) A Democracia tem confronto. Se não tiver não é Democracia. (…) O caso dos lavadouros concessionados à Luso Clássicos, em política, não me parece bem...”
3 – E entrámos no Período da Ordem do dia. Sem nada de relevante a assinalar, e para não me tornar demasiado longo, fico-me por aqui.
Em termos de confronto político, a segunda parte foi igual à primeira. Ou seja, com Marqueiro, sistematicamente, a mandar farpas à maioria, provocadoras, vazias de contexto a raiar a vulgaridade; volta e meia, a ameaçar com o garrote do tribunal; constantemente a interromper os oradores com graças e graçolas… sem graça.
Bem sei que corro o risco de ser apelidado de praticar parcialidade mas, com franqueza – e não é a primeira vez que o escrevo – acho as intervenções da bancada do PS pouco sérias, pouco credíveis. E mais: sendo a oposição um instrumento precioso e necessário para o equilíbrio entre as forças políticas, duvido que acrescentem algum valor ao concelho.
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