quinta-feira, 15 de dezembro de 2022

MEALHADA MÁ... OU COMO SER MAIS E MELHOR

 



 

A sala atribuída à apresentação de novos títulos de livros da Biblioteca Municipal da Mealhada, com cerca de vinte espectadores sentados, estava bem composta. De frente para a assistência, recostado num cadeirão, dividido entre o nervoso miudinho e um olhar furtivo sobre a entrada para dar aconchego a algum atrasado de última hora, um rapaz alto, como personagem saído directamente dos idos anos de 1940, vestindo “traje domingueiro”, constituído por camisa branca, colete a traçar e emoldurado com corrente dourada que presumivelmente esconderia um relógio de bolso, calças vincadas e botas de meio-cano. 

Pedro Mota, um jovem autor, preparava-se para apresentar o segundo número da revista cultural “Mealhada Má”. Para quem não conhece, em traço sumário, é uma publicação, entre o presente hodierno e a nostalgia, dedicada ao avivar da recordação entre usos e costumes de antanho, histórias já enterradas nas catacumbas da memória, receitas da nossa avó e sobre festas e romarias em desaparecimento no concelho.  

Pegando na revista, com uma capa com foto a preto e branco do Grupo de Teatro Amador da Mealhada (1941), ávidos por conhecer mais, começamos a desfolhar e facilmente verificamos que estamos perante um longo trabalho de investigação. Entre jogos tradicionais que foram vencidos pelos novos tempos e um texto claro e elucidativo, foto e bilhete de ingresso de 1904-1905, ficamos a saber que há mais de um século a cidade albergou no seu seio uma praça de touros.  

Ao longo de sessenta páginas, deleitamo-nos com este doce cultural, se calhar, uma óptima prenda, diferente do comum, para oferecer neste Natal. 

De entre o público presente, alguém perguntou: por que razão, nos apoios e patrocínios, não se encontra o logótipo da Câmara Municipal da Mealhada? 

Como apanhado em falso, meio titubeante, respondeu Pedro Mota que já tinha apresentado o projecto ao pelouro da Cultura, mas que, talvez por insegurança dele e provável desconhecimento do responsável máximo municipal (o vereador Gil Ferreira), ainda não tivera uma decisão satisfatória que lhe permitisse encarar o futuro com maior segurança.  

Até agora a edilidade adquirira 15 revistas, cujo valor individual é de 8 euros. 

Enquanto houver prazer pelo que faz e estrada para caminhar Pedro Mota vai continuar. Até quando? Não sabe. 

 

TALVEZ SEJA PRECISO UM OLHAR PRESCRUTADOR SOBRE O TRABALHO EM CURSO 

 

Antes de prosseguir, por respeito a mim e aos leitores, ressalvo que durante a vigência do “Ancien Regime”, no tempo de Rui Marqueiro, me manifestei contra o facto do município, tomando o lugar de editores, ser useiro e vezeiro a apoiar a esmo edições de livros sem verdadeiros interesses cultural  e concelhio. 

E mantenho o que disse. 

Em Junho de 2021, em argumentário com um contemplado, escrevia o seguinte: Primeiro, antes de ser apoiado qualquer livro pela autarquia, uma comissão independente deve pronunciar-se acerca do conteúdo ser, ou não ser, de relevante interesse municipal. Não o sendo, não deve ser apoiado. Tratando-se de romance ou outra obra não considerada de interesse maior, deve este conto, em paridade com outros, ser remetido para o concurso literário, bienal, António Augusto Costa Simões, instituído em 2019. 

Repare, não havendo critérios, estamos a transformar a Câmara Municipal da Mealhada numa editora de livros. Ora, como deve calcular, essa não deve ser a sua função. 

Vai desculpar a expressão, mas assim qualquer um é escritor. Com as costas do meu pai também sou um grande homem. 

Mais ainda, se o seu livro foi integralmente apoiado pela Câmara, a totalidade de volumes da primeira edição deveria ficar refém da edilidade para distribuir gratuitamente pelos munícipes. 

Se a sua obra foi, por exemplo, apoiada em 50%, logo, por inerência, metade da primeira edição ficará para a Câmara Municipal e para esta distribuir gratuitamente pelos habitantes do Concelho. 

Um escritor “amador”, em começo de carreira, salvaguardando a minha inexperiência, não pode pensar em ganhar dinheiro. Para pensar assim, arrisca uma carreira profissional, ou, numa carreira acessória, a expensas suas, edita os seus livros em Edição de Autor com ajuda de patrocinadores. 

Vale a pena pensar nisto? 

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