sábado, 7 de novembro de 2020

EDITORIAL: QUEM SALVA AS CIDADES?

 




A história das cidades remonta há milhares de anos. As primeiras terão surgido na Mesopotâmia, ao longo do rio Nilo, e sempre resultante da junção de pequenos lugares habitados. O crescimento de grandes impérios antigos e medievais levou ao aparecimento de grandes urbes como, por exemplo, Roma.

Durante a Idade Média, na Europa, uma cidade era tanto uma entidade política-administrativa como um conjunto de casario agregado. Com um quadro legislativo próprio, era o senhor feudal que impunha a sua lei. Com a queda do feudalismo, pela crise gerada nas relações entre senhores e servos, pela contínua imposição de obrigações, tributos e necessidade de permanecerem agarrados à terra, dos primeiros sobre os últimos, as cidades multiplicaram-se. Os camponeses, com o contingente populacional a crescer a par com as actividades artesanais e comerciais, recorrendo aos seus próprios meios de fuga para a liberdade, começaram a abandonar os feudos e a refugiar-se na periferia da cidade muralhada, onde, com a criação de feiras e mercados, permitia um melhor escoamento de produtos e, sobretudo, fugir ao absoluto controlo da entidade administrativa. Com o advento do Capitalismo e início da Globalização, com as viagens marítimas de circum-navegação, estavam criadas as condições para o desenvolvimento. Com a formação das associações de classe, “fraternidades”, e as “corporações”, que agregavam os seus membros em torno de estatutos comuns, bandeiras e santos padroeiros, surgiam as oficinas, em que a loja era o ponto de venda do produto aí criado, com os seus mestres e instalada em ruas com ofício designado.

Com a queda do banco de investimentos Lemans Brothers, com sede em Nova Iorque, em 2008, com repercussões económicas e financeiras a alastrarem ao mundo inteiro, quem mais sofreu foram as cidades. Com os pequenos negócios, comércio e indústria, a desaparecerem num piscar de olho, as urbes, completamente perdidas, sem norte, foram perdendo toda a sua identidade.

Com o grande capitalismo transnacional, sem pátria, a saber organizar-se e a ganhar cada vez mais dinheiro como nunca, a chamada classe-média, exangue e sem rendimentos que lhe permitiam enfrentar a grave crise que se abateu sobre as suas vidas, tem vindo a decair cada vez mais.

As cidades, depois de séculos como geradores de emprego e motor de desenvolvimento e riqueza privada, passaram a centros de pobres estabelecidos por conta-própria a serem explorados pelo Estado através dos impostos. Ou seja, os assalariados, na ideia de serem donos de si próprios, trocaram de patrão mas não de ladrão.

Para terminar um ciclo que já se afigurava estertor, veio a pandemia. Mais uma vez o capitalismo selvagem continua a contabilizar cada vez mais lucros.

Tal como já vinha acontecendo em crescente, hoje a cidade, sem políticas concertadas de regeneração e que evitem a sua morte anunciada, é cada vez mais uma sombra de si mesma em forma de esquiço. Mas ainda não bateu no fundo. Impotentes para mudar o rumo das coisas, para nossa infelicidade, iremos assistir a muitos mais quadros negros na esperança que nunca morre.


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