sexta-feira, 16 de setembro de 2016

UM PENSAMENTO DE VEZ EM QUANDO: PROIBIR NA TERRA DO PECADO






Fazer uma lei e não velar pela sua execução é o mesmo que autorizar aquilo que queremos proibir (Armand Richelieu)”

Ontem, em Conselho de Ministros realizado em Coimbra, o Governo, liderado por António Costa, aprovou alterações à “lei do tabaco”. Entre outras, uma delas prevê a “proibição de fumar nos parques infantis e nas áreas situadas junto das portas e janelas dos estabelecimentos de cuidados de saúde e de ensino. As normas aprovadas pelo Governo visam proteger os cidadãos da exposição involuntária ao fumo do tabaco, assim como contribuir para a prevenção e controlo do consumo. Estas proibições não prevêem, no entanto, medidas punitivas.(...) As atitudes e comportamentos não se resolvem, nem se devem regular por aspectos de natureza legal, mas podem ser sinalizados e a lei, mais do que um carácter punitivo, pode ter um carácter de mensagem de sinalização e de alerta, diria Adalberto Campos Fernandes” (Ministro da Saúde). Ninguém aceita como positivo que exista uma concentração de pessoas a fumar junto de de unidades de saúde (…) e de escolas, acrescentou” -in Diário de Coimbra de hoje.

Num tempo em que a questão das liberdades, religiosa e culto, de igualdade de género, de expressão e pensamento, de circulação e mobilidade, doutrinadas como direitos fundamentais nas constituições europeias, essencialmente, a partir de 1960, pelo exacerbar do conceito na sua interpretação, está cada vez mais posto em causa e, num eterno retorno algumas vezes a raiar a imbecilidade, a ser restringido -tudo indica que, pouca a pouco, voltaremos aos tempos do necessário silêncio de outrora, que os mais velhos recordam bem.
Se na maioria dos casos há razões de sobra para repensar até onde nos leva a esta liberdade livre, sem a individual responsabilidade e gestão da vontade tendo em conta que a nossa acaba onde começa a do outro, eis que o o nosso executivo governamental, através de decreto, vem proibir que se fume junto de instituições de saúde e de ensino. Se não pensarmos muito em profundidade, tendo em conta que é uma medida política, panfletária e sem consequência pela desobrigação, até pode parecer fazer sentido. Mas, pelo contrário, se analisarmos bem, é o dito por não dito, a não-inscrição, como diria o filósofo José Gil. Proibir somente por proibir leva exactamente a efeitos opostos. Para ser eficaz uma medida de proibição, pelo não contemplado na norma, terá sempre acoplada uma providência de substituição. A proibição, tal como o valor liberdade, é sempre ambivalente. Pelo bom-senso, num equilíbrio precário mas necessário, nunca pode pretender ser absoluto. Quanto maior for a ambição do legislador na sua eficácia maior será o desaire social. E então se vamos para a lei do desejo, como é o caso, só pode mesmo dar em idiotice, em riso escarninho. Tentar controlar a ânsia através de normas legais, como admite o Ministro da Saúde, de pouco serve. Em contraposição, através da sensibilização na formação social, de alerta e sinalização, deveria começar e ser implementado aos alunos nas escolas públicas.
Dá para ver que é mais uma lei vazia, sem eficácia real. Faria sentido, por exemplo, se, em alternativa à proibição, fosse criada uma exclusiva sala de fumo para funcionários. Assim, proibindo por proibir, alguém acredita que os fumadores inveterados vão cumprir? Cheira a profundo desrespeito e um imiscuir na liberdade de cada um.
Esta medida cautelar, provisória ou definitiva, por parte do Estado, por um lado, é mais uma invasão na privacidade, no direito de cada um escolher o que, porventura, entende que lhe faz bem, por outro, é para encher o olho à populaça. Já agora, pergunta-se, porque não foi o seu âmbito alargado à Assembleia da República, ao Terreiro do Paço, sede dos ministérios, e ao Palácio de Belém? Não dizem que o exemplo deve vir de cima?
Parafraseando Caetano Veloso, em 1968, na música apresentada em cima, “Vocês não estão entendendo nada, nada, nada, absolutamente nada.*

Sem comentários: